SÃO PAULO - Um dos privilégios mais antigos da toga - a aposentadoria remunerada como punição disciplinar a juízes processados criminalmente - pode estar com os dias contados. Proposta de emenda constitucional em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara prevê o fim do benefício, que é exclusivo da magistratura.
"Esse é caso flagrante de privilégio porque é uma trincheira de defesa corporativa no mau sentido", diz o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), autor do projeto. "Provoca escândalo e perplexidade o fato de que aquele que usurpou de suas competências, desonrou o Poder Judiciário e promoveu o descrédito da Justiça seja agraciado com a concessão, à guisa de punição, de um benefício pecuniário, suportado por toda a sociedade".
A punição remunerada tem amparo na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), editada no regime militar, em 1979, mas contemplada pela Constituição de 1988. A Loman estabelece seis penas disciplinares, graduadas segundo a gravidade da "ofensa à ordem jurídica e à dignidade do cargo": advertência, censura, remoção compulsória, disponibilidade com vencimentos proporcionais por tempo de serviço, aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais por tempo de serviço e demissão.
A aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço é aplicável ao magistrado eventualmente enquadrado em quatro situações: negligência manifesta no cumprimento dos deveres do cargo; conduta incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções; escassa ou insuficiente capacidade de trabalho, e procedimento funcional incompatível com o bom desempenho das atividades.
Nesses casos, o juiz com tempo suficiente para se aposentar é afastado compulsória e definitivamente, recebendo proventos proporcionais ao tempo de serviço. A emenda proposta por Jungmann dá nova redação aos artigos 93, 95 e 103-B, da Constituição, para vedar a concessão de aposentadoria como medida disciplinar e estabelecer a perda de cargo de magistrado nos casos de quebra de decoro. "É do interesse de todos, inclusive dos juízes, tirar esse privilégio da sua Lei Orgânica porque só denigre a imagem da Justiça. É um incentivo para desvios na magistratura".
Reação
"A proposta é inconstitucional e certamente será rejeitada", reagiu o desembargador Sebastião Luís Amorim, presidente da Associação Paulista de Magistrados. "A aposentadoria do juiz só pode ser cassada por decisão judicial com trânsito definitivo. É dispositivo pétreo da Constituição".
Amorim destacou que a legislação já prevê que um juiz condenado a pena superior a 4 anos pode, como pena acessória, perder de vez o cargo, sem direito a remuneração. "O pecado aí é que em alguns casos tribunais extinguem processos contra juízes que, no curso da ação, pedem aposentadoria", anotou Mozart Valladares, presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). "Isso realmente não podemos admitir. O processo tem de continuar até o fim".
Fonte: Tribuna da Imprensa
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