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quarta-feira, janeiro 23, 2008

Causa polêmica MP que proíbe venda de bebida alcoólica nas estradas

Deficiência na fiscalização e punição dos caronas estão entre argumentos contrários


Marcelo Brandão
Levantou polêmica a Medida Provisória (MP) nº 415, assinada ontem pelo presidente da república Luiz Inácio Lula da Silva, proibindo a venda de bebida alcoólica em estabelecimentos comerciais às margens das rodovias federais e nas suas proximidades. Motoristas, comerciantes e especialistas em trânsito, representantes da sociedade civil organizada e policiais rodoviários estão divididos sobre a importância da nova medida, que passa a vigorar no dia 1º de fevereiro.
Defensores da nova lei argumentam que o número de acidentes causados por motoristas embriagados é muito grande em todo o país. Já os críticos da MP dizem que a proibição não vai resolver e ainda pode causar outros problemas, como fechamento de estabelecimentos comerciais, desemprego e privação dos direitos dos cidadãos que não estão dirigindo e querem beber.
No trecho da BR-324 próximo a Salvador, motoristas expressaram opiniões divergentes sobre a medida provisória. Enquanto abastecia o carro, o empresário Arnaldo Pinheiro, 44 anos, disse que a proibição pode ajudar a diminuir os acidentes, mas não vai resolver o problema. Para ele, a polícia vai ter dificuldade para fiscalizar todos estabelecimentos, correndo o risco de a lei acabar não sendo cumprida. “Nós temos muitas leis no país, precisamos é cumpri-las. Já existe a proibição dos motoristas dirigirem depois de beber, mas não tem fiscalização e ninguém cumpre”, comentou.
O funcionário público Manoel Esteves, 42, disse que não é contra a MP, mas também acredita que a polícia não tem homens para fiscalizar todos os estabelecimentos e a lei vai acabar não sendo cumprida. Taxista há cerca de 30 anos, Edmundo Bonfim, 55, diz que a proibição da venda nos bares e restaurantes próximos da estrada não vai resolver. “Quem quiser beber ao volante vai dar um jeito. Traz de casa num isopor ou vai comprar fora da estrada”.
Já para o administrador de empresas Jurandir Bezerra, 39, a medida é válida porque qualquer ação que coíba motoristas de beberem para depois dirigir é importante. Para ele, a lei pode não resolver, mas deve diminuir o número de acidentes relacionados ao consumo de álcool. A opinião não é partilhada pelo advogado Ângelo da Cruz, 51. Ele disse ser contra a MP porque a proibição atinge todas as pessoas que desejam consumir uma bebida num bar perto da estrada, mesmo que não estejam dirigindo. “Imagine um ônibus cheio de turistas, viajando por uma estrada federal próxima ao litoral, nenhum deles está dirigindo, mas não vai poder beber sequer uma cerveja”.
Comerciantes- Donos de restaurantes, bares e lojas de conveniências são contra a medida provisória, porque acreditam que vão ter grandes prejuízos, demitir funcionários e, em alguns casos, até fechar as portas. Rogério Ribeiro, 34, sócio de uma churrascaria que existe há mais de 30 anos no posto Fon Fon, na BR-324, afirmou que cerca de 70% do seu faturamento vem da venda de bebidas, entre cervejas, uísque, refrigerantes, sucos e outras. Acrescentou que pretende suspender a venda das bebidas alcoólicas por medo da multa, considerada alta por ele. Luiz Birsk, 47, proprietário de um restaurante há cerca de 30 anos no posto de combustíveis Aratu, no km-609 da BR-324, também receia ter que demitir funcionários por causa da queda do faturamento quando deixar de vender bebidas alcoólicas. O medo não é só dos proprietários dos grandes estabelecimentos situados à margem das rodovias. Jaciara Souza, 30, dona de um boteco na Rua do Frigorífico Frimasa, localizado a menos de 100m da BR-324, no município de Simões Filho, ficou preocupada ao ser informada sobre a nova lei. “Vai prejudicar muito. A venda da cerveja é meu maior faturamento, é meu ganha- pão”.
A Medida Provisória 415 impede a venda de bebidas alcoólicas à margem das rodovias federais e nas ruas próximas que tenham acesso direto à via. Quem não cumprir a determinação poderá ser multado em R$1.500 e, no caso de reincidência, o valor dobra, além de o estabelecimento comercial ter o acesso à estrada fechado pelo prazo de dois anos. A lei determina que bares e restaurantes devem fixar um cartaz informando a proibição de bebidas alcoólicas, com multa de R$300 por descumprimento. A medida atribui a fiscalização à PRF e será acrescentada ao Código de Trânsito Brasileiro.
A MP foi publicada ontem no Diário Oficial da União e passa a vigorar a partir do dia 1º de fevereiro deste ano. A medida tem 60 dias para ser sancionada pelo congresso. Se o prazo não for cumprido, perde a validade. Os parlamentares também podem fazer alterações para depois transformá-la em lei.
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PRF aguarda instrução normativa
A superintendência da Polícia Rodoviária Federal da Bahia ainda não sabe como vai fazer a fiscalização contra a venda de bebidas alcoólicas nos estabelecimentos comerciais que ficam à margem das rodovias. O superintendente do órgão, inspetor Antônio Jorge Azevedo Barbosa, disse que aguarda instrução normativa do Departamento da Polícia Federal (DPF/Brasília), para saber como vai funcionar na prática a fiscalização e as autuações sobre os estabelecimentos flagrados vendendo bebidas.
A expectativa da PRF é conhecer a normatização para a fiscalização até na próxima segunda-feira, já que a medida vai vigorar a partir do dia 1º de fevereiro, data que coincide com o Carnaval e que tem um número alto de acidentes relacionados ao consumo de bebidas alcoólicas. Antônio Jorge admitiu que o contingente de policiais rodoviários é pequeno para cobrir os cerca de seis mil quilômetros de estradas federais que cortam a Bahia. Existem apenas 600 homens para policiar seis rodovias, a BR-324, BR-101, BR-242, BR-116, BR-407 e a BR-367.
Apesar de considerar pequeno o contingente, o superintendente acredita que o cumprimento da medida provisória pode diminuir a quantidade de acidentes, permitindo que um maior número de policiais trabalhe na prevenção e fiscalização de bares e restaurante, em vez de ter que concentrar atividades socorrendo vítimas e registrando ocorrências.
A PRF vinha coibindo o tráfego de motoristas embriagados, usando etilômetros (para medir ingestão de bebida alcoólica dos motoristas, conhecido como bafômetro). Mas para fiscalizar todo estado, a superintendência da Bahia dispõe apenas de 24 aparelhos, recém-adquiridos. Recentemente havia apenas oito aparelhos, a maioria quebrada.
O superintendente disse que não iria comentar possíveis falhas na Medida Provisória 415, mas acredita que ela pode ser melhorada no Congresso. Ele advertiu, entretanto, que é preciso enfrentar o problema dos motoristas bêbados, porque eles causam uma grande quantidade de acidentes.
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FALA-POVO
“Acho que a medida é boa, mas tem que vir junto com a fiscalização, porque então acaba não sendo cumprida. A polícia tem que usar também o bafômetro, para evitar flagrar os motoristas que bebem dentro das cidades e depois vão dirigir embriagados nas estradas. Os motoristas de carros de passeio são os piores, cometem muita imprudência, mas também tem caminhoneiro que abusa da bebida”.Peterson Davoli, 30 anos, motorista de carreta há três anos.
“A medida traz alguma penalização para quem bebe em casa e depois atropela e mata pessoas na estrada? Se não tem, não vai resolver, é pura hipocrisia. As leis já existentes têm que ser mais rigorosas com quem causa acidentes e mata as pessoas no trânsito e não proibir venda de bebidas nas estradas. Eu estou esperando uma carga no posto e não vou dirigir, porque não posso beber. Sou totalmente contra essa lei”.Alexandre Bonazza, 45, caminhoneiro há 19 anos.
“É bom né, sem bebida, sem acidente. Eu concordo com a medida provisória porque acho que vai diminuir muito os acidentes causados por bebidas alcoólicas. Diminuindo a bebida e as drogas, vai cair muito a quantidade de acidentes nas estradas. Precisa de uma fiscalização mais rígida da polícia, se não o pessoal não respeita mesmo”.Sidnei Comito, 54, motorista de carreta há 35 anos.
“Quando uma pessoa quer beber para depois dirigir, arranja bebida em qualquer lugar. Tem muita gente que consome bebida alcoólica no meu restaurante, mas não está dirigindo, como passageiros dos ônibus que param para almoçar aqui. A proibição pode até fechar alguns estabelecimentos. Eu vou ter que suspender a venda para não ser multado, mas é capaz de alguns bares venderem ilegalmente e acabar roubando meus clientes”.Luiz Birsk, 47, dono de churrascaria há 30 anos em posto da BR-324.
Punição indiscriminada
O diretor da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) secção Bahia, Luís Henrique do Amaral, disse que apesar de ser a favor de qualquer medida que trate da segurança do cidadão, a entidade se posiciona contrária à MP 415. Segundo ele, em vez de o governo cumprir seu papel de fiscalizar motoristas que circulam embriagados, o presidente baixa uma medida provisória que pune a todos indistintamente. “O estado está ausente, a repressão através de MP não resolve, tem que ter fiscalização para os motoristas infratores e campanhas educativas”, comenta.
Para Amaral, a proibição vai impactar economicamente sobre os estabelecimentos comerciais situados ao longo das estradas que cortam o estado. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), existem cerca de seis mil restaurantes e bares na Bahia, mas não se sabe quantos destes ficam situados próximos às rodovias federais.
Já Walter Tannus Freitas, presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Estado da Bahia, entidade que reúne os donos de postos de gasolina, acredita que a proibição vai causar demissões e prejuízos para os empresários. Ele explicou que os proprietários do setor vão ter perdas porque também exploram comercialmente lojas de coveniências, restaurantes e bares situados nos postos.
Ainda de acordo com Freitas, a MP não resolve o problema dos acidentes causados por motoristas embriagados. “A medida é populista, não ataca o cerne da questão e é mais uma lei que não vai funcionar”, analisou. O presidente do Sindcombustíveis citou o exemplo do estado de São Paulo, onde a proibição de bebidas nas estradas já ocorre há algum tempo, mas ele desconhece que tenha diminuído a estatística de acidentes de carro.
Freitas acredita que o ideal seria o governo fazer um trabalho de conscientização e de educação com a população. Acrescentou que o Sindicombustíveis já desenvolve uma campanha educativa, em parceria com a faculdade Rui Barbosa, para conscientizar motoristas sobre o risco de beber excessivamente e dirigir.
Alunos de psicologia, coordenados pelo professor Antônio Nery, percorrem postos de combustíveis entregando panfletos e informando pessoas sobre o assunto, com números, estatísticas de acidentes e a quantidade de bebida alcoólica que os motoristas podem consumir antes de dirigir, de acordo como Código Brasileiro de Trânsito.
Fonte: Correio da Bahia

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