Por: João Novaes
Para o presidente da seccional paulista da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Luiz Flávio Borges D´Urso, o advogado não tem como prática comum trabalhar com a mentira na orientação a seus clientes. Segundo ele, o que ocorre, na realidade, é a defesa "da verdade do cliente". D´Urso considera que, no Direito, sempre existe mais de uma verdade, a do cliente e a da parte.D´Urso debateu o tema durante a entrevista que deu na sede da entidade, na Praça da Sé, para anunciar a comissão de sindicância que a Ordem abriu para apurar a conduta dos advogados de Suzane von Richthofen, no episódio envolvendo as entrevistas concedidas por ela à revista Veja e ao programa Fantástico, da Rede Globo. Além de criticar a conduta de outros advogados, juízes e promotores que opinam publicamente sobre o caso, ele informou que os trabalhos da comissão devem ser finalizados até a próxima sexta-feira.No entanto, o presidente da OAB paulista também teve que responder perguntas de cunho teórico, a respeito da prática advocatícia e sua relação com a ética. Ele também comentou a respeito do Código de Ética e Disciplina da Ordem, pelo qual os advogados de Suzane são acusados de violar. D´Urso defendeu o documento, apesar de admitir que ele contém subjetividades.O advogado e a verdadeDurante toda a entrevista, D´Urso evitou comentar as particularidades do caso envolvendo os advogados de Suzane. Segundo ele, qualquer opinião sua poderia ser interpretada como pré-julgamento no episódio. "Como presidente da Ordem, não posso achar nem dar palpite."D´Urso também se esquivou inicialmente de comentar o caso genericamente, sobre qual seria o procedimento correto de um advogado na orientação de seus clientes. No entanto, ao ser perguntado se a orientação à mentira é uma prática comum na advocacia, o presidente da OAB paulista reagiu, dizendo que advogados não orientam seus clientes a mentir."Não posso considerar assim. Óbvio que o advogado tem a obrigação de orientar seu cliente e de advertir. Não só de todos os mecanismos para sua proteção, como as garantias individuais, mas também do direito de não se auto-incriminar para não produzir prova contra si mesmo e, inclusive, de se calar. É obrigação do advogado orientar o cliente de todos esses mecanismos. Dentro de um plano ético é regular e aconselhável."Para D´ Urso, o advogado tem que usar de todos os meios estabelecidos nos limites da lei e do Código de Ética para defender os interesses de seu cliente. "Deve trazer, inclusive, a verdade de seu cliente, que muitas vezes pode se antagonizar com outras verdades. O universo do processo e da lide é um universo diferente, onde verdades e interesses se conflitam (...) Não se trata de mentira, mas de trazer uma verdade que é da parte", filosofou D´Urso.A mentira, segundo D´Urso, é uma questão "muito subjetiva". "O que é mentira? O advogado não trabalha com ela. Ele trabalha com a verdade trazida pelo seu cliente. É a mesma situação quando você escapa dos limites do processo. É aquela célebre frase: ´O que está nos autos não está no mundo´. Pode ter um dado importante no julgamento da causa que, se não constar no processo, nada vale. O que importa é a verdade do processo". Ele disse não acreditar que um advogado oriente seu cliente a mentir. "Advogado não fala isso", afirmou."Eu não concordo com a expressão mentira. A verdade trazida pelo cliente e trabalhada por seu advogado poderá sofrer uma orientação no sentido do réu trazer uma expressão de um sentimento. Muitas vezes, o advogado diz para seu cliente ir à audiência com paletó e gravata, ou cortar o cabelo, fazer a barba, enfim, se apresentar melhor. Nesse tipo de orientação não há nenhum problema ético. Pelo contrário, está dentro dos limites de orientação de como cliente deve se apresentar adequadamente à Justiça."Para ele, "Ás vezes, a captação da realidade de alguém pode ser completamente diferente por parte de outro. Mas, num plano objetivo, elas não existem ao mesmo tempo". No entanto, quando perguntado, D´Urso nunca chegou a dizer, explicitamente, se um advogado deve ou não mentir ou orientar seu cliente a fazê-lo. "O advogados tem o dever de trabalhar dentro dos primados éticos e legais, e dentre eles a honestidade, sem dúvida nenhuma. Qualquer outro avanço na interpretação disso, estaríamos nos avançando a fazer um juízo de valor sobre o caso".O Código de Ética e DisciplinaD´Urso precisou defender o Código de Ética e Disciplina da OAB mais de uma vez na coletiva, questionado quanto à sua subjetividade. "Ele é bastante longo, desce à minúcias e tem elementos para circundar a conduta do advogado. Mas não se esqueça que ele trata de uma conduta profissional e humana. Portanto, sempre há subjetividades."Para ele, sua aplicação simples: pega-se o elenco de regras contidas no código, além do caso concreto e se faz um confronto para obter uma posição. Se houver infringência dessas normas, há uma violação à ética.Ele citou alguns exemplos quanto ao procedimento correto da ação do advogado, como "o advogado deve-se pautar com destemor, independência, dignidade, honrando a profissão, fazendo com que nenhuma situação que antagonize possa freá-lo no seu desiderato (desejo) de fazer a melhor defesa dentro da lei e dos princípios éticos de seu cliente".
Fonte: Ultima Instância
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