Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - É bom esperar pelo segundo turno, em especial porque nada foi decidido em capitais importantes como Rio, São Paulo, Porto Alegre, Salvador e outras. De qualquer forma, com o pronunciamento de 130 milhões de eleitores, foi dada a partida oficial para a sucessão de 2010.
Lula, de um lado, e José Serra, de outro, vão desdobrar-se nas próximas três semanas para consolidar nas capitais e grandes cidades a vitória de seus candidatos no primeiro turno ou, com maior preocupação, tentar virar o jogo da votação incompleta de domingo. Um terceiro personagem também não perderá tempo. No caso, Aécio Neves.
O problema é que a eleição presidencial não se realizará entre o presidente da República e os governadores de São Paulo e de Minas. Do lado do Palácio do Planalto, contra Serra ou Aécio, ou contra os dois, tudo indica estará a ministra Dilma Rousseff. As eleições de anteontem demonstraram a dificuldade de transferência de votos, apesar da imensa popularidade do presidente da República. Fosse ele o candidato e conquistaria facilmente o terceiro mandato, mas indicada a sua chefe da Casa Civil ou outro companheiro qualquer, o processo muda de figura.
Alguns números ainda estão em aberto, como saber o número exato de prefeituras conquistadas pelos partidos, em 5.563 eleições. Até agora o PMDB liderava, dada sua força nos grotões. Detém 1.059 prefeituras, contra 790 do DEM, 620 do PSDB, 620, também, do Partido Socialista, 551 do PP, 436 do PR, 427 do PTB e 411 do PT. É claro que os resultados se invertem quando calculados os votos dados a cada legenda em função do eleitorado muito maior de grandes capitais e cidades maiores.
De qualquer forma, para a sucessão de 2010 voltam-se as atenções, com todas as variáveis imaginadas ou desconhecidas. Se por hipótese chegarmos ao final do primeiro semestre do ano que vem sem que Dilma Rousseff tenha decolado, estariam os atuais detentores do poder dispostos a, com todo o respeito, entregar o ouro ao bandido? Buscariam outro candidato, mesmo fora dos quadros do PT?
Os companheiros aceitariam? Ou colocariam na rua a procissão continuísta que o presidente Lula rejeita, mas contra a qual carecerá de forças para enfrentar? Soa como bobagem essa história de dizer que ele se prepara para daqui a dois anos ser sucedido por um adversário, visando voltar em 2014. No Brasil, já são precários os planos formulados para daqui a quinze minutos, quanto mais para daqui seis anos. Lembrai-vos do imbatível "JK-65"...
À hora do soco
Nem só de eleições vive um governo. A hora do soco na mesa já passou, ignorando-se tenha ou não sido dado em Manaus, dias atrás, quando o presidente Lula recepcionou o presidente do Equador, Rafael Correa. A oportunidade era para o Brasil deixar claro não haver gostado das bravatas do nosso hermano ao ocupar com força militar uma empresa privada brasileira, em seu território e mandando prender quatro de seus diretores. Tudo poderia ter sido resolvido pacificamente, mas Correa enfrentava crise interna e necessitava criar um inimigo externo para vencer um plebiscito.
Pois não é que fez mais, o histriônico aprendiz de Evo Morales? Ameaçou, no fim de semana, expulsar também a Petrobras, que para ele custa a cumprir acordos referentes a investimentos brasileiros em seu país. Exasperado, afirmou que o Equador não está pedindo esmolas.
Permanecerá o presidente Lula de braços cruzados e garganta fechada, como de vezes anteriores? Afinal, agora, não se trata de uma empresa privada, mas da Petrobras. Nossos vizinhos continuam abusando, o Paraguai e a Bolívia já começaram a invadir propriedades de brasileiros em seus territórios. Acusam-nos de imperialistas, mas a verdade é que permitiram que nossos agricultores e pecuaristas se instalassem lá, produzindo e pagando impostos. Se o gigante continuar dormindo em berço esplêndido, logo pagará o preço da desmoralização frente aos anões...
Razão ele teve, mas...
O presidente Lula até teve razão quando lavou as mãos e criticou empresas brasileiras que enfrentaram prejuízos de mais de um bilhão de reais com a recente crise gerada nos Estados Unidos. Conforme suas declarações, a Aracruz e a Sadia especularam contra o real, por ganância, devendo agora resolver seus problemas.
Só que não foi bem assim. A uma dessas empresas o Banco do Brasil, em setembro, liberou 900 milhões de reais a juros subsidiados.
Quanto à crise, o Lula também falou demais. Disse que o tsunami americano está chegando ao Brasil "como uma marolinha". Será? O dólar ultrapassou dois reais, a Bovespa despencou mais do que a Bolsa de Nova York e a equipe econômica vem injetando centenas de milhões no crédito para empresas exportadoras. Mesmo assim, as exportações continuam caindo e as importações tornando-se cada dia mais dispendiosas. Marolinha safada, essa, que já ultrapassou o litoral e aproxima-se de Brasília.
Mudaram os algozes
Duro mas monumental diagnóstico foi feito por mestre Saulo Ramos em artigo referente às perdas e aos ganhos da Constituição de 88. Para ele, aquilo que se via na ditadura, com militares instalados em funções civis, acontece agora com ex-sindicalistas, falsos líderes de comunidades urbanas e invasores de áreas rurais, "desde que assegurem dividendos eleitorais". São origens diferentes, mas iguais no despreparo técnico e na arrogância.
Saulo Ramos lembra que o Executivo voltou a dominar o Congresso exatamente como no tempo da ditadura. Não se utiliza da força ou da cassação de mandatos, mas obtém o mesmo efeito através de persuasões inconfessáveis como mensalão, cargos, diretorias de estatais, criação de ministérios com um número imensurável de empregos e sinecuras.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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