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quinta-feira, junho 05, 2008

Uma inusitada surpresa agradável

Por: Carlos Chagas

BRASÍLIA - O seu a seu dono. Uma das grandes surpresas políticas deste primeiro semestre é o presidente do Senado, Garibaldi Alves, do PMDB do Rio Grande do Norte. Seu comportamento tem sido impecável, na medida em que rejeitou a condição de simples tapa-buracos, depois da renúncia de Renan Calheiros, abraçando a defesa das causas mais polêmicas e necessárias à afirmação do Congresso.
Ainda esta semana, sem a menor contemplação, o representante potiguar vibrou tacape e borduna no lombo do governo, quer dizer, do presidente Lula. Denunciou vivermos um estado de exceção, ou seja, uma ditadura, enquanto persistir a prerrogativa de o governo baixar medidas provisórias sobre temas que nem de longe são relevantes e urgentes. Mais ainda: mesmo no regime militar, os decretos-leis eram obrigados a tratar de um único tema.
Caso não fossem votados em determinado prazo pelo Legislativo, perdiam eficácia. Pois agora as medidas provisórias envolvem cinco, seis ou mais assuntos distintos. Se não apreciados, trancam a pauta do Senado e da Câmara. Impedem decisões sobre quaisquer outras iniciativas.
Garibaldi lembrou que ano passado o Senado realizou 145 sessões deliberativas, mas em 89 delas os senadores ficaram de mãos amarradas, impedidos de votar projetos de importância nacional porque precisavam dedicar-se às medidas provisórias.
Do jeito que está não pode continuar, enfatizou Garibaldi Alves, para quem a Câmara precisa dar andamento a projeto aprovado no Senado, mudando a sistemática da intromissão do governo nas prerrogativas do Congresso. Importa menos se o Palácio do Planalto se opõe.
Teria agido de forma diversa outro presidente do Senado, desses que surgem apenas para completar mandatos. Bastaria ter ficado quieto, cumprindo a rotina, dirigindo sessões solenes e comparecendo a coquetéis. Talvez até fortalecesse mais sua intenção de voltar ao governo do Rio Grande do Norte, em 2010, ficando bem com todo mundo, a começar pelo presidente Lula. Pelo contrário, mesmo mantendo diálogo permanente com o governo e seu chefe, o senador não hesita em criticar com veemência o que lhe parece distorcido nas instituições e no relacionamento do Legislativo com o Executivo.
Sabe que a lei o impede de continuar na presidência do Senado no próximo biênio, ou seja, não opera em benefício próprio. Merece justo reconhecimento.
Começaram as disputas
Só em fevereiro do ano que vem serão escolhidos os novos presidentes da Câmara e do Senado, mas confirmando o provérbio árabe de que bebe água limpa quem chega primeiro na fonte, vão adiantadas as manobras visando à sucessão de Garibaldi Alves e Arlindo Chinaglia.
O PMDB é majoritário nas duas casas e teria, pelos regimentos internos, o direito de indicar os dois presidentes. Como todos sabem de onde o vento sopra, está acertado que um dos cargos será destinado ao PMDB, mas o outro ao PT.
Tudo indica que haverá uma inversão. Se hoje o Senado está entregue ao PMDB e a Câmara ao PT, as cadeiras serão trocadas. O PT indicará o presidente do Senado, tudo indicando o favoritismo do senador Tião Viana, e o PMDB, o presidente da Câmara, já concretizada a candidatura de Michel Temer, presidente do partido.
Nem tudo, porém, são favas contadas. Tião Viana poderá enfrentar resistência em suas próprias bancadas, porque a líder do partido, Ideli Salvatti, faz acampamento na curva do caminho. Sem esquecer nova personagem esta semana reintegrada ao Senado, a ex-ministra Marina Silva. Além disso, existe no PMDB uma corrente que deseja o estrito cumprimento da lei, ou seja, se o partido detém a maior bancada, deve indicar o presidente, independentemente do que acontecer na Câmara.
José Sarney nem de longe se integra a esse grupo, mas se o cavalo passar encilhado, não terá como recusar. Quem garante que até o começo do ano que vem PMDB e PT estarão entrosados e em aliança angelical?
Na Câmara, a recíproca não será verdadeira. O PT carece de condições para pleitear o lugar de Arlindo Chinaglia, cuja eleição já foi uma concessão dos peemedebistas ao poder. Especialmente se os companheiros passarem a dirigir o Senado. Agora, sairá obrigatoriamente do PMDB o novo presidente, com a maré favorecendo Michel Temer? Pode ser que não. O chamado baixo-clero mobiliza-se para demonstrar aos caciques partidários que eles podem muito, mas não podem tudo.
O exemplo da eleição de Severino Cavalcanti não deixa ninguém mentir. Movimenta-se o deputado Ciro Nogueira, que já disputou, mas é bom prestar atenção no deputado Inocêncio Oliveira, atual corregedor da casa, mas, antes, seu presidente. Ele deixou o PMDB, mas antes pertenceu ao PFL e hoje faz pouso no PR. Sabe tudo, dispõe de doutorado em Câmara dos Deputados, depois de sete mandatos.
Michel Temer manobra com habilidade, mas tem calcanhar-de-aquiles. É o presidente nacional do PMDB e terá de abandonar o cargo. Como existem três candidatos à sucessão partidária, se não conseguir compô-los poderá receber a má vontade dos derrotados. Íris Araújo, de Goiás, Eliseu Padilha, do Rio Grande do Sul, e Paes de Andrade, do Ceará, pretendem sucedê-lo.
Ciro vem aí
Ciro Gomes está sendo alertado para a máxima secular que diz não ser hora, antes da hora, mas, também, nem depois da hora. Com o presidente Lula apostando parte de suas fichas em Dilma Rousseff e os governadores José Serra e Aécio Neves em óbvia caminhada pela indicação tucana, já seria tempo de o ex-governador do Ceará começar a repetir 2002. Naquele ano ele chegou a liderar as pesquisas, na disputa contra Lula e contra Serra, perdendo oxigênio na reta final. Tentar novamente a terceira via parece o caminho natural, agora até com maior chance de sucesso, tendo em vista a pálida opção do PT, além do desgaste natural do governador de São Paulo.
Ciro está no Partido Socialista, não propriamente uma legenda pródiga em diretórios espalhados por todo o País, mas não lhe seria difícil recompor alianças passadas. O PTB, o PDT, o PR, o PC do B, o PV e penduricalhos, apesar de apoiarem o presidente Lula, não têm compromisso com qualquer outro companheiro ou companheira. E se as pesquisas favorecem o atual deputado, sempre lembrado, mesmo nas consultas espontâneas, a hora para deflagrar a pré-campanha é agora.
Vai faltar bife
Pior do que prender boi no pasto é prender boi no pasto que tem floresta ao lado. Porque basta uma simples picada aberta entre as árvores para esconder a boiada inteira até a eternidade. Além do que, mesmo se for preso, o boi morrerá de fome antes de chegar à cadeia. A sugestão do ministro Carlos Minc lembra aquela imagem que seria cômica se não fosse trágica, de policiais federais fantasiados de vaqueiros, a cavalo, tentando prender bois nos pastos de São Paulo e Minas Gerais, sem conseguir.
Isso aconteceu assim que o Plano Cruzado do presidente Sarney começou a naufragar e o congelamento dos preços da carne determinou o sumiço dos rebanhos. Minc pretende, agora, mobilizar a Força Nacional de Segurança, mas o efeito será o mesmo: polícia é para prender bandido. Deixem o boi em paz, senão logo acabará faltando bife nas panelas.
Fonte: Tribuna da Imprensa

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