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quarta-feira, dezembro 01, 2021

Mendonça descarta religião no STF e tenta se descolar de Bolsonaro em sabatina

por Renato Machado e Washington Luiz | Folhapress

Mendonça descarta religião no STF e tenta se descolar de Bolsonaro em sabatina
Foto: Edilson Rodrigues / Agência Senado

Indicado pelo presidente Jair Bolsonaro a uma vaga no Supremo Tribunal Federal, o ex-ministro André Mendonça assumiu o compromisso de defender a democracia e a Justiça durante sua sabatina nesta quarta-feira (1º) na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
 

O indicado, que deve enfrentar uma votação apertada por sua aprovação, também buscou se afastar em alguns momentos do mandatário do Planalto e seus seguidores e fez gestos para a classe política.
 

A sabatina na CCJ deve durar até o final da tarde. Depois disso, o nome de Mendonça deve ser submetido à votação do plenário do Senado ainda nesta quarta-feira.
 

Aos senadores o indicado "terrivelmente evangélico" de Bolsonaro também se comprometeu com a laicidade estatal, descartando o uso da religião no STF. "Como tenho dito quanto a mim mesmo: na vida, a Bíblia; no Supremo, a Constituição", afirmou.
 

Mendonça negou que tenha usado a Lei de Segurança Nacional para perseguir adversários do governo Bolsonaro.
 

O ex-advogado-geral da União é sabatinado na CCJ mais de quatro meses após sua indicação ter sido enviada para o Senado.
 

O presidente da comissão, Davi Alcolumbre (DEM-AP), resistia a pautar a sabatina, por defender para o cargo o nome do procurador-geral da República, Augusto Aras. O senador ainda entrou em atrito com o Palácio do Planalto, após ter perdido o controle sobre a distribuição de emendas parlamentares. ?
 

Em sua fala inicial na sabatina, Mendonça afirmou que usou a Lei de Segurança Nacional para pedir a instauração de inquéritos contra adversários de Bolsonaro em "estrita obediência ao seu dever legal".
 

Afirmou que a antiga legislação —revogada neste ano estava em vigor e que Bolsonaro se sentiu ofendido por algumas manifestações. Portanto, ele, como ministro da Justiça, estaria prevaricando se não agisse. No entanto negou que tenha perseguido adversários políticos.
 

"Em suma, minha conduta sempre se deu em estrita obediência ao dever legal e em função do sentimento de ofensa à honra da pessoa ofendida, mas jamais com o intuito de perseguir ou intimidar", afirmou.
 

Mendonça se comprometeu a defender o estado democrático de direito e enalteceu os regimes democráticos. Disse também que é preciso respeitar a separação entre os poderes.
 

No entanto, ao ser questionado sobre falas antidemocráticas e a defesa de regimes de exceção, afirmou que a transição para a democracia no Brasil não se deu com "derramamento de sangue".
 

"A democracia é uma conquista da humanidade. Para nós, não, mas em muitos países foi conquistada com sangue derramado e com vidas perdidas. Não há espaço para retrocesso. E o Supremo Tribunal Federal é o guardião desses direitos humanos e desses direitos fundamentais", afirmou.
 

O regime militar no Brasil, que durou duas décadas, teve uma estrutura dedicada a tortura, mortes e desaparecimento. Os números da repressão são pouco precisos, uma vez que a ditadura nunca reconheceu esses episódios. Auditorias da Justiça Militar receberam 6.016 denúncias de tortura. Estimativas feitas depois apontam para 20 mil casos.
 

Mais tarde, porém, Mendonça pediu desculpas pela fala e afirmou que ela não condiz com o que pensa. Afirmou que se referia ao fato de não ter havido uma guerra nas proclamações da Independência e da República.
 

Um dos temas predominantes de sua sabatina foi a sua religião, sendo o ex-ministro evangélico presbiteriano.
 

Ele respondeu em diversos momentos que vai resguardar a laicidade do Estado e chegou a rebater o presidente Bolsonaro, que havia pedido orações durante as sessões do Supremo Tribunal Federal.
 

"Diante até da fala do presidente de oração durante as sessões, eu até expliquei a ele que não há espaço para manifestação pública religiosa durante uma sessão do Supremo Tribunal Federal", disse.
 

E completou: "lógico que eu vou preservar a minha individualidade, a minha manifestação individual e silenciosa, o que nós chamamos na igreja, uma oração silenciosa, individual, mas compreendendo a separação que deve haver entre atuação pública e atuação religiosa nesse sentido".
 

Mendonça também buscou se afastar de Bolsonaro e de seus apoiadores em diversos momentos da sabatina.
 

Enalteceu, por exemplo, o trabalho da CPI da Covid, tantas vezes atacada pelo chefe do Executivo. Sem citar nomes, chegou a falar em desvio de conduta de autoridades durante a pandemia.
 

"Nesse contexto, eu queria dizer que, em muitos momentos, eu pude observar que as autoridades foram aprendendo durante o processo. Logicamente, as situações podem ter extrapolado o que é o erro da má gestão e, às vezes, do desvio de conduta", afirmou.
 

Também prometeu total independência, caso seja efetivado no Supremo Tribunal Federal. A fala acontece depois de Bolsonaro ter dito que tem "10% de mim dentro do Supremo", em referência ao ministro Kassio Nunes Marques, indicado por ele.
 

"Sempre pautei minha vida pública pelo respeito aos princípios da administração pública, não obstante sei a distinção entre os papéis de um ministro de Estado e de um ministro do Supremo Tribunal Federal", afirmou.
 

"Sei que, se aprovado por este Senado Federal, estarei credenciado a assumir o cargo de juiz da Suprema Corte do nosso País, incumbência que vai muito além de um governo, abrange a Nação como um todo e o seu futuro, exige independência plena para julgar, de acordo com a Constituição e as leis", completou.
 

O indicado à vaga também fez um aceno à classe política, ao criticar a delação premiada. Mendonça havia sido ligado à Operação Lava Jato, quando vieram à tona mensagens que mostram que ele se reuniu com integrantes da força-tarefa e atuou para impulsionar a agenda política dos procuradores.
 

"Também entendo que uma delação premiada não é elemento de prova. Eu não posso basear uma convicção com base em uma delação. Delação não é acusação".
 

Ele ainda lembrou que defendeu a prisão em segunda instância quando o STF julgou o assunto, mas afirmou que a decisão só deve ser revista se houver alguma iniciativa do Congresso.
 

"Entendo que a questão está submetida ao Congresso Nacional, cabendo a este deliberar sobre o tema, devendo o Supremo Tribunal Federal revisitar o assunto apenas após eventual pronunciamento modificativo por parte do Poder Legislativo sobre a matéria e caso o Judiciário seja provocado a fazê-lo", disse.
 

*
 

ENTENDA TRAMITAÇÃO DAS INDICAÇÕES NO SENADO
 

- A avaliação sobre a nomeação é feita pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). Para iniciar o processo, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), deve ler o comunicado da indicação em plenário, o que já foi feito;
 

- A principal etapa na comissão é a realização de uma sabatina do candidato pelos congressistas. Concluída a sabatina, a CCJ prepara um parecer sobre a nomeação e envia a análise ao plenário;
 

- A decisão sobre a indicação é feita em uma sessão plenária da Casa. A aprovação do nome só ocorre se for obtida maioria —ao menos 41 dos 81 senadores;
 

- Depois da aprovação pelo Senado, o presidente pode publicar a nomeação e o escolhido pode tomar posse no tribunal.

Bahia Notícias

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