Ariel Palacios
BUENOS AIRES - A presidente Cristina Kirchner e seu marido e ex-presidente Néstor Kirchner sofreram na madrugada de ontem uma derrota sem precedentes ao perder a votação no Senado do projeto de lei do governo que determinava polêmicos aumentos dos impostos aplicados sobre as exportações agrícolas.
O autor final do revés foi o vice-presidente Julio Cobos, que - visivelmente nervoso e com voz vacilante (depois de indicar que era "o dia mais difícil" de sua vida) - na categoria de presidente do Senado decidiu o empate de 36 a 36 votos entre os senadores.
Com seu voto de Minerva, Cobos - que nas últimas semanas havia declarado estar contra o projeto do governo - determinou a derrota da presidente Cristina, dando a vitória à Oposição e os ruralistas. Além do impacto político no governo, a derrota no Senado também implicará em problemas financeiros para os Kirchner.
Sem o "impostaço" agrário, Cristina deixará de arrecadar mais de US$ 2 bilhões neste ano, essenciais para manter um amplo superávit fiscal que permitisse ao governo manter de forma confortável sua política de subsídios e assistencialismo.
No entanto, embora o projeto de lei tenha sido recusado, ainda falta que o governo revogue um decreto assinado em março que estipulou os aumentos que geraram a rebelião fiscal rural. Os aumentos foram o pivô do conflito que o governo manteve com o setor ruralista durante 128 dias.
A crise provocou o estancamento da atividade econômica e a disparada da inflação. O Senado debateu o projeto durante 18 horas. A reta final da sessão foi acompanhada por panelaços em Buenos Aires e nas principais cidades do interior em protesto contra a presidente Cristina. Após o resultado, às 4h30 da madrugada, os ruralistas celebraram nas ruas gritando o nome de Cobos.
Furiosos com a derrota - e o voto de Cobos - militantes kirchneristas que estavam acampados na frente do Congresso Nacional, gritaram insultos contra o vice-presidente, ao qual chamaram de "traidor", e arremessaram objetos contundentes contra o edifício. Seis horas depois, Cobos, após ressaltar que não pretendia renunciar ao cargo, partiu para sua província natal, Mendoza, para evitar problemas com simpatizantes kirchneristas.
"La Cámpora", uma organização da "Juventude Kirchnerista" comandada pelo filho dos Kirchner, Máximo Kirchner, exigiu hoje a renúncia de Cobos por "deslealdade com o povo". O líder do bloco kirchnerista no Senado, Miguel Ángel Pichetto, declarou que "a História julgará Cobos de forma negativa" e que o vice "infligiu um grave dano ao governo". As lideranças da Oposição festejaram a derrota dos Kirchner e ressaltaram que trata-se de um divisor de águas na política argentina.
Com a derrota, a Oposição recupera esperanças de poder derrotar o governo nas eleições parlamentares do ano que vem. Elisa Carrió, líder da centro-esquerdista Coalizão Cívica, afirmou que a presidente Cristina deveria excluir seu marido, Kirchner, das decisões do governo.
No primeiro dia após a derrota dos Kirchner, os mercados reagiram positivamente. O denominado "Efeito Cobos" levou a Bolsa portenha a fechar em alta de 0,8%. Os bônus da dívida pública permaneceram estáveis, enquanto que o dólar ficou imutável. O índice de risco do país caiu 23 pontos e encerrou a jornada em 634 unidades.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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