Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - De um lado, e apesar dos excessos, só há que louvar as operações da Polícia Federal no combate aos crimes de colarinho branco. De outro, porém, prevalece aquele que segundo o senador Pedro Simon é o maior dos escândalos nacionais: a impunidade. Quantos corruptos foram sentenciados, nos últimos dez anos, depois de comprovadamente envolvidos em falcatruas, evasão e lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta, fraude fiscal e formação de quadrilha, entre outros crimes?
Exceção de alguns bagrinhos, nem mesmo presos provisoriamente os responsáveis se encontram. Certos processos foram abertos, mas andam a passos de tartaruga, como os referentes ao mensalão, aos sanguessugas e outros.
Não se espera que nas eleições municipais de outubro candidatos a prefeito e vereadores venham levantar a questão em suas campanhas. Saltam de banda, uns, e confessam-se incompetentes, outros, dentro das atribuições dos cargos a que concorrem. No máximo, no caso dos que disputam as prefeituras, podem prometer que durante sues mandatos não haverá roubalheira.
Sendo assim, sobressai a evidência de que a impunidade virou questão federal. Suas soluções só poderão ser debatidas nas eleições de 2010, menos para governador e deputado estadual, mais para presidente da República e para o Congresso.
Muitos dirão ser cedo, faltam dois anos e dois meses para aquelas eleições, nem se sabe ao certo quais os candidatos que se apresentarão, mas se a impunidade nos assola há décadas, os partidos já deveriam estar preparando projetos, propostas e roteiros. Fazer o que para combater essa praga, impor justiça e levar os corruptos para a cadeia?
Vale repetir, não se imagine, hoje, nos intervalos da propaganda do PAC, dona Dilma Rousseff pronunciando-se sobre o que fazer com os ladravazes. Nem José Serra, sequer Aécio Neves, Ciro Gomes e outros personagens esboçados. O problema é que a impunidade será, sem sombra de dúvidas, um dos temas mais sensíveis para a próxima sucessão. Claro que junto com o combate à pobreza, as mazelas da saúde pública, o vazio na educação, os desníveis regionais e tantos outros.
Todo esse preâmbulo se faz para uma conclusão: se é em torno da impunidade que dezenas de milhões de eleitores decidirão sobre o próximo inquilino do Palácio do Planalto, por que não eliminar intermediários e ir direto à melhor solução? No caso, até agora sem candidato, porque o PMDB, maior partido nacional, não lança logo a candidatura de Pedro Simon? Hipótese impossível? Certamente. E sabem a razão? Porque, se eleito, o senador gaúcho poderia acabar mesmo com a impunidade. Coisa que, no fundo, poucos desejam...
Ilhas privilegiadas
O projeto não deveria sequer ter sido apresentado, muito menos votado e transformado em lei, à espera da sanção do presidente da República. Como estamos no Brasil, infelizmente todas as etapas anteriores foram cumpridas, estando à derradeira.
Que lei? A que proíbe a Polícia Federal de promover busca e apreensão de documentos e de computadores nos escritórios de advogados. Mesmo sabendo-se que essas situações só podem acontecer com autorização judicial, isto é, com a subordinação da Polícia Federal ao Poder Judiciário, o Congresso decidiu pela aprovação.
Terá sido pelo grande número de advogados no exercício de mandatos de deputado ou senador? Ou porque o autor da proposta foi um advogado de inequívoco poder político, o presidente do PMDB, Michel Temer, agora candidato a retornar à presidência da Câmara?
Porque o projeto não tramitou motivado pela necessidade de preservar direitos humanos. Seria o oposto, como é, ou seja, a criação de uma categoria especial de privilegiados postos acima e além da Constituição.
Os escritórios de advocacia parecem prestes a transformar-se em ilhas privilegiadas, até mesmo submetidos à pressão de bandidos de toda espécie, comuns ou de colarinho branco, fiados na evidência de que seus negócios escusos estariam a salvo de investigações.
Cabe à Justiça funcionar como tábua de salvação, pronunciando-se pela inconstitucionalidade da lei. Mas os juízes, desembargadores e ministros dos tribunais superiores, exceção do Superior Tribunal Militar, não precisam ser obrigatoriamente advogados? Agiriam contra sua própria classe?
Distância perigosa
A proximidade das eleições de outubro revela mais uma distorção em nosso sistema eleitoral: paradoxalmente, a distância entre os partidos e o eleitor. Basta pegar as principais capitais dos estados, mas a conclusão se estende aos municípios mais recônditos: o eleitor votará em pessoas, não em partidos. O PT, que um dia pareceu o aríete capaz de derrubar o personalismo político, naufragou diante dele desde que Lula tornou-se maior do que a legenda. A moda pegou e os partidos tornaram-se meros apêndices ou joguetes nas mãos dos indivíduos.
Muita gente acha melhor assim, tendo em vista que os partidos, com raras exceções, sempre foram feudos de caudilhos, tabas para a afirmação do poder dos caciques. Seria necessário, primeiro, a democratização dos partidos, sua transformação em instrumentos da vontade coletiva. Como essa meta talvez demore de 200 a 300 anos para realizar-se, prevalecem os indivíduos. Talvez por isso tenha-se tornado corriqueiro o troca-troca, quando determinado líder julga-se prejudicado por outro mais poderoso e decide bandear-se para onde possa fazer valer sua importância.
Vale repetir, Lula é maior do que o PT, ninguém duvida. Mas no passado, não tem assim? Fernando Henrique suplantou e reduziu a influência dos tucanos. João Goulart era o PTB. Juscelino Kubitschek mandava no PSD. Getúlio Vargas, no PTB e no PSD. Deram-se mal Itamar Franco e Fernando Collor, apesar da ironia de não disporem de um partido de verdade.
Em suma, a relação direta entre o governante e o eleitorado conduz a rumos perigosos, mas na realidade em que nos encontramos, não seria pior se ele governasse através de um partido? O argumento serve para não se pensar tão cedo na implantação do parlamentarismo entre nós...
Fonte: Tribuna da Imprensa
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