Testemunha-chave do escândalo do mensalão, que desencadeou com denúncias em junho de 2005, o presidente nacional do PTB, ex-deputado Roberto Jefferson, assumiu tom surpreendentemente mais moderado em seu depoimento como réu no processo do Supremo Tribunal Federal (STF). Confirmou genericamente a denúncia do esquema de compra de parlamentares pelo Executivo, mas se recusou a acusar diretamente outros denunciados - evitou ser muito específico até contra quem sempre atacara, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu - e rejeitou a oferta do juiz Marcelo Gramado, da 7ª Vara Criminal Federal, para denunciar outros envolvidos, em troca de benefícios. "Delação premiada é coisa para vagabundo", sentenciou.
À vontade, aproveitou para atacar o PT, o Ministério Público (MP) e a Polícia Federal (PF). "Não posso acusar o presidente (Luiz Inácio) Lula (da Silva), seria irresponsável da minha parte", disse a jornalistas, após o depoimento, e mudando o tom em relação à sua postura durante o escândalo, quando ameaçava levar o mau exemplo para o Palácio do Planalto.
Mais de uma vez, Jefferson disse que falaria apenas como acusado, "pelos fatos que lhe são imputados", se recusando a se pronunciar, especificamente, sobre outros réus. Foi o que aconteceu quando o magistrado lhe perguntou se confirmava acusações em relação a Dirceu, ao ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e ao empresário Marcos Valério de Souza, de operar o esquema de compra de parlamentares.
Quando o magistrado insistiu com relação a Dirceu, o petebista admitiu, em tom genérico, que o petista tinha responsabilidade política - mas sem ser mais direto. "Excelência, o ministro José Dirceu era o ministro político do governo", declarou. "Todos os acordos tinham a chancela dele".
Jefferson confirmou ainda que Dirceu lhe pediu que indicasse alguém do PTB para ir a Portugal cuidar de "interesses do PTB e do PT". Tratava-se de uma dívida de campanha de R$ 24 milhões. A reunião seria para discutir uma forma de a Portugal Telecom pagar o débito, que, em euros, chegaria 8 milhões, numa operação evidentemente ilegal.
O ex-deputado também confirmou ter participado, na Casa Civil, de várias reuniões com Dirceu, e relatou ter conversado também com o então presidente do PT, José Genoino, o então secretário-geral Silvio Pereira e o tesoureiro Delúbio Soares.
Também advogado criminalista, o ex-deputado assumiu tom quase elogioso em relação ao presidente Lula, que, afirmou, chegou a ficar com lágrimas nos olhos quando o petebista lhe contou, pela primeira vez, em janeiro de 2005, que fora montado no Congresso o mensalão.
Aluguel de deputados
Ele afirmou ter dito ao presidente: "O PT está participando de um troço que vai ser um escândalo, está alugando deputado". Lula foi surpreendido, disse, mas não alguns de seus ministros, como Dirceu e outros, como o ex-ministro das Comunicações Miro Teixeira, que denunciou o esquema em 2004, em entrevista ao "Jornal do Brasil", depois desmentida.
Ele disse ter falado do esquema a integrantes do ministério. Depois disso, afirmou, Lula tomou providências, gerando insatisfações. Em março de 2005, relatou o petebista, ele voltou a pedir a Lula que agisse contra o mensalão, em conversa no Palácio do Planalto.
Foram testemunhas, afirmou, os deputados Aldo Rebelo (PCdoB-SP), Arlindo Chinaglia (PT-SP) e Walfrido dos Mares Guia (PTB-MG). "Nunca tinha visto transferência de dinheiro mensal. O cafezinho no fundo do plenário (da Câmara) era um escândalo, as conversas eram de quinta categoria", recordou.
"Ninguém, porém, deixou o PTB atraído pelo mensalão porque ele ameaçou denunciar na tribuna da Câmara quem agisse dessa forma", declarou. Um dos resultados das "providências" de Lula após a primeira denúncia, afirmou Jefferson, foi a eleição, para a presidência da Câmara, de Severino Cavalcanti (PP-PE), ocorrida logo depois.
"(A intervenção do presidente) Agudizou a crise", relatou o ex-deputado, mas o motivo principal da vitória do deputado, expoente do baixo clero que acabou forçado à renúncia em meio a um escândalo envolvendo pagamento de propina, foi outro, segundo Jefferson.
"O PT insistiu em lançar uma mala candidato a presidente", afirmou, se referindo ao então deputado Luís Eduardo Greenhalgh (PT-SP). "O presidente Lula o chamava de Mococa. Um deputado do PT de São Paulo, não lembro o nome dele, não falava com ninguém".
Diante dos procuradores da República José Alfredo de Paula Silva e Fábio Seghese, Jefferson ironizou "os meninos do Ministério Público", atribuindo acusações que recebeu a suposto rancor da instituição, porque em 1990 foi relator da primeira proposta reforma da Previdência.
"Gerei muitos ressentimentos no Ministério Público, nas Forças Armadas, na magistratura", disse. "Isso (a proposição que fez, de uma previdência em parte privada) fez com que eu tivesse até ameaças de morte". Jefferson também driblou a pergunta do juiz sobre se houve mensalão em uma votação da reforma tributária.
"Em todas as propostas de reforma tributária, o PTB se coloca favoravelmente", desviou. Quando o magistrado perguntou se o PTB recebera mensalão, reagiu. "Claro que não! Isso é coisa do Ministério Público. Intriga!"
Fonte: Tribuna da Imprensa
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