Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - Salvo inusitado, instala-se hoje a CPI mista dos Cartões Corporativos. A estratégia do governo, com o apoio velado dos tucanos, é de preservar o presidente Lula e seus familiares de investigações incômodas a respeito de seus gastos, com a contrapartida de acontecer o mesmo com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
O resultado previsível é de que poderão ser expostos, no máximo, alguns bagrinhos, uns tantos seguranças e pequenos funcionários flagrados no uso abusivo de cartões, mas proibida a investigação sobre aqueles que diretamente utilizaram seus cartões servindo familiares do presidente da República. E do antecessor.
Fala-se no previsível, demonstrando a experiência que o imprevisível muitas vezes atropela equações tranqüilas. E se um dos possíveis depoentes, por exemplo, para evitar uma punição injusta, decidir botar a boca no trombone e dizer que agia a mando dos familiares supostamente blindados? Cada episódio político traz incrustados certos germes dos quais só tomamos conhecimento depois de terem causado a infecção. Olha aí o caso do caseiro, que não deixa ninguém mentir.
O governo, ao contrário das impressões que busca passar, não se encontra tranqüilo. Muito pelo contrário. Afinal, são 11.510 portadores de cartões corporativos, no Executivo. A roda da fortuna, ou do infortúnio, poderá muito bem levar um deles a falar demais. Demais para os detentores do poder, não para a sociedade, que se duvida dos resultados da CPI mantém no recôndito do cérebro a esperança de ver desfeita a farsa agora encenada. Convém aguardar...
Um só objetivo
Qual o objetivo da singular entrevista do senador José Sarney à "Folha de S. Paulo" de ontem, contrariando a postura que vem de anos, de fechar-se em sua atuação, abrindo exceção, apenas, para certos discursos parlamentares?
Porque o ex-presidente não disse nada de novo. Que a Constituição de 1988 tornaria o País ingovernável, falou logo depois da promulgação. Que necessitamos de uma reforma política de verdade, trata-se de voz corrente no País há décadas.
Detecta-se apenas uma novidade, ou melhor, um objetivo explícito nessa súbita aparição de uma das maiores raposas felpudas da política nacional: a necessidade de agradar a ministra Dilma Rousseff, venha ela, ou não, a impedir a nomeação dos apadrinhados do senador pelo Amapá. Sarney chegou à ante-sala do lançamento da chefe da Casa Civil à presidência da República, e não foi de graça. Muito menos por se mostrar entusiasmado com a possível candidatura dela.
Eis um enigma a decifrar, dentro de um mistério. O ex-presidente não seria tão infantil a ponto de achar que elogiando Dilma conseguirá nomear o futuro presidente da Eletrobrás. Se conseguir, será um dividendo extra, jamais caracterizando seu objetivo principal. Nem mesmo a vontade de agradar o presidente Lula pode inserir-se como fundamental na tática de Sarney.
É preciso olhar para o lado oposto. Ao exaltar a candidatura da ministra, podem turvar-se os holofotes que vinham iluminando as candidaturas de José Serra, Aécio Neves e Ciro Gomes. Uma espécie de apagador sobre o quadro-negro.
Agora, mais fácil do que perscrutar a quem o senador pretende realmente beneficiar, como candidato, será imaginar todo o petróleo do megacampo da bacia de Santos sendo extraído de uma só vez. Quem quiser que decifre a esfinge, aliás, jamais interessada em devorar alguém. Prefere cooptar os consulentes...
Conversas delicadas
A ciência ainda não conseguiu descobrir o moto perpétuo, mas a política, pelo jeito, chegou lá. Depois da Guiana francesa e do Pólo Sul, o homem viaja outra vez. Esta semana, para Buenos Aires. Vai encontrar-se com a presidente Cristina Kirchner, anfitriã, e com o presidente Evo Morales, da Bolívia. Entre jantares, rapapés e convescotes, os três estarão discutindo a delicada situação do gás boliviano. A Argentina quer mais, o Brasil não se contenta com o que recebe e a Bolívia precisa limitar os repasses, se pretende desenvolver-se.
Importa menos se o presidente Lula irá sentar-se à mesa com o poderoso cacife de estar financiando o gás boliviano, extraído às expensas da Petrobras. O problema é que o dono da banca, Evo Morales, tem o poder de fechar o cassino. Já à Argentina, com menos fichas, sempre restará a hipótese de obter seus objetivos por via transversa, ou seja, forçar o Brasil a recuar.
Nossa economia depende, em boa parte, do comportamento dos "hermanos" lá de baixo. Mas são cartas poderosas interromper as exportações de trigo para nós, fechar as fronteiras às importações industriais que a Argentina faz do Brasil, e prometer à União Européia abastecê-la da carne bovina que mandávamos e não mandamos mais. Mais proveitosa terá sido para o presidente Lula a viagem à terra dos pingüins...
Não abre mão
Disposto a ter paciência infinita diante das múltiplas e até conflitantes reivindicações do PMDB para ocupar diretorias de estatais, o presidente do partido, Michel Temer, não se descuida de um objetivo maior: chegar ao fim do ano como candidato único e previamente eleito para a presidência da Câmara, no biênio 2009-2010. E com chances do repeteco, pois o regimento interno permite que continue em 2011-2012, caso o PMDB permaneça como a maior bancada, nas próximas eleições.
Não parece fácil compor as diversas alas e variadas correntes do partido, sempre ávidas de ocupar espaços, mas Temer sabe que se pender para um lado, qualquer que seja, estará fornecendo munição para o outro lado criar-lhe dificuldades.
Acresce mais um problema: PMDB e PT acertaram-se na atual legislatura, um ficando com a presidência da Câmara, com Arlindo Chinaglia, outro com a presidência do Senado, com Renan Calheiros e agora Garibaldi Alves. Será mantida a dobradinha, se o PMDB eleger ainda mais senadores do que os que já dispõe?
Fonte: Tribuna da Imprensa
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