Villas-Bôas Corrêa
Repórter Político do JB
À margem do caudaloso rio de lama que atravessa o território dos três poderes com as revelações da Operação Santiagraha, investigada pela Polícia Federal e que denunciou a rede operada pelo banqueiro Daniel Dantas – garantindo a liderança absoluta do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ainda na metade do segundo mandato, como o recordista de escândalos em toda a história deste país, o Congresso andou esbarrando com a ética e, de maneira surpreendente, escapou de despencar no bueiro, com risco de quebrar o pescoço.
A rapinagem no cofre da viúva foi articulada nos esconsos do plenário e nos cochichos nos corredores e envolveu a Mesa Diretoria do Senado, com a adesão entusiástica à proposta indecorosa da criação de 97 cargos de assessores, a serem preenchidos pelos 81 senadores no rateio de parceiros do golpe, ao custo anual de cerca de R$ 12 milhões.
Cada um dos 97 assessores técnicos, de competência presumida, com a dispensa da exigência constitucional do concurso público, embolsaria R$ 9.970,24 mensais. Nem todos, pois o senador nomeante poderia dividir o mimo entre vários favoritos.
Ora, para a estafante carga de trabalho nos três dias úteis da semana, cada senador dispõe, no seu confortável gabinete privativo, de seis assessores de livre nomeação e seis secretários parlamentares.
Gente é o que não falta. Como toda regra tem exceções, nunca se fez a estatística ou a reportagem sobre a rotina dos 81 gabinetes senatoriais e dos 513 deputados federais.
Mas, é de uma evidência de sol de meio-dia que a ociosidade compulsória, pela falta do que fazer ganha de goleada dos exemplos de dedicação em tempo integral de parlamentares que levam a sério o seu mandato.
Em período mais ameno, com alguns protestos abafados pelo entusiasmo da maioria, a proposta de criação de assessores seria aprovada em tempo recorde. Mas, com a campanha municipal para a eleição de prefeitos e vereadores na rua e na rede nacionais de TV e emissoras de rádio – a base que deverá garantir a reeleição de senadores e deputados, no mutirão da escolha do presidente da República e governadores caiu em si e sorveu de um gole o cálice do juízo.
Os ilustres componentes da Mesa Diretora do Senado que aprovou a proposta brejeira, deram meia volta e tomaram a iniciativa de comunicar ao presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN) a decisão do recuo.
O presidente, o único derrotado no oba-oba da suspeita proposta, cuidou do enterro do natimorto antes do recesso parlamentar.
Um corretivo retardado, mas que pegou o último bonde. Até então, solitário no pódio, o deputado Clodovil Hernandez, dos mais votados da bancada paulista, desfrutava o justo reconhecimento da sociedade decepcionada com a crise ética que devasta o conceito do Congresso, com a apresentação da surpreendente emenda constitucional, com o número regimental de assinaturas, que propõe a redução de três para dois senadores por Estado e de 513 deputados federais para duas centenas e quebrados.
A possibilidade de sua aprovação a frio, é zero. O que em nada desmerece a atrevida iniciativa de um deputado estreante e que está abrindo o seu caminho, saltando pelos muitos erros cometidos com os exageros do seu temperamento.
A crônica dos deputados que se elegem na onda de popularidade construída em atividades profissionais com largo contato com o público é sabidamente frustrante. São meteoros que riscam o céu e desaparecem na mediocridade da atuação parlamentar omissa, equivocada e, às vezes, ridícula.
O famoso Clodovil Hernandez pagou todos os micos da fama e das tentativas de furar a barreira apelando para o repertório das excentricidades.
Afinal, acertou um tiro na mosca. E que deve estar incomodando a muita gente.
Fonte: JB Online
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