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segunda-feira, julho 21, 2008

Mandatários e magistrados no jogo da

"Os magistrados têm clareza de que a Justiça, como está, é ruim. Os juízes trabalham muito, mas não trabalham para distribuir Justiça." (Maria Tereza Sadek, pesquisadora, considerada uma das maiores autoridades sobre o Judiciário brasileiro)
Como disse na sexta-feira, o ministro Gilmar Mendes não pode ser crucificado como se fosse o único a exorbitar, porque ele é parte de todo um sistema que já foi cognominado "a ditadura da toga", a mais perigosa das ditaduras, segundo o ex-governador de São Paulo, Cláudio Lembo.
Políticos e magistrados são duas faces da mesma moeda. Os políticos têm mandatos de 4 anos, submetidos ao julgamento das urnas. Os magistrados, mesmo os que entram pele cota do "quinto constitucional" (indicados pela OAB e Ministério Público), ficam nos seus cargos até os 70 anos, ao contrário do que acontece em "modelares" países democráticos, como EUA e Suíça, onde são eleitos por tempo determinado.
Para a segunda instância em diante, são promovidos por deliberações inter corporis ou indicações exógenas e chegam às altas cortes sem o estresse dos concursos. Todos são vitalícios e inamovíveis, de acordo com o artigo 95 da Constituição Federal.
Qualquer candidato a qualquer posto eletivo, mesmo de vereador nos cafundós do Judas, é obrigado a tornar pública a sua Declaração de Bens, nem que seja só um fusca ou uma raspa em sua conta, ainda que não tenha a menor possibilidade de se eleger. Os magistrados, não. A evolução do seu patrimônio é protegida pelo sigilo fiscal, como os brasileiros da área privada, embora sejam titulares de amplos poderes de decisão.
Os políticos são diariamente questionados pela mídia, até porque são travessos mais da conta. Os magistrados, não. A menos que algum deles seja pilhado em operações policiais orientadas pelo Ministério Público, suas decisões, por mais insustentáveis, são sintomaticamente acolhidas com o silêncio da grande mídia.
Fora de controle
Os magistrados exigem que os advogados cumpram cronometricamente os prazos. Já eles usam e abusam da protelação: procrastinam até a publicação dos seus votos, evitando que uma decisão seja cumprida em função dessa atitude, embora a Constituição Federal prescreva, em seu Artigo 93, inciso II: "e) não será promovido o juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou decisão". Os políticos são cassáveis (apesar da pizzaria) e sofrem impeachment, como aconteceu com o próprio presidente da República, Fernando Collor de Mello.
De 2004 para cá, houve troca de prefeitos em 296 cidades. Desses afastamentos, 60,5% (179) se deram por cassação de mandato. No Congresso, quem não foi cassado nos processos abertos na legislatura passada também não conseguiu reeleger-se.
Mais grave: graças a essa "ditadura da toga", mandatários foram cassados por LIMINARES da Justiça Comum, independente do absurdo alegado em alguns casos.
No âmbito da magistratura, a realidade é outra. O ex-presidente do TJ de Rondônia, desembargador Sebastião Teixeira Chaves, preso em agosto de 2006 sob a acusação de integrar uma quadrilha de alto quilate que roubou R$ 70 milhões dos nossos impostos, teve como punição do Conselho Nacional de Justiça a aposentadoria com vencimentos proporcionais ao tempo de carreira, que passam dos R$ 20 mil mensais.
Aliás, esse Conselho até hoje não disse a que veio. Que o diga o conselheiro Paulo Lobo, indicado pela OAB, e tido como uma "voz dissonante no CNJ". Em entrevista ao jornal "O Globo", em 30 de março de 2008, ele lamentou que, em quatro anos de existência, foi punido apenas um magistrado, exatamente o "condenado" a receber uma gorda aposentadoria.
Se o CNJ, que seria a ferramenta de controle externo do Judiciário, já claudicava antes, a "doutrina" do ministro Gilmar Mendes reduziu ainda mais seu poder controlador. Ele assumiu sua presidência afirmando que o conselho não pode dar prioridade a processos disciplinares contra juízes acusados de corrupção. Esta seria matéria do respectivo Tribunal de Justiça.
Já os desembargadores não punem os colegas, como aconteceu na investigação interna sobre direcionamento de processos pela "forma 4", no TJ-RJ, em 2004, com base em denúncia do escritório de advocacia Andrade & Fichtner.
Naquele caso, o então presidente do TJ-RJ, Miguel Pachá, informou que remeteu o caso para o Ministério Público. "Só o Ministério Público pode investigar", afirmou. Segundo Pachá, o tribunal foi "até o limite que a lei permitia", uma vez que "a lei não permite que a Justiça investigue".
Situação privilegiada
Os magistrados não podem se queixar dos vencimentos, nem da falta de juízes. Estão abertas as inscrições para juízes substitutos do Distrito Federal e Territórios: o vencimento inicial previsto em edital é de R$ 21.005,69.
Neste mesmo instante, o Colégio Pedro II, o maior padrão salarial do ensino médio oficial, abriu concurso para professores, com salários de R$ 2.095,35 (graduados) a R$ 3.456,35 (doutores). No Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, há 15 vagas de nível superior, com vencimentos de R$ 1.747,83. No Rio, a Prefeitura abriu concurso para o cargo de professor I - ciências, com salário é de R$ 1.032,58.
No Ministério da Marinha, foram abertas em abril 83 vagas para engenheiros e analistas, com vencimentos iniciais de R$ 3.425,87. Para 63 vagas de tecnologista (nível superior) o Ministério de Ciência e Tecnologia ofereceu um inicial de R$ 2.982,00.
A burocracia judicial custa mais de 3,5% do PIB do Brasil e, nesta área, é uma das maiores despesas do mundo. É um investimento maior do que o que se faz em educação no País. Se somarmos as despesas com os demais órgãos jurídicos, o valor final ultrapassou R$ 130 bilhões, em 2007, ou 5% do PIB .
Já a quantidade de magistrados no Brasil é de um para cada 13 mil habitantes, próxima da média mundial, perdendo apenas para a Alemanha. No Rio, só na Justiça Comum, há 180 desembargadores e 800 juízes de primeira instância sem contar as centenas de "juízes leigos".
No Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, ao contrário de São Paulo, ainda há um fundo que retém nos seus cofres parte de todas as taxas judiciais cobradas. Operado pela Corregedoria, esse fundo arrecada tanto que o TJ-RJ já emprestou dinheiro para o Governo do Estado.
Há muito mais o que falar para levar os que ainda pensam a uma discussão produtiva sobre algo que põe em xeque o próprio quimérico regime de direito.
coluna@pedroporfirio.com
Fonte: Tribuna da Imprensa

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