Por: Carlos Alberto Di Franco (Estado de São Paulo)
Recentemente, depois de uma conversa com estudantes, em São Paulo, fui abordado por um universitário. Leitor voraz, inteligente e apaixonado, seus olhos emitiam um sinal de desalento. "Deixei de ler jornais", disse de supetão. "Não adianta o trabalho da imprensa", prosseguiu meu jovem interlocutor. "A impunidade venceu." Confesso, caro leitor, que meu otimismo natural estremeceu. Não se tratava do comentário de alguém situado no lusco-fusco da existência. Não. Era o diagnóstico de quem está nascendo para a vida. Por uns momentos, talvez excessivamente longos, uma pesada cortina toldou o meu espírito. Acabei reagindo, pois acredito na imensa capacidade humana de reconstruir a ordem social. Estou convencido de que os países construídos sobre os valores da verdade e da liberdade têm demonstrado maior capacidade de superação. E o Brasil, não obstante os reiterados esforços de implosão da verdade (a mentira e o cinismo tomaram conta da vida pública) e de destruição da liberdade (a desmoralização programada das instituições democráticas e a transformação das imensas massas de excluídos em instrumentos do marketing populista), ainda conserva importantes reservas éticas. Escrevo, por isso, aos homens de bem. Eles existem. E são mais numerosos do que podem imaginar os voluptuosos detentores do poder.
Escrevo aos políticos que ainda acreditam que a razão de ser do seu mandato é um genuíno serviço à sociedade. Escrevo aos magistrados, aos membros do Ministério Público, aos policiais, aos servidores do Estado. Escrevo aos educadores, aos estudantes, às instituições representativas dos diversos setores da sociedade. Escrevo aos meus colegas da mídia, depositários da esperança de uma sociedade traída por suas autoridades. Escrevo aos pais de família. Escrevo, enfim, ao meu jovem interlocutor. Quero justificar as razões do meu otimismo. Faço-o agora. O Brasil está, de fato, passando por uma profunda crise ética. A corrupção, infelizmente, sempre existirá. Ela é a confirmação cotidiana da existência do pecado original. Mas uma coisa é a miséria do homem; outra, totalmente diferente, é a indústria da corrupção. Esta, sem dúvida, deve e pode ser combatida com os instrumentos de uma sociedade democrática.
A simples leitura dos jornais oferece um quadro assustador do cinismo que se instalou na entranha do poder. Os criminosos, confiados nos precedentes da impunidade, já não se preocupam em apagar as suas impressões digitais. Tudo é feito às escâncaras. Vejamos, ao acaso, alguns registros da crônica política (ou policial) deste crepúsculo da cidadania. Como lembrou recente editorial deste jornal, "um sujeito oculto" parece estar presente na sucessão de crimes que abalam o País.
O último capítulo da novela de desestabilização das instituições foi o ataque ao coração da democracia: o Congresso Nacional. A ação do Movimento de Libertação dos Sem-Terra (MLST) não foi uma explosão irresponsável de vandalismo. Foi uma estratégia de desmoralização da democracia representativa. E o que fez o presidente da República? Limitou-se a emitir uma nota condenatória pífia. Com a outra mão, a oculta, o presidente veste o boné dos criminosos e abre o caixa para financiar a baderna. O financiamento governamental ao MST, de cuja raiz radical nasceu o MLST, cresceu muitíssimo no governo petista. Somente o MST recebeu mais de R$ 25 milhões entre 2003 e 2005. Com o apoio do governo as invasões triplicaram ao longo do governo Lula. O líder do MSLT é Bruno Maranhão. Aos 66 anos, o petista, membro da Executiva Nacional do partido, foi um dos comandantes da invasão do Parlamento. Filho de usineiros de Pernambuco, formou-se em Engenharia, foi um dos fundadores do PT e, exilado, morou no Chile e em Paris. Como é óbvio, foi recebido no Planalto pelo companheiro e presidente.
Lula, como de costume, declarou que "quem praticou vandalismo pagará". A avaliação de Sua Excelência é falsa. O que houve foi uma programada ação contra uma instituição básica da democracia. Ademais, o comportamento do presidente é recorrente. Corrige em público, mas afaga e patrocina em privado. Assim foi com os protagonistas do maior espetáculo de corrupção da História deste país. E assim será com os seus bibelôs radicais. Todos, afinal, estão a serviço do líder carismático que, até o momento, garante a consolidação do projeto autoritário de poder. Ninguém mais duvida que Lula é o grande chefe, a mão oculta. O presidente é muito hábil. Mas não pode impedir que "se veja a olho nu a sua promiscuidade tanto com políticos corruptos quanto com os inimigos da democracia".
O que espanta, caro leitor, é a covardia de amplos setores da oposição. Como cães sem raça, ladram, mas não mordem. Transmitem a sensação de que há muito rabo preso nos bastidores da Ilha da Fantasia. Enquanto caciques discutem obviedades em refinados restaurantes de Nova York, o Brasil afunda numa crise ética sem precedentes. O governador de São Paulo, do alto de seus 70 anos, disse algumas verdades politicamente incorretas. Cláudio Lembo tinha razão. A sociedade está cansada de tanta inconsistência, de tanto jogo de faz-de-conta. Quer resultados.
Mas as eleições estão aí. É preciso votar bem. Renovar, profundamente, o Congresso Nacional. Não devemos votar em candidatos sob suspeição, em políticos indiciados, em oportunistas ou covardes. Verdade, liberdade e cidadania podem fazer do Brasil um grande país. Só depende de cada um de nós.
Carlos Alberto Di Franco, diretor do Master em Jornalismo, professor de Ética e doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra, é diretor da Di Franco - Consultoria em Estratégia de Mídia
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