Por INFORME JB
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Publicado em 18/12/2025 às 06:09
Alterado em 18/12/2025 às 08:46
O Senado aprovou nesta quarta-feira(17), em votação nominal, o projeto de Lei (PL) 2162/2023, o chamado PL da Dosimetria que prevê a redução de penas de condenados pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 e pela tentativa de golpe de Estado. A iniciativa fere o princípio da igualdade e deverá ser levada ao Supremo Tribunal Federal para dirimir tais dúvidas.
Foram 48 votos favoráveis e 25 votos contra. O texto, antes de ser judicializado, seguirá para a sanção presidencial.
Os senadores aprovaram o parecer do senador bolsonarista Esperidião Amin (PP-SC), que reduz as penas dos condenados por atos golpistas, mas não de autores de outros delitos, o que feriria o princípio da igualdade presente na Constituição, pois todos são cidadãos e criminosos iguais. Por que apenas os delinquentes que quiseram derrubar a democracia?
Entre os beneficiados está o chefe de organização criminosa Jair Bolsonaro.
Mais cedo, o projeto foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), presidida por Otto Alencar, que ainda precisa esclarecer por que nomeou um bolsonarista como relator. Fosse um bolsonarista na liderança, não nomearia um esquerdista para a função.
O que diz a Constituição
'Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.'
Esperidião Amin, que não é o careca do INSS, é favorável à anistia e defende que a redução das penas visa pacificar o país.
"Somos da posição de que a anistia para os condenados pelos eventos de 8 de janeiro deveria ser analisada à luz do princípio da unidade nacional e da função integradora do direito constitucional. A manutenção de centenas de cidadãos em regime fechado por atos que, embora ilícitos, não configuraram insurgência armada ou ameaça real à soberania, pode agravar divisões e comprometer a legitimidade das instituições", argumentou o extremista. " O perdão apresentar-se-ia como solução juridicamente possível e politicamente adequada para encerrar um ciclo de tensão e reafirmar o compromisso do Estado brasileiro com a democracia e a pacificação social", concluiu.
O relator acatou uma emenda que determina que a redução será aplicada apenas aos condenados pelos atos golpistas. O senador considerou a emenda como apenas um ajuste de redação e não de mérito, para que o projeto não tenha que retornar à Casa de origem no caso, a Câmara dos Deputados, que aprovou a matéria na noite do dia 9 de dezembro.
Um grupo de senadores se manifestou contra o projeto por não representar o anseio do país. "Foi urdida uma trama, foi planejado um golpe de Estado no Brasil e foi tudo coordenado, financiado para que o golpe se concretizasse. Felizmente, não se concretizou por vários fatores", disse o senador Marcelo Castro (MDB-PI). "Há uma semana, nós votamos aqui a Lei Antifacção, endurecendo as penas, dificultando a progressão. E, hoje, senhoras e senhores, nós estamos aqui, incoerentemente, fazendo exatamente o contrário", finalizou.
Para o senador Nelsinho Trad (PSD-MS), o projeto foi construído para beneficiar um grupo político que atentou contra o Estado Democrático de Direito. "Essa é uma proposta casuística, uma norma jurídica que está sendo criada para beneficiar um grupo, para dar privilégio para um grupo, um grupo que atentou contra a própria Constituição", afirmou. "Nós temos que dar ao Brasil um recado importante de que golpe de Estado tem que se tratar com dureza, especialmente num processo que foi totalmente baseado na legalidade, que deu direito de defesa. Um julgamento que o Brasil inteiro acompanhou, um processo em que provas que foram produzidas provas materiais e a maior parte delas, produzidas pelos próprios criminosos", reiterou.
Senadores do PL - evidentemente, todos golpistas como o chefe - defenderam a proposta. Izalci Lucas (PL-DF) disse que a proposta serve para diminuir penas de pessoas que não estavam diretamente envolvidas na trama e que receberam duras condenações. "Nós precisamos votar essa matéria para virar essa página e tirar essas pessoas: o pipoqueiro, o vendedor de bala, que foi condenado há oito anos, 14 anos", disse, se esquecendo dos capitães.
"Sou a favor da anistia, mas vamos aprovar a redução de pena para tirar os manifestantes da cadeia. Isso é o mais importante", afirmou o senador Sergio Moro (União-PR), um "delinquente da toga" na opinião do ministro Gilmar Mendes, e que tramou na Operação Lava Jato para prender o presidente Lula sem provas.
O que é o PL da Dosimetria?
O PL da Dosimetria determina que os crimes de tentativa contra o Estado Democrático de Direito e de golpe de Estado, quando praticados no mesmo contexto, implicarão no uso da pena mais grave em vez da soma de ambas as penas.
O foco do projeto é uma mudança no cálculo das penas, calibrando a pena mínima e a pena máxima de cada tipo penal, bem como a forma geral de cálculo das penas, reduzindo também o tempo para progressão do regime de prisão fechado para semiaberto ou aberto.
Tais mudanças poderão beneficiar réus como o ex-presidente Jair Bolsonaro, além dos militares Almir Garnier, ex-comandante da Marinha; Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa; Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil; e Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
Repercussão
No dia 10 de dezembro, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), enviou o PL da Dosimetria à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), tendo, como relator, o senador Esperidião Amim (PP-SC), apoiador do ex-presidente Jair Bolsonaro e portanto fiel às "ideias" do bolsonarismo: misoginia, xenofobia, racismo, entreguismo, para citar apenas algumas.
No dia seguinte, ao ser perguntado sobre o projeto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que só decidirá se vai sancionar quando o texto chegar ao Poder Executivo.
Manifestantes foram às ruas de diversas cidades no último domingo (14) contra a aprovação do PL da Dosimetria.
Especialistas consultados pela Agência Brasil avaliaram que o PL da Dosimetria poderá diminuir o tempo de progressão de pena para outros condenados por crimes comuns. (com informações de Luciano Nascimento, repórter da Agência Brasil)
Nota da Redação Deste Blog - Rui Barbosa não errou. Tampouco exagerou. Ele apenas descreveu, com lucidez histórica, o que acontece quando a impunidade vira regra e a falta de ética passa a ser método de governo. Sua frase de 1914 soa hoje menos como desabafo e mais como sentença confirmada.
"De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.".
A aprovação da chamada Lei da Dosimetria escancara esse cenário: um Congresso que legisla não para fortalecer o Estado de Direito, mas para flexibilizar a punição de poderosos, relativizar crimes graves e afrontar a Constituição sob o verniz de tecnicismo jurídico. Trata-se, na prática, de uma anistia camuflada, construída à margem da moral pública e contra a vontade do eleitor.
Quando a lei é moldada para servir aos maus, e não para contê-los, o resultado é exatamente o que Rui Barbosa denunciou: a prosperidade da desonra, o crescimento da injustiça e o agigantamento do poder nas mãos erradas. Não é surpresa que o cidadão comum passe a desacreditar das instituições — surpresa seria se ainda acreditasse.
O mais grave não é apenas a injustiça cometida, mas o recado institucional que se transmite: vale tudo para quem tem mandato, influência ou foro. A virtude vira fraqueza, a honra vira piada e a honestidade passa a ser vista como ingenuidade.
Rui Barbosa alertou. O Brasil ignorou. E, ao repetir os mesmos erros mais de um século depois, prova que o problema nunca foi a falta de avisos — foi a falta de caráter político para ouvi-los.
