quinta-feira, dezembro 25, 2025

A inflação que fecha na conta, mas não fecha no bolso do trabalhador


Charge do André Félix (Arquivo do Google)

Pedro do Coutto

O governo anuncia, com otimismo, que a inflação deve encerrar o ano em 4,4% e projeta um cenário ainda mais benigno para 2026. No papel, o número soa como alívio. Na vida real, porém, ele encontra resistência.

É difícil aceitar essa taxa como tradução fiel do que ocorreu ao longo do ano, quando os preços — sobretudo dos alimentos — subiram muito além do que a média oficial sugere. A sensação cotidiana é a de que o custo de vida avançou mais rápido do que as estatísticas conseguem captar.

DESCOMPASSO – Parte desse descompasso está na forma como a inflação é medida. No caso dos alimentos, o levantamento considera, em muitos casos, os preços mínimos praticados no mercado, e não a média efetivamente paga pelo consumidor. Essa diferença técnica, legítima do ponto de vista metodológico, produz um efeito político e social relevante: a inflação pode parecer controlada nos indicadores, enquanto continua pressionando o orçamento das famílias, especialmente das que gastam a maior parte da renda com itens básicos.

Não se trata de negar que houve algum arrefecimento em determinados momentos. De fato, o aumento não foi explosivo. Mas também está longe de ter sido irrelevante. O problema é que, quando se anuncia uma compensação ou uma desaceleração, o consumidor percebe que, no dia seguinte, os preços continuam subindo — ou, no mínimo, não recuam. A inflação sentida é cumulativa, persistente e pouco sensível às boas notícias oficiais.

DESCONFIANÇA – Esse desalinhamento entre números e percepção corrói a confiança. A política econômica pode até cumprir a meta, mas a legitimidade dessa conquista depende de algo mais simples e mais difícil ao mesmo tempo: fazer com que o cidadão comum reconheça o resultado no supermercado, na feira, no restaurante popular. Quando isso não acontece, o discurso técnico soa distante, quase abstrato.

Há ainda um elemento estrutural que não pode ser ignorado. Mesmo variações aparentemente pequenas pesam mais sobre quem tem menos. Um aumento modesto nos alimentos tem impacto desproporcional sobre as famílias de baixa renda, para as quais a comida não é um item entre outros, mas o centro do orçamento doméstico. A média estatística dilui essas desigualdades; o cotidiano, não.

DESAFIO – Projetar uma inflação menor em 2026 é desejável e necessário. Mas o desafio real não é apenas cumprir um número dentro da meta. É alinhar a política de preços, a comunicação governamental e a experiência concreta da população. Sem isso, a inflação continuará sendo, ao mesmo tempo, um sucesso técnico e um fracasso perceptivo.

No fim das contas, controlar a inflação não pode ser apenas um exercício contábil. Precisa ser, sobretudo, um compromisso com a vida real — aquela que não fecha balanço, mas precisa fechar o mês.


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