Documentário sobre o artista popular, dirigido por Patrícia Pillar, foi o grande destaque do evento apesar de não estar na disputa
Em fim de semana cheio de atrações, o destaque acabou sendo para um filme que nem concorre a prêmios - o documentário "Waldick, sempre no meu coração", dirigido pela atriz Patrícia Pillar, levou a platéia ao delírio no Cine São Luiz, sendo aplaudido várias vezes durante a projeção quando o cantor interpretava alguns dos seus sucessos, como "Eu não sou cachorro, não.
Patrícia viajou à Fortaleza para promover a exibição da obra em que estréia como cineasta - que já havia sido mostrado no Rio, no festival É Tudo Verdade, e dias antes em São Paulo - ao lado do marido, o deputado e ex-governador do Ceará Ciro Gomes.
Já o personagem Waldick Soriano, recuperando-se de uma cirurgia e que deixou o hospital na semana passada, não pôde conferir o sucesso que causou no mesmo cinema, São Luiz, em que Patrícia gravou com ele um show lançado em DVD. anteriormente. Em compensação, havia vários clones, ou covers, de Waldick pela platéia, com o indefectível terno preto, óculos escuros e chapelão de caubói.
O documentário explica como Waldick se inspirou para criar a indumentária típica. "Eu era fã daquele caubói do cinema, o Durango Kid, e quis criar um layout igual. Como não podia usar máscara, botei óculos escuros, que uso de dia ou de noite." Mais de noite que de dia, diga-se, pois boa parte da vida de Waldick foi noturna, nos shows, cabarés, bares de classe e botequins de quinta, aqueles do tipo de boêmia romântica, regada a muita birita, amores fugazes e música de dor-de-cotovelo.
"Música romântica", ele prefere chamar. E não se incomoda que o chamem de "brega". "Já me chamaram de cafona; hoje é brega. Mas, no fundo, sou apenas romântico."
É com sensibilidade feminina e muito respeito pelo personagem, que Patrícia consegue extrair camadas interessantes dessa vida. Waldick foi farrista, mulherengo (14 esposas "oficiais"), mas terminou sozinho, dizendo que não encontra ninguém que possa dizer a ele: "Estou contigo."
É um pouco assim na mais pura tradição boêmia dos boleros e dos sambas-canções. A busca do absoluto numa noite que não tem fim, cujo pique tem de ser mantido à custa de álcool e outros aditivos. E, no fim, a manhã implacável, adiada o máximo possível, mas que chega com o rigoroso princípio de realidade. E de finitude. Há boa dose de melancolia nesse filme, às vezes tão engraçado quanto triste.
Na mostra competitiva
Já o longa-metragem da mostrada competitiva da noite de sábado havia agradado em cheio o público do São Luiz. E com bons motivos. O venezuelano "Postais de Leningrado", de Mariana Rondón, é superinventivo ao tratar de tema bastante freqüente no cinema autoral latino-americano - os anos da luta armada no continente.
Usando recursos de animação, e idas e vindas no tempo, além de bom senso de humor, Mariana relembra a guerrilha em seu país através dos olhos das crianças que vêem seus pais se escondendo, usando nomes falsos e fugindo, como se tudo não passasse de uma grande brincadeira. Esses recursos não tiram o interesse nem a afetividade do filme - pelo contrário, potencializam suas boas qualidades e lhe tiram o ranço saudosista de muitas produções que abordam o período e o tema.
Os dois concorrentes da noite anterior tiveram características diferentes. Dois bons filmes também, mostrando que a qualidade dos concorrentes deste ano está elevada. "Circunstâncias especiais" é um tocante documentário que usa técnicas de Michael Moore para investigar os crimes políticos da ditadura de Pinochet em Tomé, uma pequena cidade chilena.
A diretora, a norte-americana Marianne Teleki, é esposa de uma das vítimas de prisão e tortura, Hector Salgado, que procura os militares implicados para que eles lhe dêem as razões dos seus atos. Filme com algumas cenas ótimas e aquela disposição - que se encontra em argentinos e chilenos, mas não em brasileiros - de reabrir a história e apurar responsabilidades. "Não se trata de revanchismo", diz a diretora. "Mas do direito de saber."
"Vete de mi", o representante espanhol, dirigido por Víctor García Léon, entra em outra seara, a familiar. Desta vez é um ator de meia-idade, casado com uma colega muito mais jovem, que vê sua vida ser questionada pela chegada de um filho trintão, fruto de relacionamento anterior. Um bom "drama cômico", no qual o ponto alto são os atores, em especial o que interpreta o pai, o veterano Juan Diego. Pena que o filme tenha sido prejudicado pela má projeção do Cine São Luiz, que melhorou no dia seguinte. Mas, para o concorrente espanhol, já era tarde demais.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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