Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - Faz mais de um ano que, entre evoés e alvíssaras, o governo brasileiro antecipou o pagamento de nossas dívidas com o Fundo Monetário Internacional. Centenas de milhões de dólares mudaram de coluna, nos bancos internacionais. A equipe econômica celebrou o acerto de contas como se estivéssemos chegando à maioridade. Um fato inédito, fantástico, evidência da potencialidade nacional.
Só que tem um problema: as dívidas foram pagas em função da cotação do dólar frente ao real, naqueles idos de R$ 2,80. Pois é. Esta semana, quando venceria o prazo para o pagamento de nosso débito com o FMI, o dólar vale R$ 1,70. Pergunta-se, ingenuamente: qual o nosso prejuízo e quais os responsáveis?
Deram um rombo dos diabos em nossas reservas. Deixaram escoar pelo ralo milhões que durante esse tempo poderiam ter sido aplicados em obras de infra-estrutura e programas sociais. E sem que fôssemos taxados de caloteiros. Os colegas especializados em economia que façam as contas e cheguem aos números, certamente de espantar e indignar.
Ficamos só com a indignação e o espanto. Terá sido Henrique Meirelles, presidente do Banco Central, o açodado? Antônio Palocci ou Guido Mantega? O secretário do Tesouro?
Tanto faz, mas ninguém responderá pelo rombo. Dirão que, assim como caiu, o dólar poderia ter subido e ultrapassado os R$ 2,80, situação que nos faria pagar mais do que pagamos. Se um meteoro gigante caísse sobre a Terra estaríamos muito mais endividados...
Guerra a Chávez
Repercute ainda no Senado o discurso pronunciado ao entardecer de segunda-feira pelo ex-presidente José Sarney, que saiu de tacape e borduna no lombo do presidente da Venezuela, Hugo Chávez. Esperou o momento em que o Aerolula decolou para Zurique, levando o presidente para festejar a realização da Copa de 2014 no Brasil? Teria consultado o sucessor ou falou por conta própria? Não se tira a razão de Sarney ao denunciar a corrida armamentista promovida pelo governo de Caracas, mas, convenhamos, trata-se de um contencioso capenga. Um confronto entre quantidades e personagens distintos.
O que faria Lula se um senador venezuelano discursasse criticando a promessa feita dias atrás de reequipar nossa combalida Aeronáutica? Ou, abrindo o leque, se considerasse antidemocrático o Bolsa Família ou o Programa de Aceleração do Crescimento? Hugo Chávez não regula bem, para os nossos padrões, mas criar um caso com ele por conta de suas ações políticas internas significa atrair tempestade em meio a um dia de sol. Só não expandimos nossas forças armadas porque faltam recursos. Se o vizinho nada de braçada em petrodólares, só nos resta imaginar que um dia, à custa do etanol, possamos comprar caças Sukoi e aumentar nossa frota de submarinos...
Mandato maior
É no comentário de os futuros presidentes precisarem de mandato maior, sem reeleição, que mora o perigo. O presidente Lula nega a hipótese de terceiro mandato, mas sugere cinco ou seis anos para quem vier a ocupar o Planalto, sem direito a repeteco. Vale prospectar a sugestão. Por emenda constitucional o Congresso seria chamado a revogar a reeleição, estendendo os períodos de governo em um ou dois anos.
Simples, mas qualquer interpretação de um aluno do primeiro ano de faculdade de Direito desaguaria no óbvio: mudou o sistema político-eleitoral, começa tudo de novo. Para outra fase institucional, os cidadãos no gozo de seus direitos políticos disporiam do direito de candidatar-se. Inclusive ele... É por aí que irá o processo que o presidente do TSE chama de blasfêmia, ou o ex-presidente FHC de insensatez. Aliás, quem foi o insensato que mudou as regras do jogo depois de começado?
Culpa
A pergunta que se fazia na Câmara era sobre a necessidade da instalação de uma CPI para investigar a falsificação do leite. Há quanto tempo vinha sendo praticado o crime de adulterar o produto com soda cáustica, água oxigenada e outros elementos ainda não detectados? Desde quando nossas crianças vêm sendo submetidas a esse envenenamento? Quais os responsáveis maiores, das cooperativas às megaempresas e aos comerciantes? Provavelmente a CPI do leite daria em nada, se fosse criada. A culpa recairia sobre a vaca. Quem manda ela não dar leite como dão as vacas holandesas?
Fonte: Tribuna da Imprensa
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