Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - Como regra, quando é para aprovar algum projeto, a temperatura sobe nos plenários do Congresso. Conflitos e confrontos costumam seguir-se a debates e discussões. Tudo bem, é da rotina parlamentar e democrática. O que não dá para entender, ou entendemos muito bem, é quando se trata de adiar qualquer projeto, especialmente os importantes: nessa hora, governo e oposição se unem. Falam em uníssono. Desaparecem as seqüelas e querelas. Deixa-se para amanhã o que não se quer fazer hoje.
Quinta-feira reuniram-se os líderes de todos os partidos com o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia. Em poucos minutos decidiram adiar para abril do ano que vem a votação da reforma tributária. Com isso, suspende-se a análise de uma das mais prementes necessidades nacionais, a ordenação tributária e a correção de injustiças flagrantes que pesam sobre o cidadão comum e, em muitos casos, sobre a economia dos estados.
Getúlio Vargas tinha uma estratégia para problemas considerados insolúveis: mandava fazer um resumo e guardava o papel numa gaveta. Dizia que tudo se resolveria sozinho. Na maior parte das vezes, tinha razão.
Quanto à reforma tributária, de jeito nenhum. Porque não dá mais para levar adiante a punição de pessoas e empresas submetidas ao mais cruel dos regimes fiscais em todo o planeta. Um assalariado médio trabalha seis meses por ano para pagar impostos.
Um trabalhador de salário mínimo não chega à segunda quinzena de cada mês com dinheiro no bolso para comer, dada a taxação indireta que recai sobre os produtos de primeira necessidade de que precisa. Um pequeno empresário vai à falência por não poder enfrentar a cascata de impostos, taxas e contribuições que o agridem.
Diminuir as agruras da população seria o objetivo fundamental da reforma tributária, acima e além, até mesmo de saber se o ICMS incide sobre o estado produtor ou o estado consumidor. Pois em meio a uma situação aguda como essa, Suas Excelências protelam para abril soluções que deveriam ter sido resolvidas ontem.
O Planalto como palco
Estabelece a lei que seis meses antes de qualquer eleição fica tudo proibido. Quem é candidato e ocupa uma função pública arrisca-se a ser cassado pelo simples fato de manter seus planos e programas assistenciais, como acaba de acontecer com o já ex-governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima. Não aconteceu com o Lula, também disputando um segundo mandato, mas essa é outra história.
Por hoje, basta registrar a incongruência da legislação eleitoral. Até um dia antes do início do prazo para que tudo se proíba, vale tudo. Um candidato que seja presidente da República, governador, prefeito ou até chefe da Casa Civil pode fazer o que quiser em termos de utilização de recursos públicos em sua campanha. A partir da meia-noite de um dia qualquer, não pode mais. Só que aquilo que já fez garantiu-lhe monumental handicap sobre os adversários.
Pois é. Dona Dilma Rousseff é candidata à presidência da República, formalmente anunciada pelo presidente Lula. Esta semana presidiu monumental reunião de líderes dos movimentos sociais, no Palácio do Planalto. Por quatro horas, ela e outros ministros discursaram, entre aplausos gerais.
Seguidas vezes foi saudada como candidata, herdeira do companheiro-mor. Microfones, cadeiras, cafezinhos e sucedâneos pertenciam ao erário e foram utilizados política e eleitoralmente em benefício dela. Até mesmo sua humilde concordância com a condição foi ouvida pelos presentes.
Até o primeiro dia de abril de 2010, pode. E pelo jeito deverá repetir-se incontáveis vezes. Sem falar nas viagens pelos estados, acompanhando o presidente e sendo saudada pela militância, nos palanques, como a princesa de olho no trono.
Disporia o João da Silva, se disputasse a chefia do governo, dessas mesmas facilidades? É claro que fica difícil a identificação precisa de quem é candidato, ou candidato a candidato, porque muitas vezes os sonhos se esvaem bem antes de chegarem os seis meses de interdito. Mas que há injustiça flagrante nesse sistema, isso há.
Exibicionismo ou jornalismo?
Na televisão, até mais do que na imprensa escrita, não deve o jornalista trazer para o público suas inclinações, assim como não pode transformar-se em ator ou atriz, superpondo caras, bocas e trejeitos ao conteúdo das informações que transmite. O problema é que por exibicionismo ou concorrência desmedida entre as redes os telejornais transformam-se cada vez mais em shows dos antigos teatros de revista.
Existe, é claro, injunção política. Agride-se a ética quando, durante uma entrevista, o entrevistador persegue o entrevistado, buscando impor seus pontos de vista, ou, pior ainda, os postulados e os interesses do grupo a que serve. Mas tem mais. Em vez de reportar e informar na certeza de que o conteúdo é mais importante do que a forma da transmissão, multiplicam-se nossos coleguinhas nessa prática deletéria de imaginar-se no palco ou no picadeiro.
Não é hora, nem lugar, para citar exemplos fulanizados, mas basta qualquer um ligar as telinhas para perceber que logo os jornalistas estarão substituindo os astros das novelas, com trejeitos e caretas que nada têm a ver com as notícias divulgadas. Quem se interessar por essa distorção deve ler o livro de memórias de Walter Kronkite, o maior dos âncoras dos Estados Unidos, já aposentado, até hoje reconhecido como o jornalista de maior credibilidade da televisão americana. Por quê? Porque divulgava informações e até fazia comentários sem parecer que estava no Sambódromo...
Fonte: Tribuna da Imprensa
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