OURO PRETO (MG) - As populações de 455 municípios brasileiros não têm acesso a nenhum médico local. A carência de profissionais é maior nas regiões Norte, Sul e Sudeste, onde 25,7%, 25,5% e 24,4% dos municípios não têm nenhum médico em seus serviços de saúde.
Os dados são de um levantamento da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), apresentado ontem em Ouro Preto, no encontro dos diretores da Global Health Workforce Alliance (GHWA), órgão ligado à Organização Mundial da Saúde (OMS), com representantes do Ministério da Saúde. Segundo o organismo internacional, faltam 4 milhões de profissionais de saúde no mundo, com 57 países em situação considerada crítica.
O Brasil não é um deles. No entanto, com uma relação de 1,15 médico para cada mil habitantes, o País está à beira do limite aceitado pela OMS. A recomendação é de no mínimo um médico por mil habitantes. Entre as especialidades com maior carência de profissionais no País estão a anestesiologia, a pediatria, a psiquiatria e a medicina intensiva.
Os dados refletem a dificuldade dos municípios mais distantes dos grandes centros em atrair e fixar médicos. "A questão salarial parece não ser a mais importante. O maior problema é a distância e o isolamento", diz Edison José Corrêa, coordenador do curso de especialização à distância em Saúde da Família da UFMG.
Levantamento anterior da OMS apontava mil cidades brasileiras sem médicos. Algumas delas, no entanto, recebem a visita de profissionais pelo menos uma vez por mês. A pesquisa da UFMG, que foi encomendada pelo Ministério da Saúde, é considerada mais fiel à realidade, pois contabiliza apenas as cidades sem nenhum médico durante os 365 dias do ano.
"Há alguns anos, os especialistas acreditavam que faltaria emprego para os profissionais de saúde no mundo. Hoje, com o avanço das tecnologias e o envelhecimento da população, sabemos que isso não é verdade", diz o secretário de Gestão do Trabalho e Educação na Saúde do ministério, Francisco Campos.
A pesquisa também revela as principais carências de especialistas por região. Foram consultados 420 hospitais em todas as regiões para traçar as dificuldades. No Nordeste, 42% dos hospitais disseram ter grande dificuldade para contratar anestesiologistas e pediatras. No Sul, 25% dos hospitais têm a mesma dificuldade. Já no Sudeste a principal carência é de pediatras, em 32% dos serviços de saúde.
Saúde básica
O atendimento básico também é afetada pela falta de médicos. O Programa Saúde da Família (PSF) é um exemplo. Mesmo com a oferta de salários que podem chegar a mais de R$ 16 mil, muitas cidades não conseguem atrair profissionais. Após 15 anos da implantação do programa, 35% dos municípios brasileiros continuam sem atendimento.
"O PSF não tem conseguido fixar o profissional de forma adequada. Isso acontece não só nas cidades mais distantes como também nas periferias das grandes cidades", diz Campos. Para o secretário estadual de Saúde da Bahia, Jorge Solla, os estados precisam encarar o fato de existir uma carência de médicos no Brasil.
Mesmo com 176 faculdades de Medicina no País - número menor apenas do que o da Índia -, a distribuição dos profissionais é inadequada. Na Bahia, cerca de 400 médicos são formados por ano, número considerado baixo por Solla. A cobertura do PSF em Salvador também é uma das menores do País.
Apenas cerca de 12% da população são atendidas pelas equipes do programa. No estado, essa cobertura sobe para 50%. A capital com melhor cobertura é Belo Horizonte: 76%. "Aqui a situação só não é pior porque, muitas vezes, os médicos atendem em mais de uma cidade", diz Solla. Para diminuir o déficit, a secretaria estadual da Bahia pretende abrir concurso para profissionais de saúde e criar uma fundação estatal para contratar e realocar os médicos pelo estado.
Segundo o presidente do Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde (Conasems), Helvécio Miranda, o problema também pode ser medido nas grandes cidades, pois poucos médicos querem trabalhar em zonas periféricas afetadas pela violência e com pouca estrutura.
Ele critica o índice de um médico por mil habitantes como o padrão aceitável da OMS. "Esse padrão é ultrapassado, valia para a década de 70, quando o perfil das doenças era predominantemente agudo. Hoje, com a mudança do perfil para males crônicos, é um nível baixo."
Fonte: Tribuna da Imprensa
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