BRASÍLIA - A manobra do deputado Ronaldo Cunha Lima (PSDB-PB), que renunciou quarta-feira ao mandato para escapar de um julgamento por tentativa de homicídio no Supremo Tribunal Federal (STF), reabriu a discussão no Congresso sobre o foro privilegiado. O presidente do Conselho de Ética da Câmara, Ricardo Izar (PTB-SP), afirmou que o órgão começou a elaborar uma proposta de mudanças para acabar com o foro especial ou que, pelo menos, imponha limites que façam com que o mecanismo deixe de ser usado como instrumento de impunidade.
"Não tem mais oposição nem governo nessa discussão", disse Izar. "Cada dia chega um fato novo que denigre a imagem da instituição. Precisamos acabar com isso ou impor limites". Segundo ele, uma das propostas seria a de que o foro privilegiado valesse apenas para os casos que tivessem relação com a atuação pública do envolvido.
"Esse caso do Cunha Lima é um exemplo, ele deveria já ter sido julgado pelo júri da Paraíba. Izar disse que o Conselho fez uma reunião quarta-feira sobre o assunto e decidiu que cada integrante apresentará propostas de mudanças. Um texto será consolidado por ele e pelo deputado Nelson Trad (PMDB-MS).
"Faremos um texto único para ser entregue pronto ao presidente da Casa". A discussão mais uma vez voltou à pauta não só pela renúncia do deputado tucano, mas porque o foro virou sinônimo de impunidade. Cunha Lima, então governador da Paraíba, foi denunciado criminalmente por ter atirado em dezembro de 1993 três vezes contra o ex-governador Tarcísio Burity, em um restaurante em João Pessoa.
Os tiros acertaram Burity, mas ele sobreviveu - só veio a morrer dez anos depois, vítima de um enfarte. O caso seria julgado pelo STF na próxima semana, mas com a renúncia o processo volta para a Justiça de primeira instância na Paraíba - o que arrastará o julgamento por mais pelo menos 10 anos.
Ontem, Cunha Lima foi internado num hospital em João Pessoa. Segundo a família, ele teve tremores, mal estar e febre alta. Na sua vaga na Câmara, assumiu ontem o suplente Walter Brito Neto (PRB-PB). O líder do PSDB da Câmara, Antonio Carlos Pannunzio (SP), não quer comentar o caso Cunha Lima, para evitar constrangimentos dentro da legenda, mas também é defensor de mudanças para que o direito ao foro deixe de ser tratado como sinônimo de impunidade.
"É ruim para a instituição e é péssimo para quem não é culpado. Porque como todo processo demora para ser julgado, até quem não tem culpa acaba virando culpado". Pannunzio, que diz não ser contra o foro especial, é a favor de que os processos tenham tramitação diferenciada no Supremo Tribunal.
Projeto de sua autoria, que está na Câmara desde junho, estabelece que os processos por foro tenham tramitação preferencial, passando à frente dos demais casos. "O foro não pode ser confundido por causa da demora na tramitação dos processos com impunidade".
Seu projeto teve urgência aprovada em agosto, mas até agora não foi colocado na pauta de votações. O professor de direito constitucional da PUC de São Paulo Pedro Estevam Serrano é defensor de limites para foro especial. Segundo ele, a garantia que visa a dar segurança ao mandato do parlamentar não pode ser usada indiscriminadamente.
"O foro deve ser mantido para alguns casos, mas não pode ser irrestrito". O especialista ainda criticou o uso do foro como forma de obter a prescrição de crimes. Segundo Serrano, o exemplo dado por Cunha Lima foi de uma política aristocrata e anti-republicana. "O foro foi feito para proteger o mandato parlamentar", afirmou.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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