Dora Kramer
Folha
Encontros como o que reuniu representantes dos três Poderes para tratar do uso abusivo de emendas parlamentares atendem aos ditames da civilidade e, por isso, parecem adequados. Convém, no entanto, observar o evento com olhar mais detido antes de aceitar – e, sobretudo de celebrar – a versão oficial de que o problema está objetivamente bem encaminhado.
Para início de conversa, há que se observar o desacerto institucional no fato de o Supremo Tribunal Federal atuar como mediador quando seu papel é o de julgador constitucional. Ao se sentar naquela mesa, o STF flexibilizou o que decidira por unanimidade.
TUDO É RELATIVO – Mas, vá lá, estamos no Brasil, onde a relativização de conceitos é vista como qualidade. Por aqui não pareceu estranho que os ministros assumissem o lugar de “poder moderador”, enquanto lhes cabia apenas aguardar o cumprimento da exigência de transparência posta na Constituição.
A fim de envernizar a coisa, saíram todos ressaltando a concordância em suspender a obscuridade das chamadas emendas Pix, que seguem impositivas, assim como permanece intocado o volume de recursos sob manejo do Congresso Nacional.
Não se recuou em relação ao poder crescentemente adquirido de 2015 para cá. Pareceu mais uma carta de intenções —daquelas que o Brasil assinava antigamente com o FMI para não cumprir— do que propriamente um compromisso sólido.
CONTORNAR VETO – Já vimos o Parlamento contornar o veto do Supremo ao orçamento secreto e não está fora de cogitação que vejamos de novo manobras semelhantes.
Ficou acertado que os procedimentos relativos às emendas de bancada e de comissões serão negociados entre o Legislativo e o Executivo. Ou seja, entre congressistas fortalecidos, e nada dispostos a abrir mão dessa força, e um governo enfraquecido e que nesses assuntos não conta sequer com o apoio de aliados.
Portanto, não há chance de melhorar enquanto persistir a dinâmica disfuncional do sistema.