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segunda-feira, fevereiro 28, 2022

Brasileiros na Ucrânia: ‘Se virem’ - Editorial




Sem plano de saída, a embaixada brasileira em Kiev orienta que cada um se vire por conta própria

Eis o bolsonarismo em sua essência: Jair Bolsonaro não governa – descumpre as obrigações do cargo –, mas alardeia, nas redes sociais, informação falsa. No dia em que a Rússia iniciou seus ataques contra a Ucrânia, o presidente Bolsonaro disse, no Twitter, estar “totalmente empenhado no esforço de proteger e auxiliar os brasileiros que estão na Ucrânia”. Ainda assegurou que a embaixada em Kiev estava aberta e pronta para auxiliar “os cerca de 500 cidadãos brasileiros que vivem na Ucrânia e todos os demais que estejam por lá temporariamente”.

No entanto, a afirmação de Bolsonaro era falsa. Quem entrou em contato, na quinta-feira, com a embaixada do Brasil em Kiev recebeu informações bem diferentes. Era desaconselhado a ir até a representação diplomática e informado de que não havia como assegurar uma saída do país em segurança, o que foi confirmado pelo Itamaraty, em Brasília. Ou seja, não havia nenhum plano para proteger ou retirar os brasileiros da Ucrânia.

Conforme relatou o Estado, dois brasileiros que pediram auxílio para sair da Ucrânia receberam de um diplomata esta orientação: “Se virem”. Além de inusitada, a mensagem é rigorosamente desesperadora. O órgão do Estado brasileiro que deveria prover proteção a seus cidadãos reconhece seu despreparo diante da situação que, longe de ser uma surpresa, era há algum tempo uma possibilidade não desprezível. Basta ver que outros países já vinham retirando seus nacionais da Ucrânia, entre outras medidas.

A orientação “se vire” não é muito diplomática, mas contém, eis a dura realidade, uma profunda verdade. Diante do padrão de comportamento bolsonarista, trata-se de um conselho realista. Se depender de Jair Bolsonaro, não haverá Estado planejando e cuidando das pessoas. Se depender do bolsonarismo, cada um estará sozinho e desprotegido, abandonado às suas próprias forças. Foi assim com as enchentes na Bahia em janeiro. Foi – e continua sendo – assim durante a pandemia.

Não é apenas irresponsabilidade, o que já seria grave. O bolsonarismo debocha do País e dos brasileiros. Há evidentemente despreparo e ignorância, mas é também descaso, indiferença. Nada é levado a sério. Em sua visita a Moscou, Jair Bolsonaro chegou a dizer que, “coincidência ou não, parte das tropas (russas) deixaram a fronteira”, após o seu encontro com Vladimir Putin. A situação era de tensão, com risco de guerra, mas o presidente Bolsonaro preferiu fazer graça, difundindo informação falsa. E nada fez para proteger os brasileiros na Ucrânia.

A Presidência da República tem responsabilidades. Omissões do chefe do Executivo federal podem causar problemas graves, muitas vezes colocando brasileiros em risco de morte. Jair Bolsonaro segue, no entanto, alheio a tudo isso, achando-se autorizado a leviandades. Na visita a Moscou, disse que “Putin é uma pessoa que busca a paz”. Descaso com a verdade, descaso com as pessoas.

Que, apesar de Bolsonaro, o Estado brasileiro possa, com urgência, oferecer proteção e um plano de saída aos brasileiros na Ucrânia. 

O Estado de São Paulo

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