Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - O presidente Lula discursa hoje em Nova York, na abertura da Assembléia Geral das Nações Unidas, devendo mais uma vez apelar para a importância da substituição do petróleo pela energia alternativa tirada da biomassa. Mas não deixará de se referir à vantagem que o Brasil passou a dispor com a descoberta das imensas reservas de petróleo no pré-sal.
Suas palavras terão duplo objetivo: o primeiro, de demonstrar que mesmo montados em jazidas iguais às do Oriente Médio, ainda optamos, damos o exemplo e estamos prontos a transferir tecnologia para a adoção, pelos diversos países do planeta, de energia renovável e não poluente.
O outro, uma espécie de aviso capaz de ser resumido no mote popular do "não vem que não tem". Traduzindo: o presidente vai alertar que é nosso o petróleo descoberto em mar profundo, ao longo do litoral brasileiro. Tentará, ao menos retoricamente, desestimular quantas multinacionais e quantos governos se encontrem de olho grande nessa riqueza que, se não caiu do céu, emerge das profundezas em favor do desenvolvimento do Brasil. Porque já se ouve por aí, nos conciliábulos da indústria petrolífera internacional, que será de quem chegar primeiro o petróleo situado em mar alto, ainda que em nossas águas territoriais.
A pergunta que se faz é se terá o presidente Lula sucesso nas duas propostas. Porque a resistência ao etanol continua forte, por obra e graça da indústria petrolífera. Será incentivada nos próximos meses a campanha ironicamente vista com simpatia até pela Petrobras, de que plantar cana significa aumentar a fome no mundo, pelo aproveitamento de terras antes destinadas a produzir alimentos.
Quanto a sustentarmos nosso direito às reservas descobertas no pré-sal mais ou menos próximo do litoral brasileiro, quem garante que não se instalarão na área plataformas submarinas estrangeiras, "no peito e na raça", sem fazer conta de tratado e acordos anteriores? Afinal, não foi por coincidência que os Estados Unidos reativaram a Quarta Frota de sua Marinha de Guerra, destinada a patrulhar o Atlântico Sul. De qualquer forma, nossa palavra estará sendo apresentada hoje, em nome de nossos interesses.
Um enigma dentro de um mistério
A menos de duas semanas das eleições municipais ninguém duvida mais de que boa parte da sorte de 2010 repousa nas urnas de 5 de outubro de 2008. Apesar da imensa popularidade do presidente Lula, caso ele não se candidate a um terceiro mandato, conseguirá transferir votos para Dilma Rousseff? Disporá o PT de condições para impulsionar a candidata, se não eleger um razoável número de prefeitos das capitais e das grandes cidades?
Tome-se São Paulo, onde o Lula já percebeu haver-se transformado na pedra de toque das eleições presidenciais e, por isso, desdobra-se para alavancar os companheiros. Na capital, os ventos sopram favoráveis a Marta Suplicy, ainda que sua vitória vá depender do segundo turno. Mas nas nove cidades da Grande São Paulo, por enquanto o PT lidera as pesquisas em cinco. Parece pouco, quando se compara essa vantagem com os números das demais cidades paulistas com mis de 200 mil habitantes.
O PSDB deve vencer em 195. O PMDB, em 89. O DEM em 74 e o PTB em 65. O PT surge em quinto lugar, com 57 preferências. Daí a importância para o presidente Lula de eleger Marta, batendo o adversário José Serra em seu reduto principal, mas obrigado a aumentar o número de vitórias em outras cidades grandes. Dessa forma Dilma poderia decolar, ainda que vá permanecer até 2010 outro enigma dentro de outro mistério: um presidente da República, mesmo popular, transfere seus próprios votos?
Incongruências da lei
A partir de uma entrevista de Ciro Gomes, em Fortaleza, somos alertados para mais uma incongruência da lei eleitoral: parentes consangüíneos dos governadores não podem ser candidatos ao Senado ou à Câmara. Só os que já exerciam o mandato antes da eleição dos governadores e se candidatam à reeleição. Tudo bem, trata-se de um cuidado para evitar influências mal-sãs no processo de seleção dos representantes do povo.
Só que tem um problema: os parentes não podem, mas os governadores podem. Não se trata deles disputarem um segundo mandato na mesma função, mas da facilidade de se tornarem senadores ou deputados. O uso da máquina pública torna-se mil vezes mais flagrante.
Ciro Gomes, assim, por conta de ser irmão do governador Cid Gomes, está proibido de disputar o Senado em 2010. Poderia concorrer à Câmara, pois já é deputado. Mas ao Senado, não.
Já Cid Gomes, se quiser, pode facilmente tornar-se senador. Certamente optará pelo segundo mandato de governador, mas em 2014 não hesitará. Como todos os governadores em 2010, se estiverem terminando o segundo mandato, ou quatro anos depois, se forem reeleitos...
Como Ciro Gomes faz restrições à sua própria condição de deputado, estreita-se o gargalo: só poderá, mesmo, disputar a presidência ou a vice-presidência da República.
Senadora contramão
Ataca novamente a senadora Marina Silva, na contra-mão do governo Lula. Acaba de pronunciar-se contra a construção não só das 50 usinas nucleares prometidas pelo ministro Edison Lobão, mas até da polêmica Angra III, cuja implantação avança a passos de tartaruga.
A ex-ministra do Meio Ambiente lembra haver sido derrotada nos tempos em que integrava a equipe do presidente Lula. Prefere a produção de energia eólica ou retirada da biomassa, já que, em suas palavras, as usinas nucleares são caras e terrivelmente inseguras. O problema é que essa opinião baseia-se em manifestações anteriores das ONGs que assolam a soberania nacional, as mesmas que pretendem transformar a Amazônia num imenso jardim botânico, intocável agora para, no futuro, internacionalizada, servir a multinacionais e a governos de nações poderosas.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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