Nepotismo tem dias contados na Bahia
A Assembléia Legislativa deverá votar até a próxima quarta-feira projeto de lei que extingue o nepotismo na Bahia - nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e no Ministério Público. Assim, ficará proibida aos gestores a contratação ou nomeação de parentes no serviço público até o 3º grau, o que inclui pai, mãe, filhos, irmãos, sogros, genros, cunhados, tios e sobrinhos. O projeto é uma iniciativa do deputado governista Euclides Fernandes (PDT), mas, por causa dos labirintos e malabarismos da política, envolvendo interesses e vaidades, será assinado pelos 63 deputados. É que havia outro projeto, de autoria do deputado neogovernista Reinaldo Braga (PSL), instituindo o fim do nepotismo somente no Legislativo estadual e limitado ao 2º grau, isto é, liberando tios e sobrinhos da restrição. Apresentados este ano, os dois projetos vêm motivando muita celeuma e acusações. O de Braga, por exemplo, é fruto de um acordo com o Ministério Público que chegou a ser criticado da tribuna porque estaria interferindo na liberdade de legislar da Casa, e dele também se diz que envolve interesse direto do autor, que tem uma sobrinha em cargo comissionado na AL. O projeto de Euclides, por sua vez, ao enfeixar todos os Poderes, teria desagradado ao Judiciário sob o argumento de que este Poder já dispõe de regulamentação para o nepotismo em forma de resolução do Conselho Nacional de Justiça, referendada pelo Supremo Tribunal Federal. Contudo, informações de bastidores dão conta de que essa jurisprudência não é respeitada e o TJ baiano tem pelo menos um desembargador com sobrinhos nomeados. O relator dos projetos na Comissão de Constituição e Justiça, o oposicionista João Carlos Bacelar (DEM), reuniu-os num só e deu parecer pela aprovação e conseqüente envio ao plenário. Mas na sessão da CCJ da última quarta-feira, alegando a ida dos sem-terra à Assembléia e um suposto acordo para somente abrir e fechar a sessão, seu presidente, Zé Neto (PT), não aceitou fazer ao menos a leitura do parecer, que não estava na pauta da comissão. Na sessão, só estavam quatro dos parlamentares da CCJ, mas havia o quórum de cinco para continuidade dos trabalhos, pois o deputado Álvaro Gomes (PCdoB), embora ausente, tinha assinado a lista de presença na abertura. Eram dois deputados do governo e dois da oposição, mas um dos governistas era justamente Euclides Fernandes, o autor do projeto, e assim o governo seria derrotado por 3 a 1 em qualquer tentativa de barrar o andamento. Por isso, o presidente Zé Neto não acolheu questão de ordem do líder da oposição, Gildásio Penedo (DEM), que pedia a leitura do parecer, fase inicial da tramitação. Gildásio insistiu e quis que a negativa de Neto fosse submetida ao plenário. O petista, aproveitando pedido de quórum que tinha sido feito pelo próprio líder, encerrou a sessão, pois não havia número legal. As notas taquigráficas atestam, porém, que em nenhum momento Zé Neto se disse “autoritário” ao tomar a decisão, como acusaram fartamente alguns oposicionistas. Tudo isso foi pela manhã. Na sessão plenária da tarde, presentes mais de 50 deputados, a briga seguiu nos pronunciamentos e apartes. O fato é que poderia ter sido evitada se houvesse um autêntico interesse dos governistas de aprovar o projeto de Euclides Fernandes, que universaliza o fim do nepotismo. Ao contrário, foi o projeto mais limitado, de Reinaldo Braga, que ganhou o carimbo de “urgência”, ou seja, dispensa de todas as formalidades regimentais para que possa andar depressa e ser aprovado da noite para o dia. A oposição, nos seus tempos de longo governo, nunca pretendeu ou teve autonomia para acabar o empreguismo de parentes, mas, fora do poder, empenha-se para isso, terminando por ser útil à sociedade. E não sejam esquecidos muitos parlamentares da base do governo que, por sinceridade ou estratégia, querem banir o nepotismo. Isso levou a uma resistência ao projeto de Braga, que na semana anterior havia sido adotado em reunião com o MP no gabinete do presidente Nilo, presentes 51 deputados. Contribuiu especialmente a informação de bastidores de que o Poder Judiciário “não admitia” ser incluído no pacote por já ter se auto-regulado no assunto com base na decisão do Supremo. O impasse se instalou no plenário e, num esforço para não deixar dúvida quanto à posição do governo, ao mesmo tempo sinalizando por uma lei menos camarada, o líder da maioria, Waldenor Pereira (PT), afirmou que o governador Jaques Wagner lhe dera “autorização” para incluir no projeto a extensão ao Poder Executivo das medidas moralizadoras que fossem criadas para o Legislativo até que grau fossem. O clima não era mais de saia-justa, senão de algo mais apertado, como uma camisa-de-força, sem alusão, é claro, à finalidade desse repulsivo instrumento de “terapêutica”. Deputados mais experientes, líderes partidários e de blocos e o presidente Marcelo Nilo saíram da sessão para entender-se em regime de emergência, pelo menos esfriando os ânimos diante da TV Assembléia. (Por Luis Augusto Gomes)
Projeto teria pelo menos 40 votos
O líder da maioria, Waldenor Pereira, admite que “existem divergências” na bancada governista, embora a do PT, com dez parlamentares, esteja unida pelo fim radical do nepotismo. O problema é com outros partidos, em que há deputados que só querem a proibição até o 2º grau. Quanto ao Judiciário, “peculiaridades” da decisão do Supremo, que ele não soube citar, não aplicáveis aos demais Poderes, estariam impondo a sua não-inclusão na lei para evitar posteriores argüições de inconstitucionalidade. Waldenor imaginava que seriam necessários mais “uns 15 dias” de conversa para a obtenção de um consenso que evitasse disputa na votação da matéria, mas, em Vitória da Conquista, onde se encontra, informado dos avanços no processo, disse que “seria ótimo” se toda a situação fosse resolvida até quarta-feira, sendo ele, pessoalmente, a favor da limitação até o 3º grau. Outro fator importante nessa articulação é o PMDB, segunda maior bancada da maioria governista, com sete deputados. O líder Leur Lomanto Junior ressalvou que, como o assunto ainda não entrou oficialmente na pauta, a bancada não se reuniu para tomar uma decisão, o que acontecerá de hoje para amanhã, se se confirmar a votação do projeto. Entretanto, o sentimento é de que a maioria dos correligionários tem uma posição semelhante à sua, que é clara: ele quer um projeto abrangente, “porque não tem sentido fazer uma lei para apenas um Poder”, e defende a proibição do nepotismo até o 3º grau. “Nada impede que o projeto seja votado logo”, disse Leur. Uma conta simples mostra que o projeto teria no mínimo 40 votos favoráveis, o que pode levar os recalcitrantes a também apoiá-lo para não passarem à história como defensores do empreguismo de parentes. Na administração dos conflitos, o presidente Marcelo Nilo admite que “houve divergências”, já superadas, e hoje “a idéia é abolir o nepotismo no Executivo, Legislativo, Judiciário e Ministério Público”. Ressalvando que “o plenário da Assembléia vai decidir em sua soberania”, ele acha que, incorporados, os dois projetos poderão conquistar a assinatura de todos os deputados. E resumiu: “Pelo bom senso e pelo que tenho ouvido, tudo indica que a matéria chega ao plenário terça ou quarta-feira”. Nilo disse que pedirá urgência, para garantir a dispensa de formalidades regimentais e haver chance de imediata aprovação. (Por Luis Augusto Gomes)
Fonte: Tribuna da Bahia
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