Por: ANDREZA MATAISFELIPE RECONDOda Folha Online, em Brasília
O depoimento secreto dos delegados da Polícia Civil de São Paulo Godofredo Bittencourt e Rui Ferraz Fontes, do Deic (Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado), foi vendido a dois advogados do PCC (Primeiro Comando da Capital) por um funcionário terceirizado da Câmara, informou nesta quarta-feira a CPI do Tráfico de Armas.De acordo com a CPI, Arthur Vinicius Silva, contratado para trabalhar no registro do áudio da reunião, vendeu por R$ 200 dois CDs com a gravação integral dos depoimentos dos delegados aos advogados Maria Cristina de Souza Rachado e Sérgio Wesley da Cunha. O funcionário terceirizado presta depoimento à CPI ainda nesta quarta.Por meio dos advogados, os CDs teriam chegado ao líder do PCC, Marcos Willians Herba Camacho, o Marcola, e detonado a série de 251 ataques a forças de segurança e de 80 rebeliões de presos que atingiu diversos pontos do Estado de São Paulo.Na audiência, os delegados informaram que transfeririam e isolariam um grupo de presos considerados de alta periculosidade --incluindo líderes da facção-- e que tinham conhecimento do plano dos criminosos de promover uma megarrebelião no domingo passado, Dia das Mães.O depoimento dos delegados foi reservado a parlamentares justamente porque Bittencourt e Fontes identificaram os dois advogados do PCC na platéia da audiência aberta, marcada para quarta-feira passada (10).SeqüênciaConforme informado, na quinta-feira (11), 765 presos foram levados para a penitenciária de Presidente Venceslau (620 km a oeste de São Paulo). Na sexta (12), oito líderes do PCC foram levados à sede do Deic, em Santana (zona norte de São Paulo). Naquele dia, começaram os ataques.No sábado (13), Marcola foi levado para a penitenciária de Presidente Bernardes (589 km a oeste de São Paulo) e colocado no RDD (Regime Disciplinar Diferenciado). No domingo (14), auge dos ataques e rebeliões, Marcola recebeu a visita de outra advogada e de representantes do governo estadual, contrariando as regras do RDD.Há suspeita de acordo. O governo nega ter negociado com o PCC o fim dos ataques, mas admite que o encontro serviu para que a advogada garantisse a integridade física de Marcola e dos outros líderes isolados aos criminosos. Os presos conquistaram ainda outras reivindicações: a instalação de televisores e a mudança da cor dos uniformes.Desde a última sexta-feira (12), chegou a 146 o número de pessoas morreram em decorrência da onda de violência em São Paulo. Destas, 93 eram suspeitas de envolvimento nos crimes e 40 eram agentes de segurança --sendo 23 policiais militares, seis policiais civis, três guardas municipais e oito agentes de segurança penitenciária.R$ 200Em depoimento à CPI, o funcionário responsável por gravar o áudio do depoimento dos delegados confirmou ter entregue os dois CDs que continham o registro aos advogados. Ele está afastado desde quinta (11), mas por outro motivo, segundo a Câmara."Não tive conhecimento do que tratava o CD. Me ofereceram grana. A idéia do dinheiro me tentou. Infelizmente, não ganho bem. Fui corrompido", disse o funcionário. Se for indiciado por quebra de sigilo e corrupção passiva, ele poderá sair preso da audiência na CPI.Os CDs foram entregues aos advogados do crime organizado em um shopping de Brasília (DF), ainda segundo o funcionário.Há suspeitas de que os CDs com os depoimentos tenham sido apresentados a integrantes da cúpula do PCC por meio de uma audioconferência. A CPI pediu proteção a Silva e aos integrantes da comissão, pois o CD contêm as vozes dos parlamentares que criticaram a facção.Ironia de MarcolaNa quinta-feira, a Polícia Civil suspeitou que o PCC tinha conhecimento do depoimento de Bittencourt e Ferraz para a CPI. Na sexta, a polícia avisou a Câmara, que por sua vez acionou a Polícia Federal e a Polícia da Câmara, que no mesmo dia identificaram Silva.
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