Roberto Nascimento
Li no Globo e no Estadão que os parlamentares bolsonaristas, reunidos em um comensal jantar do PL – um partido que tem dono, o ex-presidiário Valdemar da Costa Neto, de Mogi das Cruzes/SP – choraram suas pitangas estragadas, atacando sem dó nem piedade o presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL), por ter aceitado apoio do futuro presidente Lula. Os adjetivos foram pesados e o mais leve foi a pecha de “traidor”.
Então, lembrei uma conversa que tive com o caudilho Leonel Brizola, no aeroporto do Galeão, quando perguntei sobre os políticos que abandonaram o PDT. Disse o governador:
”A política ama a traição, mas abomina o traidor”.
MARCA TRADICIONAL – Desde o Império, a traição virou uma marca tradicional do Brasil. Dom Pedro II traiu o Barão de Mauá e foi traído pelo Marechal Deodoro, que levou uma rasteira do Marechal Floriano.
Vargas traiu Prestes e foi traído pelo general Gaspar Dutra. No segundo governo, Vargas foi traído por todo mundo, e a pressão militar, instigada por Carlos Lacerda, levou o presidente ao suicídio.
Jânio traiu Goulart, que foi traído pelo seu estamento Militar no golpe de 64. Lacerda e Juscelino foram traídos pelo presidente Castelo Branco. Collor foi traído pelo irmão e pelo Congresso, no processo de Impeachment. Temer traiu Dilma Rousseff e assumiu a presidência.
NO DIAS DE HOJE – Bolsonaro traiu o general Santos Cruz, seu amigo de 40 anos, e também Gustavo Bebiano, que o ajudou na campanha presidencial. Traiu também seu ministro da Defesa, general Azevedo e Silva, os comandantes do Exército, general Eduardo Pujol, da Marinha, almirante Ilques Barbosa, e da Aeronáutica, brigadeiro Antônio Carlos Bermudez.
Logo, não procede o argumento bolsonarista de que o deputado Arthur Lira (PP-AL) seja traidor por ter aceitado o apoio de Lula na disputa da presidência da Câmara. Afinal, a traição é a alma da política.
Antes de apontar o dedo para supostos traidores, Bolsonaro e Valdemar Costa Neto deveriam olhar o espelho e refletir sobre o passado, o presente e o futuro.
AMPLITUDE SOLAR – O tema ”traição” é de uma amplitude solar. No campo do saber por exemplo, lembremos a traição executada contra Sócrates, o filósofo dos filósofos, por inveja da sabedoria do mestre de Platão.
Na política contemporânea, Jair Bolsonaro já mudou de partido tantas vezes, em mais de 30 anos de vida partidária, traindo obviamente as respectivas siglas de aluguel. A última foi o PSL, que ele logo abandonou por divergências com Luciano Bivar, o dono do partido, no qual Bolsonaro entrou para tomar conta de tudo junto com os filhos. Como não conseguiu, saiu e tentou criar uma nova sigla, mas nem conseguiu as assinaturas suficientes.
O Plano B foi migrar com sua turma para o PL de Costa Neto, de olho no Fundo Partidário e no Fundo Eleitoral. Conhecendo o presidente do PL desde tempos idos, o cheiro de traição contra Bolsonaro e sua família já se sente a quilômetros de distância. Quando as fontes começarem a secar, o PL vai procurar beber água no oasis do novo governo.
Vamos aguardar o porvir, que está logo ali.
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