terça-feira, outubro 21, 2025

Editorial: O Casarão do Coronel João Sá — Quando a História Ruiu Junto com as Paredes








 

Editorial: O Casarão do Coronel João Sá — Quando a História Ruiu Junto com as Paredes

Início este texto lembrando o velho ditado: “não existe almoço grátis”. Em Jeremoabo, essa verdade amarga se aplica de forma dolorosa ao nosso patrimônio histórico. O prefeito Tista de Deda não tem o dom de ressuscitar o que já está morto — refiro-me ao Casarão do Coronel João Sá, símbolo da nossa memória política e cultural, que sucumbiu, restando apenas o que está escrito, porque o vento já levou o bem material.

Fizemos a nossa parte. Denunciamos, alertamos, clamamos por consciência enquanto ainda havia esperança de transformar aquele espaço num Museu Público, acompanhado de uma Biblioteca Municipal, que preservasse as raízes da nossa gente. Mas o tempo, aliado à falta de vontade política, fez o seu trabalho devastador. O povo de Jeremoabo mostrou-se incapaz de perseverar para proteger o que talvez fosse a parte mais importante da sua história. Hoje, o que nos resta são lembranças degradantes e um sentimento coletivo de falta de civismo.

Não devemos culpar apenas os prefeitos que passaram. A omissão dos vereadores foi determinante — eles, que deveriam zelar pelos interesses do município, silenciaram diante da destruição de um marco cultural. Mas a indiferença que culminou nessa tragédia também tem origem nos antigos proprietários do Casarão, homens de peso político e econômico que, com todos os meios à disposição, nada fizeram para preservar ou ao menos tombar a relíquia histórica.

O começo do fim se deu quando a história de Jeremoabo foi negociada como mercadoria, transformada em empreendimento particular sob o pretexto de um loteamento. À frente dessa insensatez, o ex-prefeito e mais dois cidadãos formaram o que se pode chamar de “triunvirato da devastação”.

Por justiça, é preciso citar um deles, o empresário Beto, proprietário do estabelecimento Caminho da Roça, que — mesmo sendo parte do grupo — alertou seus parceiros de que, se não cumprissem a promessa de restaurar o Casarão, ele ruiria. Recebeu, em troca, a resposta fria: “não vamos fazer nada, vamos deixar cair”. E caiu. A ganância, o metal vil e o desejo de lucros vultosos falaram mais alto do que a consciência, a ética e a história de um povo.

Indignado, Beto decidiu afastar-se, não compactuando com o assassinato da memória de Jeremoabo. Mesmo não sendo filho desta terra, demonstrou amor e gratidão ao povo que o acolheu, tornando-se uma andorinha solitária — que, embora incapaz de fazer verão sozinha, fez barulho, denunciou, resistiu.

O Casarão ruiu. Ruiu também um pedaço da alma de Jeremoabo.
Perdeu o povo. Ganhou o esquecimento.
E sobre as ruínas do passado, restou apenas o silêncio cúmplice dos que poderiam ter evitado a tragédia — mas escolheram o lucro em vez da história.

Que essa perda sirva, ao menos, como lição amarga:
um povo que não preserva sua história, cedo ou tarde, perde também sua identidade.

Nota da Redação Deste Blog -

Coronel João de Sá e a Fazenda Nossa Senhora de Brotas


A Fazenda Nossa Senhora de Brotas, que pertenceu ao poderoso coronel João Gonçalves de Sá e abriga a capela em homenagem à santa e a antiga mansão do mais conhecido chefe político de Jeremoabo tem destino incerto. Desde que foi comprada pelos empresários Marco Dantas, Deri e Beto do Caju não se sabe o que será feito com este patrimônio histórico e cultural.

Quando a fazenda instalada em terras registradas desde o século 17 foi vendida na primeira década dos anos 2000, circulou na cidade que ela seria transformada em universidade e museu. A realidade hoje é bem diferente. O local foi loteado e estão sendo construídas imóveis que serão colocados à venda no entorno da parte histórica, onde está a Mansão dos Sá e a Capela de Nossa Senhora de Brotas.

De acordo com o ex-secretário de Educação do município, Pedro Son, a prefeitura deveria ter comprado a propriedade há anos, mas isso não foi feito. Pedro cogita que os donos da fazenda pretendem ganhar tempo para negociar com o município a residência do coronel, que está fechada e tem partes em ruínas, e a igrejinha. Na fazenda, um vigia, que também coordena as obras em andamento, informa que os patrões estão viajando e que não sabe o que será feito do local, onde a visitação é permitida.

A história do que viria a ser a fazenda dos Gonçalves de Sá começou no início do século 17 quando foi construída a primeira capela de Nossa Senhora de Brotas. No local, padres catequisavam os índios. Em março de 1669, porém, Francisco Dias D’Ávila, neto de Garcia D’Ávila, que chegou à Bahia com Tomé de Souza e tomou posse das terras que margeavam o rio São Francisco, estendendo-se para o norte pelos sertões de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí, incendiou a igreja. A ação foi represália aos missionários que se recusavam a escravizar os indígenas.
Por volta de 1778, quando a freguesia de São João Batista de Jeremoabo do Sertão de Cima possuía apenas 32 casas e 252 habitantes – apenas cinco eram brancos – uma nova igreja dedicada à mesma santa servia como local de refúgio e devoção para os escravos.
De mansão construída ao lado da capela, João Sá (1882-1958) avistava toda a dimensão de seu canavial. Sua casa também servia de palco de grandes festas e para receber visitantes ilustres trazidos do Rio de Janeiro pelo filho do coronel. Um deles, foi o médico e compositor mineiro Joubert de Carvalho, que passou uma temporada em Jeremoabo, compôs o hino da cidade e teria se apaixonado pela filha do coronel.
O coronel João Gonçalves de Sá também ficou conhecido por ser um dos mais importantes “coiteiros” de Lampião e seu bando. Com patente da Guarda Nacional, exercendo o cargo de deputado estadual pelo PSD (depois seria prefeito de Jeremoabo), Sá conheceu o cangaceiro na localidade de Sítio do Quinto, quando viajava para Salvador, em 1928. Lampião propôs que ele e o pai, Jesuíno Martins, fizessem parte de sua rede de protetores em troca de favores. Pediu também 200 mil réis, que foram dados pelo coronel.
A partir daquele momento, toda vez que o cangaceiro chegava em Jeremoabo, se escondia por trás da serra numa caverna e mandava seus homens buscarem mantimentos para o bando na propriedade do coronel. O político tirava vantagem do acordo feito com Lampião. Segundo moradores mais antigos da cidade, Sá mandava o cangaceiro ameaçar os fazendeiros que se recusavam a vendê-las por baixos valores. A opção era entregar a propriedade ou morrer.

Foto de Paulo Oliveira -Fonte: meussertões.com.br

Postado no Grupo "Lampião, cangaço e nordeste" FACEBOOK

Por José Montalvão – Funcionário Federal Aposentado, Graduado e Pós-Graduado em Gestão Pública, proprietário do Blog de De Montalvão, matrícula ABI C-002025.




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