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domingo, agosto 28, 2022

Entre demanda, oferta e uma interdição




Existe a demanda; daqueles que não querem nem a volta de Lula nem a continuidade de Bolsonaro. Existe também a oferta. Mas o consumidor não responde

Por Carlos Andreazza (foto)

É singular o mercado da política. Há demanda por um produto eleitoral alternativo a Lula e Bolsonaro. Fosse outro mercado qualquer, a indústria o teria fabricado — com sucesso.

É singular o da política. Existe a demanda; daqueles que não querem nem a volta de Lula nem a continuidade de Bolsonaro. Existe também a oferta. Mas o consumidor não responde. A demanda não materializa engajamento. A oferta não atrai.

É como se houvesse uma interdição; como se o medo de o desprezado — Bolsonaro ou Lula — vencer empurrasse o eleitor para um segundo turno antecipado. Um sentido de urgência que paralisaria as possibilidades competitivas da opção demandada; sentido de emergência que se imporia ao eleitor nem lulista nem bolsonarista. O voto num candidato que não Lula ou Bolsonaro então transformado em capricho — mesmo em excentricidade — ante o dilema eleitoral brasileiro.

Nota importante. Que não se pense que a aversão ao presidente Bolsonaro é rejeição sem par. O antilulopetismo, talvez anestesiado, já mostra seu corpo e, creio, ainda se mobilizará.

Pensei nisso — no mercado que não se realiza — enquanto via a entrevista de Simone Tebet ao Jornal Nacional. Ela é, também Ciro Gomes, a oferta de alternativa. Mas a própria construção deste texto até aqui — a longa introdução — evidencia que o mercado que prospera, que amassa, é o da antecipação do embate final; encorpando-se, sobretudo, a tendência de que os poucos votos que têm, Tebet e Ciro, escasseiem progressivamente até 2 de outubro. Uma tendência. Não uma sina. Há que pelejar. Há o que pelejar.

Tebet foi bem na entrevista. Tom sereno. A professora de administração do Brasil. Ela vai bem. É preparada. Tem uma equipe de primeira. (Mas o que significará, para o pobre, a propaganda constante de um time de grandes economistas liberais, esse fetiche, se a economia brasileira chafurda sob o liberalismo palestrante de Paulo Guedes?)

Tebet é senadora da República com atuação respeitável. Conjunto que expôs para a audiência do JN. Mas que não é capaz, não até quase setembro de 2022, de vender aquilo que se espera, para começo de conversa, de uma alternativa: a de ser a garantia da pacificação nacional; de um amanhã de estabilidade. Tendência não é destino. Mas ela ainda não conseguiu desafiar, furar mesmo, a interdição que dirige o eleitor não alinhado a votar contra o medo.

As pessoas estão cansadas, gostariam de alguma previsibilidade, mas avançam ou para a incerteza de um Lula que se fia no Lula de vinte anos atrás, um Lula Kinder Ovo, para citar expressão de Ciro em entrevista a este jornal, ou para permanente instabilidade institucional gerada pelo populismo autocrático de Bolsonaro.

Tebet faz a leitura correta do cenário. O diagnóstico é preciso. A crítica, certeira. Mas, para a crítica somente, não se precisa de candidatura. Não está mais na CPI da Covid. E não que lhe falte projeto. Falta comunicação. Uma marca capaz de lhe dar concretude. O tom é bom. O endereçamento não alcança.

Não basta defender, com indignação, a democracia, essa ameaçada. É elitista. O cidadão não estará nem aí para a democracia enquanto não tiver o mínimo de República: a certeza de comida em casa. Tebet tinha uma chance de dizer o que fará para melhorar a vida da população num país que estará afundado — de modo sem precedentes — no caos político e econômico. Deveria ter insistido em seu projeto para os informais, por exemplo. Deveria o ter explicado. Teve a oportunidade, mas jogou, uma, duas vezes, o detalhamento para propaganda em rádio e TV. Escolha arriscada.

O Globo

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