Barganha do PMDB por cargos e mão forte do governo abrem a porta a Chávez
BRASÍLIA - Em meio à barganha do PMDB por cargos, uma operação do governo em busca dos votos com a participação pessoal do ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, permeado por discursos críticos dos próprios aliados contra o presidente venezuelano, Hugo Chávez, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou ontem a adesão da Venezuela ao Mercosul. A proposta vai ao plenário e, depois, ao Senado onde deve enfrentar resistências maiores dos senadores a começar pela Comissão de Relações Exteriores presidida pelo oposicionista Heráclito Fortes (DEM-PI).
O placar foi amplamente favorável ao governo, 44 votos a favor e 17 contrários, provocando acusações do deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA), que, até o dia anterior, contava com várias dissidências de deputados da base, principalmente na bancada do PMDB.
"Muita gente da base do governo dormiu terça-feira chateada e reclamando e acordou hoje (ontem) satisfeita. A mão forte do governo esteve presente. Se não tivesse havido esse envolvimento muito forte, esse resultado seria outro", afirmou ACM Neto.
Os votos
Os partidos da base votaram unidos a favor da proposta. O PMDB que ameaçou votar contra, o que levou o governo a pensar em adiar a votação sob o risco de ser derrotado, acabou sendo convencido a ficar a favor. Considerado independente, o deputado Nelson Trad (PMDB-MS), foi o único voto contrário da bancada.
O PSOL se uniu à base nessa votação. O PSDB, o DEM e o PPS, chegaram à reunião já com a decisão do partido de votar contra a entrada da Venezuela no Mercosul. O ministro Celso Amorim atuou por telefone. Procurou os líderes aliados e pediu que eles se empenhassem pessoalmente para conseguir os votos favoráveis à proposta.
Em coro, os líderes governistas repetiram ontem, por várias vezes, números referentes às exportações brasileiras para dar dimensão comercial à relação do Brasil com a Venezuela. "A Venezuela é o terceiro parceiro comercial do Brasil", ressaltou o líder do governo na Câmara, José Múcio Monteiro (PTB-PE), que acompanhou a reunião da CCJ ontem.
Assim como José Múcio, os líderes da base fizeram corpo-a-corpo com os deputados na Comissão. Contavam os votos e a presença de suas bancadas para garantir que a proposta seria aprovada ontem. Durante cerca de cinco horas, as discussões ficaram em torno do polêmico Hugo Chávez e a existência ou não de democracia na Venezuela.
Judas
A defesa da aprovação do ingresso do país no Mercosul pela base não poupou o presidente venezuelano. "O Chávez é horroroso. Se pudéssemos fazer um boneco dele, faríamos fila para malhá-lo no dia de Judas. Chávez é uma figura horripilante para a América Latina, mas precisamos da parceria comercial com a Venezuela", afirmou o líder do PTB, deputado Jovair Arantes (GO), pedindo a aprovação da proposta e argumentando que a Câmara não devia entrar na questão política dos outros países.
"Não comungo das idéias de Chávez. Não gostaria de conviver no país com alguém que tenha essas práticas políticas, mas estamos falando de um importante parceiro econômico. Hugo Chávez passa, mas a Venezuela fica", afirmou o líder do PR, deputado Luciano Castro (RR). Em nome do PMDB, o vice-líder Eduardo Cunha (RJ) anunciou que o partido votaria a favor ressaltando "a discordância com a atuação do presidente Hugo Chávez com seus métodos e suas falácias".
Os deputados de oposição mantiveram o discurso de que não há democracia na Venezuela, o que impede a sua entrada no Mercosul de acordo com o tratado de Ushuaia que estabeleceu a cláusula democrática. Insistiram também na idéia de que Chávez tem um projeto geopolítico com interesse de mudar a configuração do Mercosul.
Na defesa da entrada da Venezuela no bloco, governistas defenderam o pluralismo nas relações do Brasil com os outros países e a impossibilidade de julgar decisões políticas de outros governos. "Não podemos nos transformar em um tribunal arrogante e autoritário", disse o deputado Flávio Dino (PCdoB-MA).
Senado
No Senado, o cenário para aprovação do ingresso da Venezuela no Mercosul é menos previsível. Em reunião na noite de terça-feira, a Executiva Nacional do PSDB decidiu votar contra o ingresso da Venezuela. Segundo nota divulgada pelo partido, o presidente do PSDB, Tasso Jereissati, afirma que a posição contrária à medida leva em consideração as condições políticas da Venezuela e o fato de o país não ter atendido as condições técnicas pré-estabelecidas para a admissão de novos membros no mercado comum.
O PSDB avaliou ainda que "o comportamento do presidente venezuelano Hugo Chávez é uma ameaça à democracia em toda a América do Sul". "Tanto pela influência que tem tentado expandir em outros países, como pela corrida armamentista que tem promovido", conclui a nota.
Já o líder do DEM (ex-PFL), senador José Agripino (RN), previu que também os seus colegas de partido, a exemplo dos senadores do PSDB, devem se manifestar contra o projeto que confirma o ingresso da Venezuela no Mercosul. Agripino alega que, apesar de não ser uma questão programática, é consenso entre os integrantes do DEM que a presença de Chávez no Mercosul causará mais prejuízos do que benefícios.
"Ele vai chegar querendo tutelar, espalhando brasas dentro de um bloco comercial cujo principal alvo deveria ser o de manter relacionamento com a China, a União Européia, os Estados Unidos e o Japão". O líder do DEM disse não ter dúvidas de que, no caso de entrada da Venezuela no Mercosul, quem vai querer "dar as cartas" no bloco econômico é o presidente Chávez.
Além dos procedimentos adotados pelo presidente da Venezuela que, segundo Agripino, enfraquece a democracia daquele país, Chávez não vai quer ser apenas mais um integrante do Mercosul: "Ele vai querer ser o Mercosul".
Fonte: TRibuna da Imprensa
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