Por Renata Leite
A cada cinco segundos morre uma criança por falta de alimentos no mundo. A fome já atinge 800 milhões de pessoas. Os dados são da Organização das Nações Unidas (ONU) e ilustram a miséria, causada por um dos piores males da humanidade. Na Bahia, dos 13 milhões de habitantes, mais de 4 milhões se disseram inseguros quanto a sua alimentação, conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD).
Apesar da alimentação ser um dos diretos básicos, defendidos pela Constituição Brasileira, em muitos lares baianos faltam os elementos essenciais para a nutrição do ser humano: o feijão e o arroz. Longe do luxo e da sofisticação de poucas famílias, há aquelas que sobrevivem comendo farinha, quando acham, ou até mesmo restos de alimentos encontrados nos lixões.
Com o objetivo de mudar essa realidade, a ONU criou, em 1981, o Dia Mundial da Alimentação, a ser comemorado no próximo mês (dia 16) por mais de 150 países. O principal foco é a conscientização da população mundial sobre a difícil situação das pessoas que passam fome ou estão desnutridas.
De acordo com a PNAD, divulgada pelo IBGE, 34,8% dos 51,8 milhões de residências particulares do Brasil havia insegurança alimentar, ou seja, a ausência da realização do direito de todos ao acesso regular e permanente de alimentos de qualidade, em quantidade suficiente. O relatório apontou ainda que dentre os 18 milhões de domicílios com insegurança alimentar, 3,4 milhões foram classificados em situação grave e 1,6 milhão destes estavam no Nordeste. Na Bahia, 36,37% da população se disseram inseguros quanto a sua alimentação. Desse total, 4,5 milhões tinham rendimento familiar per capita de até um salário mínimo.
Para a secretária Municipal do Desenvolvimento Social (Sedes), Maria das Dores Loiola Bruni, atuar no combate a fome é difícil para qualquer instituição. “Comer é uma necessidade básica fundamental. Quem não come e não bebe morre. É um direito inalienável. Não se justifica um país como esse alguém passar fome. Ninguém nasceu para passar sofrer”, afirma.
Embora haja uma série de políticas públicas no âmbito social sendo implementadas, de atendimento as necessidades básicas (alimentação, vestuário, lazer e educação) boa parte das famílias de baixa renda estão longe de ter seus direitos assegurados. “Se conseguíssemos dar três refeições no mesmo dia para essa camada da população sairíamos tranqüilos. As pessoas têm que comer e ser felizes. Esta é uma visão de mundo que precisa estar presente na cabeça dos homens e em qualquer esfera de atuação, seja governamental ou privada. A segurança alimentar, lazer e vestuário às pessoas deve ser encarada como uma função de estado enquanto instituição e, não política de governo, porque são transitórias, sem conseqüência lógica”, diz.
Desigualdade econômica e social
Conforme a secretária Maria das Dores, cada vez mais as pessoas estão “olhando para o próximo”, no entanto, a participação do empresariado, principalmente, em distribuir alimentos é um gesto para beneficio próprio. “Essa situação que ai se encontra não caiu do céu por acaso. Foi construída pela própria sociedade, portanto, compete a ela desconstruir essa lógica e construir uma nova realidade. A iniciativa privada, a exemplo dos empresários, acordou para este fato porque não está podendo usufruir da sua riqueza em virtude da violência. Há solidariedade nas atitudes, mas também o componente auto defesa”, ressalta.
Na opinião de Bruni, o problema da fome é atribuído a desigualdade social e econômica imposta pelo sistema capitalista - cerca de 80% da riqueza infelizmente se concentra em 10% da população. “A reforma agrária é uma saída para esta crise. Salvador é uma das cidades que sofre com a superpopulação. As pessoas começaram a sair do campo atrás de oportunidade. Como não deu certo, foram para debaixo da ponte viver de forma subumana. O campo deve ser um instrumento de sobrevivência”, sugere.
Reduzir a fome e a pobreza extrema até 2015 é uma das metas da ONU, além de garantir o acesso à educação, a igualdade de gêneros, a luta contra a mortalidade infantil, a aids e outras doenças, a melhora da saúde materna e a sustentabilidade do meio ambiente. No entanto, para o sociólogo Gey Espinheira a maior parte desses objetivos só serão alcançados quando houver mais progressos. “A pobreza não é algo natural, é produzida pela riqueza, uma construção política. Tem que se fazer ofertas nas famílias vulneráveis socialmente tecnologia para que elas possam produzir seus alimentos e superar esse drama”, salienta.
Lutar para que todos tenham acesso a alimentação é um desafio constante dos órgãos governamentais. Na capital, a Sedes desenvolve o projeto o Prato Popular, que funciona em São Tomé de Paripe. O restaurante atende aproximadamente 300 adultos e 70 crianças por dia, com renda inferior a R$ 150. Apenas quem tem mais de 7 anos paga R$ 0,50 pelo prato de comida – arroz, feijão, porção de carne e verduras. “Nossa prioridade é aqueles que não têm renda. Lá eles não vão somente para comer, mas participar de ações sócio educativas. Distribuir alimentos apenas não resolve”, afirma Bruni.
As Voluntárias Sociais da Bahia faz a distribuição de sopas a 7.200 pessoas, em nove comunidades – Fazenda Coutos III, Jardim Valéria II, Bela Vista do Lobato, Morada da Lagoa, Ilha Amarela, Calabetão, Jardim Santo Inácio, Paripe, Castelo Branco – e em instituições carentes – 179 na capital e 365 no interior. “Procuramos minimizar a carência de alimentos dessas pessoas”, disse a coordenadora do projeto Nossa Sopa, Viviane Zacarias.
Outra ação desenvolvida é da Pastoral da Criança, vinculada a Igreja Católica. Segundo a coordenadora Jurani Sales, o objetivo é estimular as famílias de baixa renda a saber conviver com a própria realidade. “São pessoas extremamente carentes. Muitas não têm onde morar quanto mais o que comer. Ensinamos a fazer o reaproveitamento dos alimentos, utilizando as sementes e cascas”, afirma, acrescentando que a região suburbana de Salvador é um dos locais mais críticos.
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