Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA – Aposta fácil para quem gosta de especular sobre o futuro é de que não haverá reforma política votada este ano no Congresso. Nem que a vaca tussa, ou, sequer, se o Sargento Garcia prender o Zorro. Há décadas que múltiplos projetos são examinados e debatidos, mas acordo não houve, não há, nem haverá entre os 513 deputados, não obstante os 81 senadores já terem aprovado alguma coisa.
Começa com a reeleição. Imposta pelo então presidente Fernando Henrique, constituiu um escárnio à possibilidade de detentores de mandatos executivos de quatro anos disputarem um segundo período de governo no exercício dos cargos. Mesmo eleito para um mandato, o sociólogo ficou dois, assim como o torneiro-mecânico. E José Serra também ficará se eleito ano que vem. Inexistirá maioria de deputados em condições de votar, por três quintos da representação, o impedimento daquilo que bem ou mal se transformou numa prerrogativa de presidentes da República, governadores e prefeitos.
Para os deputados, haverá que agradarem quantos estiverem no poder ou na perspectiva de empalmá-lo. Mesmo com a ilusão do aumento dos mandatos executivos de quatro para cinco anos, a subtração evidente servirá de obstáculo definitivo. Possível na teoria será apenas a aprovação de emenda constitucional permitindo o terceiro mandato para o Lula, caso os companheiros e seus aderentes percebam estar a um passo da derrota para os tucanos. Mesmo assim, a frio essa mudança não passa. Só no bojo de uma crise, na hipótese de a economia continuar se desmanchando como sorvete ao sol.
O que dizer das demais propostas já completando a maioridade? Votação para deputado em listas partidárias, em vez do voto pessoal, de jeito nenhum. Por mais força que os caciques detenham, os índios ainda são capazes de organizar-se para preservar seus espaços. Financiamento público das campanhas, em meio à falta de recursos, crédito e demais mazelas geradas pela crise econômica? Também não. Voto distrital? Para a maioria da Câmara equivaleria a suicídio. Diminuição do número de partidos através da cláusula de barreira, com a supressão de legendas históricas e de legendas de aluguel? Ora...
Sendo assim, mais uma vez, o Legislativo deixará de legislar sobre questões polêmicas. A sucessão presidencial e as sucessões estaduais encontram-se na rua. Todas as decisões serão examinadas à luz das eleições gerais de 2010. Em consequência, adeus reforma política...
Equação inconclusa
Dispondo-se o governador Aécio Neves a iniciar semana que vem seu anunciado périplo pelos estados, a pergunta que se faz é sobre o “plano B” do neto do dr. Tancredo. Porque em condições normais de temperatura e pressão, com ou sem a realização de prévias junto às bases do PSDB, o candidato tucano será José Serra. Nem se os foguetes do Hamas ou os mísseis de Israel conseguissem atingir São Paulo seu governador deixaria de sair vitorioso. Importa menos, inclusive, observar que Aécio representa algo de novo na atual política nacional, alguém disposto a avançar pelo menos uma geração.Permanece a indagação: o que pretende o governador mineiro? Não será preparar sua candidatura ao Senado, que conseguiria mesmo permanecendo os próximos dois anos na praia de Ipanema. Bandear-se para o PMDB, imaginando sair candidato do maior partido nacional? Não haveria quem confiasse, muito menos alguém nascido nas Gerais. Esperar que diante do provável fracasso de Dilma Rousseff o presidente Lula promoveria uma espécie de união das forças oficiais em torno de seu nome? Seria transformar o PT em Faixa de Gaza.
Quem quiser que decifre o enigma ou resolva sem todos os fatores essa equação inconclusa.
Lá vêm eles, outra vez
Antes que janeiro termine, o MST terá iniciado nova etapa de sua estratégia política. Invasões de propriedades rurais estão sendo minuciosamente programadas, bem como a ocupação de prédios urbanos abrigando repartições federais, assalto a postos de pedágio e, talvez, alguma inovação em termos de baderna. Espera-se que João Pedro Stédile e sua turma não estejam programando seqüestros nem novas invasões do Congresso, mas as indicações apontam para turbulências programadas.
O ressentimento é grande nos acampamentos do MST. Apesar da propaganda governamental, muito pouco tem sido feito em termos de reforma agrária.
Mal-estar na diplomacia
Explicação difundida nos corredores do Itamaraty para a viagem próxima do ministro Celso Amorin à Palestina e a Israel: chegar primeiro na fonte e beber água limpa, conforme o provérbio árabe. Traduzindo: antecipar-se antes que o “chanceler do B”, Marco Aurélio Garcia, embarque para a Faixa de Gaza. Porque entra ano, sai ano, desde 2003, o mal-estar é o mesmo no reino das relações exteriores. O assessor especial do presidente Lula atropela não apenas na América Latina, mas no planeta inteiro. Telefona e recebe telefonemas de chanceleres variados, engata propostas diferentes daquelas
preparadas na diplomacia oficial e, não raro, faz a cabeça do companheiro maior.
Não é apenas nos Estados Unidos que os assessores especiais costumam obturar os canais ortodoxos. De Henry Kissinger a Condoleeza Rice, chegam até a ocupar a secretaria de Estado, depois de anos minando e sabotando suas estruturas. No Brasil, tivemos o exemplo de Augusto Frederico Schmidt, que nos tempos do governo Juscelino Kubitschek não se tornou ministro, mas determinou a saída do próprio, em meio à Operação Pan-Americana. Pelo sim, pelo não, Celso Amorin viaja primeiro.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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