Certificado Lei geral de proteção de dados

Certificado Lei geral de proteção de dados
Certificado Lei geral de proteção de dados

domingo, fevereiro 26, 2023

Lembra do trem-bala? Ele voltou, e Lula enfrenta novamente seu velho pesadelo

Publicado em 26 de fevereiro de 2023 por Tribuna da Internet

Democracia Política e novo Reformismo: Charge: Trem bala

CHarge do Humberto (Folha de Pernambuco)

Elio Gaspari
Folha/O Globo

Com jeito de quem não quer nada, na quarta-feira a Agência Nacional de Transportes Terrestres divulgou sua deliberação nº 47, com três artigos. Outorgou à empresa TAV Brasil, constituída em fevereiro de 2021 com capital de R$ 100 mil, autorização para “a construção e exploração de estrada de ferro entre São Paulo e o Rio de Janeiro pelo prazo de 99 anos”.

Ganha um lugar na viagem inaugural desse trem quem conseguir explicar o que essa autorização significa, pois faltam o capital, o projeto de engenharia e a demonstração da demanda.

Mesmo pesadelo – É o velho trem-bala que ressuscita. Pelo que se promete, em junho de 2032 ele ligará as duas cidades em 90 minutos. A autorização da ANTT custou-lhe uma folha de papel. Esse trem custaria algo como R$ 50 bilhões, cerca de US$ 10 bilhões.

Sonhar é grátis. Lula já disse que pretende reativar os estaleiros do Rio. Seria o quarto polo naval que sua geração financia, coisa inédita na história das navegações. Agora reaparece o trem-bala. Ele foi um sonho do consulado petista, acabou em pesadelo e só serviu para produzir uma empresa estatal. E antes que se dê outro passo com o trem-bala 2.0, convém revisitar o que aconteceu com o primeiro projeto.

Em 2004, durante o primeiro mandato de Lula, foi constituído um grupo de trabalho para estudar a “ligação ferroviária por trem de alta velocidade entre as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro”. Seu coordenador era José Francisco das Neves, o “Doutor Juquinha”, presidente da estatal Valec – Engenharia, Construções e Ferrovias S.A.

TUDO GRÁTIS… – Os doutores visitaram fábricas da Itália e da Alemanha e, em abril de 2005, o grupo de trabalho recomendou o projeto da italiana Italplan. O trem-bala ligaria o Rio a São Paulo em 88 minutos, sem paradas, transportando cerca de 90 mil passageiros por dia. A obra levaria sete anos, e a concessão duraria outros 42. A conta ficaria em US$ 9 bilhões, sem que a Viúva tivesse que botar um centavo. (Em 2004 o dólar estava a R$ 3.)

Um curioso intrigou-se com o fato de que o trem iria do Rio a São Paulo sem qualquer parada. Todos os outros trens de alta velocidade param no caminho.

O “Doutor Juquinha” disse-lhe que essa era a proposta dos italianos e que não havia motivo para preocupação, pois a ministra Dilma Rousseff havia incluído o trem-bala no Programa de Aceleração do Crescimento, o falecido PAC. Qualquer dúvida, os italianos esclareceriam. Procurados os italianos, deu-se o seguinte diálogo:

– “Por que o trem vai do Rio a São Paulo sem paradas?”

– “Porque pediram um projeto sem paradas.”

TCU PAROU O TREM – Em 2007, o BNDES e o Tribunal de Contas da União mastigaram as contas do projeto da Italplan. Saltou aos olhos que o trem-bala precisaria de subsídio. Além disso, sua malha começou a espichar indo até Campinas. Espichou também o custo, subindo para US$ 11 bilhões.

Em abril de 2008, Lula anunciou que a licitação do trem aconteceria em outubro. Ele estaria nos trilhos durante a Copa do Mundo de 2014 com oito paradas. Não houve a licitação, mas o custo estimado pulou para US$ 15 bilhões. Tudo isso, sem que houvesse um projeto de engenharia, numa obra que teria 16 km de túneis.

Em 2010 (ano eleitoral), o assunto estava no Tribunal de Contas e lá percebeu-se que a estimativa de demanda (e da renda) havia sido grosseiramente manipulada. O TCU freou o projeto por algum tempo, e os italianos foram mandados passear.

MAIS SONHOS – Candidato ao governo de São Paulo, o petista Aloizio Mercadante prometia trabalhar para que o trem fosse também a Sorocaba, Bauru, Ribeirão Preto e Rio Preto. Nessa campanha eleitoral, Lula comparou a audácia da obra à da construção da torre Eiffel, em Paris.

O trem só deveria rodar em 2017, mas em 2010 seu projeto produziu uma estatal, a Empresa de Transporte Ferroviário de Alta Velocidade, Etav. Durante a campanha o trem-bala foi uma cereja de bolo. Chegou-se a anunciar que ele poderia ir a Curitiba.

Passada a eleição, adiou-se a licitação da obra. Consórcios da China, França, Coreia e Espanha, que teriam interesse na obra, caíram fora. (Alguns, como o coreano, podem ter se reciclado.)

NUNCA ACONTECEU – Um grande empresário nacional ironizava: “Se o empreiteiro é o sujeito que convenceu o faraó a empilhar aquelas pedras no deserto, com esse trem a faraó (ou faraoa) quer fazer a pirâmide, mas os empreiteiros não querem”. O leilão foi adiado três vezes e nunca aconteceu.

Em setembro de 2011, a ANTT informou que os estudos de engenharia demorariam pelo menos um ano. A essa altura o trem-bala já havia consumido R$ 63,5 milhões e o custo da obra estava estimado em US$ 20,1 bilhões. (Em 2005 falava-se de US$ 9 bilhões.) Em 2014, Dilma Rousseff admitiu que o trem-bala havia deixado de ser prioridade.

A única coisa que andou foi um litígio judicial aberto pela Italplan na Itália. A empresa que em 2004 tinha a preferência do grupo de trabalho processou o governo brasileiro e, em março de 2016, pedia na Justiça cerca de R$ 1 bilhão por serviços prestados.

JUQUINHA FOI PRESO – Em julho de 2012, por conta de outras malfeitorias praticadas na Valec, o “Doutor Juquinha” foi preso. Dormiu poucas noites na cana. Anos depois, ralou uma condução coercitiva.

Andou também a estatal Etav. Transformou-se na Empresa de Planejamento e Logística (EPL). Em 2017 empregava 143 pessoas e custava R$ 99 milhões anuais. Já a Valec tinha 1.027. Ambas sobrevivem, fundidas na Infra S.A.

Lula comparou as críticas ao projeto do trem-bala, nascido em 2004, às que foram feitas à construção da torre Eiffel. A torre ficou pronta em menos de dois anos.

DIZ O MINISTRO – O ministro dos Transportes, Renan Filho, informa que a autorização dada pela ANTT para a construção e operação por 99 anos do trem-bala de Lula 3.0 é um projeto inteiramente privado da TAV Brasil. A autorização da ANTT é inteiramente pública. Renan tinha 24 anos e acabara de se formar em economia quando o grupo de trabalho do “Doutor Juquinha” dizia a mesma coisa.

Geraldo Alckmin, atual vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, conhece a história do trem-bala desde 2009, quando era secretário de Planejamento do Governo de São Paulo. Em 2010, como governador eleito, ele sugeria que o trem não passasse pelos aeroportos de Guarulhos e Viracopos, mas que eles fossem servidos por duas outras ferrovias expressas.

Aloizio Mercadante, defensor da extensão da malha do trem-bala para Sorocaba, Bauru, Ribeirão Preto e Rio Preto, é o atual presidente do BNDES. Tarcísio de Freitas, atual governador de São Paulo, foi um implacável diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes em 2011, durante a “faxina ética” que Dilma Rousseff fez no setor de transportes do seu governo. Conhece a história da Valec e do trem-bala de cor e salteado.

Em destaque

Para rebater críticas, Pimenta diz que não é inimigo do governador Eduardo Leite

Publicado em 15 de maio de 2024 por Tribuna da Internet Facebook Twitter WhatsApp Email Lula se livrou de Pimenta, que não ficará mais no Pl...

Mais visitadas