O ovo da serpente atende pelo nome de Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal.
Como ministro do STF já mostrava a que vinha em março/2007, quando foi o relator do Caso Olivério Medina (que pleiteava refúgio humanitário no Brasil) e tentou convencer seus pares a avocarem a decisão sobre se os crimes atribuidos ao ex-integrante das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia eram políticos ou comuns. Foi sua primeira tentativa de usurpar tal prerrogativa do Executivo.
Nenhum outro ministro o apoiou. O STF reconheceu que a decisão do governo brasileiro, concedendo o status de refugiado político a Medina, havia sido juridicamente perfeita, pois a lei que regulamenta a concessão do benefício (a 9.474, de 22/08/1997, conhecida como Lei do Refúgio) é taxativa: o "reconhecimento da condição de refugiado obstará o seguimento de qualquer pedido de extradição".
Depois, em maio/2007, teve reação das mais exageradas quando uma investigação sigilosa da Polícia Federal sobre a máfia das obras públicas vazou para a imprensa. Aparecia um Gilmar Mendes na lista dos que teriam recebido mimos e brindes da principal empresa corruptora, só que se tratava de um homônimo. Mesmo assim, o então vice-presidente do STF acusou a PF de "canalhice".
Logo em seguida, Mendes insinuou que o ministro da Justiça Tarso Genro omitia-se quando a PF extrapolava sua competência: "Se a polícia começa a decidir quem ela prende e quem ela solta, na verdade, nós estamos num outro modelo que não é o modelo do Estado de Direito".
Não se fez de rogado em apontar qual seria o tal modelo: o da URSS stalinista e o da Alemanha nazista. Sugeriu que a PF estava a caminho de se tornar uma KGB ou Gestapo.
Eleito em março/2008 para a presidência do STF, Mendes aproveitou bem o erro crasso cometido pelo juiz Fausto De Sanctis em julho/2008, ao expedir um segundo mandado de prisão contra o banqueiro Daniel Dantas, logo após ele haver sido beneficiado por um habeas-corpus do STF. Configurava-se o desrespeito de um juiz de instância inferior a uma decisão do Supremo, algo inaceitável numa democracia.
Como o ministro Tarso Genro, de início, apoiou incondicionalmente a Operação Satiagraha, Mendes pôde bater de novo na tecla de que seria o grande defensor do estado de direito contra investidas totalitárias do Governo Lula -- desta vez com mais credibilidade, chegando a receber desagravos e manifestações de solidariedade de expoentes do Judiciário.
Catapultado a novo ídolo da direita, Mendes não parou mais de deitar falação reacionária. Chegou a igualar as atrocidades cometidas pela ditadura militar aos excessos porventura cometidos por resistentes, ao rebater uma afirmação de Dilma Rousseff, de que as torturas constituíam crime imprescritível.
"Essa discussão sobre imprescritibilidade é uma discussão com dupla face, porque o texto constitucional também diz que o crime de terrorismo é imprescritível", afirmou Mendes em novembro/2008, confundindo maliciosamente o exercício do legítimo direito de resistência à tirania com práticas terroristas -- uma falácia característica da propaganda enganosa dos sites fascistas.
Mendes também não tem medido esforços para influenciar negativamente a decisão do STF no Caso Cesare Battisti. Quer porque quer dar a volta por cima da acachapante derrota que sofreu no Caso Medina, reapresentando a mesmíssima tese já rechaçada em 2007. Desta vez, tem as direitas brasileira e italiana ao seu lado.
Salta aos olhos que está mirando mais longe: uma eventual prevalência da tese de que os crimes imputados a Battisti foram comuns reforçaria a posição das viúvas da ditadura brasileira no debate resistência ou terrorismo?. Mendes almeja uma condenação em bloco da luta armada, seja contra democraduras como a da Itália na década de 1970, seja contra as ditaduras nada brandas da América do Sul.
Last but not least, Mendes acaba também de engrossar a grita direitista contra uma alegada omissão do Governo Lula face a excessos do Movimento dos Sem-Terra: ""Há uma lei que proíbe o governo de subsidiar esse tipo de movimento. [Repassar] dinheiro público para quem comete ilícito é também uma ilicitude, e aí a responsabilidade é de quem subsidia", afirmou.
Pavoneando-se sofregamente diante dos microfones, manda às favas a regra de ouro de que ministro do STF se manifesta é nos autos.
Cada vez mais se projeta como um dos líderes informais da oposição ao governo federal, imiscuindo-se em assuntos caracteristicamente políticos e trombeteando opiniões que melhor faria guardando para si, em nome da discrição que deve pautar o comportamento do presidente da mais alta corte do País.
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Fonte: CMI Brasil
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