Rayssa Motta
Estadão
Poucos meses depois de interromper pagamento de dívida de R$ 10,3 bilhões do grupo J&F, ministro do STF agora estende decisão à empreiteira Novonor (ex-Odebrecht), que confessou à Operação Lava Jato uma rotina de corrupção em contratos com a Petrobrás e órgãos públicos
A empresa alegou que foi pressionada a fechar o acordo para garantir sua sobrevivência institucional, e Toffoli reconheceu que há dúvida razoável sobre o requisito da voluntariedade. “A declaração de vontade no acordo de leniência deve ser produto de uma escolha com liberdade”, escreveu o ministro.
ATUAÇÃO IRREGULAR – Os pagamentos foram suspensos enquanto a empresa analisa documentos da Operação Spoofing, em busca de mensagens que possam indicar atuação irregular dos procuradores da força-tarefa.
A Odebrecht assumiu o compromisso de pagar R$ 2,72 bilhões ao longo de 20 anos. As autoridades responsáveis pela negociação, homologada em 2016, projetaram que o valor corrigido chegaria a R$ 6,8 bilhões ao final do período. É o segundo acordo de leniência suspenso por determinação de Toffoli. Ele já havia beneficiado a J&F com uma decisão semelhante.
Parte das provas do acordo de leniência da Odebrecht foram anuladas pelo ministro aposentado do STF, Ricardo Lewandowski, com base em mensagens da Operação Spoofing. Ele levou em consideração o julgamento que declarou a suspeição do ex-juiz Sergio Moro e considerou que havia “vícios” nas provas.
80 DENUNCIANTES – Foi a maior delação do Direito Universal. Mais de 80 dirigentes e executivos da empreiteira denunciaram 415 políticos de 26 partidos em seu acordo. Uma das condenações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no caso Sítio de Atibaia, teve como base provas obtidas a partir dos anexos entregues pela Odebrecht.
A empresa afirma que foi vítima de “chantagem institucional” e que a Lava Jato usou técnicas inquisitórias de condução processual. “O acordo, contudo, estabeleceu-se num período da história brasileira marcado pela violação generalizada de diversos direitos fundamentais, capitaneada pela atuação parcial e nitidamente persecutória de determinados agentes do Estado”, alegou no pedido enviado a Toffoli.
Se ficarem comprovados, os argumentos da Odebrecht podem levar à invalidação do acordo. A empresa nega que vá pedir a anulação da leniência e afirma que busca, apenas, a repactuação do valor da multa.
CGU INFLEXÍVEL – A Controladoria-Geral da União (CGU), que gerencia os acordos de leniência, tem sido inflexível diante dos pedidos de repactuação. O órgão afirma que não há margem para a alteração dos valores, apenas de cláusulas sobre prazo e formas de pagamento. Uma das demandas das empresas é pagar parcelas futuras por meio de prejuízo fiscal e de precatórios.
As empresas viram na Operação Spoofing uma brecha possível para a derrocada dos acordos. A investigação prendeu o grupo responsável pela invasão dos celulares de membros da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, incluindo o ex-procurador Deltan Dallagnol, que coordenava o grupo de trabalho, e o ex-juiz e atual senador Sérgio Moro, que foi titular da 13.ª Vara Federal Criminal de Curitiba, berço da investigação. As conversas hackeadas constam como provas da investigação, embora tecnicamente sejam provas ilegais, imprestáveis para uso em juízo..
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Na forma da lei, Toffoli sequer poderia estar atuando nesse processo. Deveria se declarar suspeito, porque seu nome consta na relação das autoridades que recebiam propinas. Lula aparece como “O Amigo”, devido à sua amizade com o empreiteiro Emílio Odebrecht, enquanto Toffoli é listado como “O Amigo do Amigo”. E ainda chamam isso de Justiça. Mas minha ironia não chega a tanto. (C.N.)