Manifestação neste sábado reúne de PT a PSDB, DEM e Novo. Representantes têm discordâncias políticas, mas pedem adesão contra o presidente e em defesa da democracia
Manifestação contra Bolsonaro na avenida Paulista, em 3 de julho.
Por Diogo Magri
São Paulo - A frente ampla formada por lideranças de esquerda e direita que se colocam como oposição ao Governo de Jair Bolsonaro testará outra vez sua união nas ruas neste sábado, dia 2 de outubro. É nesta data que o ato convocado com o mote #ForaBolsonaro reunirá figuras de 21 partidos políticos de diferentes espectros em 167 cidades brasileiras. Em São Paulo, o ato acontece na avenida Paulista. Em comum, representantes dos grupos, que vão do PT, PSDB ao Novo e Podemos, pedirão o impeachment do presidente e a defesa da democracia. Mas o desafio será unificar o discurso entre projetos políticos diferentes, acentuados pela polarização que tomou conta do país durante os últimos anos.
A união entre esquerda, centro e direita é necessária se o objetivo dos partidos é o impeachment de Bolsonaro. Juntos, os 21 partidos representados na manifestação somariam 351 deputados federais na Câmara — o total necessário para a aprovação do processo de impeachment é 342 votos. No entanto, internamente diversas legendas estão em guerra, ou com o pé em duas canoas. Partidos como DEM e PSD também se unem ao protesto, mas ambos têm ministérios no Governo Bolsonaro. O mesmo PSL, por exemplo, tem nomes de oposição ao Governo, como a deputa Joice Hasselman, ao mesmo tempo que abriga o filho do presidente, o deputado Eduardo Bolsonaro , Carla Zambelli e Bia Kicis entre seus parlamentares, fieis escudeiros do presidente.
Já confirmaram também presenças no ato da Paulista nomes dos partidos Cidadania, MDB, PC do B, PDT, PL, Solidariedade, PSB, PSOL, PV, Rede, UP, PCB, PSTU, PCO. Também estarão presentes movimentos populares, como Direitos Já, Frente Brasil Popular, Frente Povo Sem Medo e Coalizão Negra por Direitos.
As centrais sindicais divulgaram uma nota pedindo “ampliação no espectro político”. “Para derrubar Bolsonaro, é preciso ir além do nosso campo. Não é questão de ideologia, mas sim de matemática. Neste momento, é necessário focar no que nos une, e não no que nos separa”, diz a nota assinada por 10 centrais, entre elas CUT, Força Sindical, e CSP-Conlutas.
O professor de gestão de políticas públicas da USP Pablo Ortellado, vê a chance de dar um passo à frente por uma aproximação mais consistente. “O arco de alianças feito para essa manifestação é muito amplo diante do nosso histórico recente de polarização. É um passo firme na direção da concretização da frente ampla”, explica o professor, que estuda protestos de rua em São Paulo. “É algo realmente novo, que me lembra as Diretas Já pelo caráter suprapartidário. Faz sentido que os democratas, mesmo rivais políticos, se unam para defender o país dos ataques que faz um Governo de perfil autoritário”, acrescenta o cientista político Cláudio Couto.
Couto lembra que o apoio popular precisa ser significativo para a abertura de um processo. Nesse sentido, a união também é essencial. Em 7 de setembro, o protesto contra Bolsonaro organizado por partidos de esquerda e centrais sindicais levou cerca de 15.000 pessoas ao Vale do Anhangabaú, centro de São Paulo, nos números da Polícia Militar. O ato “Nem Lula nem Bolsonaro”, chamado por lideranças de centro e direita, levou cerca 6.000 pessoas à Avenida Paulista cinco dias depois. Em comparação, a manifestação golpista pró-Governo mobilizou cerca de 120.000 pessoas na Paulista, em 7 de setembro, segundo números da mesma PM. “Se conseguirem levar muita gente com esse mote da frente ampla, estará provada a possibilidade de diálogo entre diferentes que conseguem cooperar quando a democracia está em jogo”, sustenta o cientista político.
Na opinião de Ivan Valente, deputado federal pelo PSOL-SP, “tudo que conseguirmos somar contra Bolsonaro é positivo”. “Essa amplitude entre os partidos tem uma simbologia muito grande. Mesmo a direita e a centro-direita não conseguem defender a estupidez humana”, pontua o psolista. O parlamentar espera que, mesmo diante das divergências e confrontos recentes —militantes do PCO agrediram integrantes do PSDB em manifestação que realizaram em conjunto no dia 3 de julho—, ele espera um ato pacífico com falas de representantes de diversos espectros políticos. “Até pouco tempo atrás, boa parte da direita estava gritando palavras de ordem fascista. Mas não é hora de fazer cobranças. O que vier para somar na luta pelo impeachment, mesmo que da política ultraliberal, será benéfico”.
Eduardo Barbosa, deputado federal pelo PSDB-MG, vai pelo mesmo caminho. “A união desses partidos pela garantia de preceitos constitucionais já existiu em outros momentos. O que mobiliza esse encontro é a visão truculenta do presidente que traz uma insegurança permanente às instituições”, afirma o tucano. Para ele, a concordância de ideais relacionados aos direitos humanos supera a discordância a respeito do tamanho do Estado em momentos como esse. Barbosa também não vê problemas em caminhar ao lado de quem apoia a candidatura de Lula em 2022, mas deixa claro que o objetivo não é formar uma chapa eleitoral com partidos mais à esquerda. “A discussão não se pauta por uma candidatura e nem é o momento para definir isso”, justifica.
Ao mesmo tempo, unificar manifestações de direita e esquerda é o maior desafio da frente ampla. “As disputas eleitorais complicam a constituição da frente, apesar do caráter ser mais de defesa da constitucionalidade do que de chapa eleitoral”, afirma Ortellado. O embate se dá principalmente em torno da figura de Lula, o presidenciável que está a frente nas eleições de 2022 segundo as pesquisas mais recentes. Ainda assim, o petista não é unanimidade entre quem está se mobilizando para o ato de 2 de outubro —partidos de centro, direita e até de esquerda, como PDT, preferem a terceira via como alternativa a Lula e Bolsonaro. “Pelo menos o fato deles estarem conseguindo conversar já é um avanço”, pontua Claudio Couto.
As estratégias divergentes também enfraqueceriam os protestos. Ortellado lembra que para o ex-presidente Lula, poderia ser mais interessante enfrentar um Bolsonaro enfraquecido nas eleições do ano que vem. Logo, o PT poderia escolher não se mobilizar pelo impeachment em prol da vitória em 2022, o que o afastaria da frente ampla. “Além disso, perder uma disputa eleitoral é muito mais afirmativo do que ser deposto”, acrescenta Couto, “mas não acho que esperar o Bolsonaro derreter signifique não ir às ruas. As manifestações, mesmo que não cheguem no impeachment, irão enfraquecê-lo”, diz. Apoiador de uma candidatura única da esquerda, Valente concorda: “Seria um erro crasso de toda esquerda aliviar para deixar ele sangrar... isso é para quem não conhece o que é o bolsonarismo. O PT não tem como não colocar o bloco na rua”.
O Movimento Brasil Livre (MBL) e o Vem Pra Rua estão entre as poucas entidades que organizaram o ato de 12 de setembro e não estarão na rua em 2 de outubro. Segundo o MBL, a entidade está focada em seu congresso nacional, que ocorre nos dias 19 e 20 de novembro. Já o Vem Pra Rua diz que “a manifestação do dia 2 de outubro está sendo chamada e organizada pelo PT com o mote Fora Bolsonaro mas, infelizmente, será também para promover o candidato Lula, a quem jamais vamos apoiar como opção contra Bolsonaro”.
El País