Publicado em 24 de fevereiro de 2021 por Tribuna da Internet
Carlos Newton
“É simples assim: um manda e o outro obedece”, disse em 22 de outubro o general Eduardo Pazuello ao lado do presidente Jair Bolsonaro, que na véspera desautorizara o ministro da Saúde, ao mandar cancelar o protocolo de intenções de compra de 46 milhões de doses da vacina CoronaVac, anunciado no dia anterior por Pazuello em uma reunião com governadores.
Ao invés de enfrentar o presidente, que estava propositadamente boicotando a compra da vacina pelo simples fato de ter sido desenvolvida na China, o general curvou-se de tal maneira que dissipou qualquer resquício de esperança que os brasileiros pudessem ter nele. Mostrou ser um falso militar, que indevidamente chegou ao generalato e às três estrelas, seu último patamar.
INQUÉRITO CIVIL – Se tivesse assumido uma atitude digna, como seus antecessores no Ministério da Saúde, os médicos Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, o general Eduardo Pazuello estaria hoje em situação muito melhor. Mas preferiu se agarrar ao cargo como um rotundo carrapato verde oliva, não é isso que se espera de um militar de verdade.
O resultado é que, além de ter sua imagem pessoal ridicularizada e devastada pela mídia e pelas redes sociais, agora está submetido a inquéritos de muita gravidade, com o que acaba de ser aberto pela Procuradoria da República do Distrito Federal, para apurar se o ministro da Saúde cometeu improbidade administrativa no combate à Covid-19.
O MPF vai investigar se houve ilegalidade para comprar medicamentos sem eficácia comprovada; a baixa execução orçamentária no combate à Covid; a omissão de providências para suprir a falta de oxigênio em Manaus; e a leniência na compra de vacinas.
DIVERSAS PUNIÇÕES – Esse inquérito civil pode levar sanções como perda da função pública, suspensão de direitos políticos, ressarcimento aos cofres públicos. Em outra frente, a penal, o ministro já é investigado em inquérito aberto no Supremo Tribunal Federal, com outras punições.
Assim, de uma hora para outra, um general ilustre e respeitado passa a ser investigado como um fora-da-lei, e tudo isso acontece somente porque obedeceu a ordens estúpidas e ilegais do presidente da República.
Pazuello errou como civil e também como militar, porque estava protegido pelo Código Penal das Forças Armadas, mas não teve coragem de enfrentar um presidente irresponsável a atrabiliário. Preferiu obedecer a ordens flagrantemente ilegais, agora tudo indica que se tornará réu de processos civil e penal
DIZ O CÓDIGO – A situação é prevista com detalhes no Código Penal Militar, cujo rigor seria mais aplicável ao presidente do que ao ministro:
Art. 38. Não é culpado quem comete o crime: […]
b) em estrita obediência a ordem direta de superior hierárquico, em matéria de serviços.
1° Responde pelo crime o autor da coação ou da ordem.
2° Se a ordem do superior tem por objeto a prática de ato manifestamente criminoso, ou há excesso nos atos ou na forma da execução, é punível também o inferior.
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P.S. – Ao se mirar ao espelho, como no poema de Rubem Braga, o ex-prestigiado general Pazuello certamente passou a se ver “envelhecido e envilecido”. Então, valeu a pena receber esse salário adicional de ministro durante alguns meses? Claro que não. Será esse o preço da dignidade de um oficial-general? Claro que não. Daqui em diante, Eduardo Pazuello jamais será a mesma pessoa de antes? (C.N.)