Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - Estimulado pelo presidente de honra do PMDB, Paes de Andrade, o presidente do partido, deputado Michel Temer, prepara ato de desagravo aos senadores Pedro Simon e Jarbas Vasconcelos, afastados da Comissão de Constituição e Justiça do Senado por iniciativa declarada do líder Waldir Raupp. No caso, iniciativa declarada porque o indigitado líder fez as vezes de marionete. Não foi dele a decisão. É preciso prospectar mais a fundo esse abominável episódio que pune dois dos mais ilibados e competentes representantes do PMDB no Congresso. A quem interessa o crime?
Renan Calheiros jura que nada teve a ver, apesar de alvo permanente dos apelos dos dois senadores para licenciar-se da presidência do Senado. O presidente Lula manda dizer que não se intromete em assuntos da esfera congressual. Mesmo assim, tanto o chefe do governo quanto o senador alagoano surgem como beneficiários da degola. Jarbas e Simon vinham atuando na Comissão de Constituição e Justiça em favor do afastamento de Renan da presidência do Senado e, mais, não faziam segredo de sua oposição à prorrogação da CPMF. Essas serão as causas primeiras da truculência.
O tiro, porém, corre o risco de sair pela culatra. No caso de Renan, cresce no PMDB o sentimento de que deveria mesmo afastar-se. Quanto à CPMF, quem garante que não aumentará o número dos senadores peemedebistas infensos à prorrogação? Fica mal a bancada do PMDB no Senado, exceção dos senadores que, até amanhã, tenham protestado e solidarizado-se com os dois companheiros. São poucos, por enquanto só Garibaldi Alves e Geraldo Mesquita. Certamente também o Mão Santa. E os outros, começando por José Sarney?
Nos demais partidos foi profunda a repercussão da iniciativa da liderança do PMDB. O senador Cristovam Buarque vai sugerir que Pedro Simon e Jarbas Vasconcelos ocupem, na Comissão de Constituição e Justiça, as vagas destinadas ao seu partido, o PDT. O senador Heráclito Fortes, do DEM, recolhe assinaturas entre colegas de outras legendas num ofício destinado a Waldir Raupp, pedindo a reconsideração do afastamento dos dois ex-governadores.
Atrás da mesa do Senado, no plenário, encontra-se o busto de Rui Barbosa. Qualquer dia será trocado pelo do general Pinochet...
Ecos do Supremo
Houve tempo em que o País inteiro entoava a frase mais democrática em muitas décadas: "Todo o Poder ao Judiciário". Era a agonia do Estado Novo, da ditadura de Getúlio Vargas, em outubro de 1945, mas em meio a uma dificuldade dos diabos. Depor o ditador, sim, mas substituí-lo por quem? A Constituição fascista de 1937 suprimira a figura do vice-presidente, e como a Câmara dos Deputados jamais se reuniu, obviamente também não havia presidente da casa, na linha sucessória.
O Senado tinha sido suprimido. Para evitar um general, restava o Supremo Tribunal Federal. Para ele voltaram-se as atenções, empossando-se o ministro José Linhares na presidência da República. Nos estados, assumiram os presidentes dos Tribunais de Justiça. A permanência dos juízes no poder seria curta, apenas os meses de novembro e dezembro de 1945 e janeiro de 1946, quando então seria empossado o presidente eleito. Deu certo a experiência, porque surtiu efeito conselho dado pelos ministros do Supremo ao seu presidente, feito presidente da República:
"Seja simples, não utilize o linguajar jurídico em iniciativas e atos que serão dedicados ao povo inteiro". Linhares ouviu os colegas e até lia, linha por linha, decretos e mensagens que assinava, escoimando dos textos quaisquer excessos dogmáticos e doutrinários sugeridos por auxiliares. Por que se conta essa história?
Porque, apesar de uma decisão mais do que elogiável, quinta-feira, os ministros do Supremo Tribunal Federal exageraram no dogmatismo. Pouca gente reconhecerá, mas quantos acompanharam as citações de juristas estrangeiros e o alinhamento de expressões e conceitos complicadíssimos? Na Câmara, certos deputados que são advogados serviram de tradutores para a imensa maioria, diante dos aparelhos de televisão.
O exemplo de José Linhares parece não ter frutificado, mas também não precisava. O Supremo não estava ocupando o poder. Apenas, preenchendo certas lacunas, como a da fidelidade partidária...
Fonte: Tribuna da Imprensa
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