sábado, setembro 30, 2023

STF não promulgou lei, estabeleceu a inconstitucionalidade do Marco Temporal

Publicado em 30 de setembro de 2023 por Tribuna da Internet

Charge de Mário Adolfo (marioadolfo.com)

Pedro do Coutto

O Supremo Tribunal Temporal por nove votos a dois declarou a inconstitucionalidade do Marco Temporal que envolve a propriedade e ocupação das terras indígenas, o que dá margem, isso sim, à aprovação de uma lei complementar regulando a matéria e reconhecendo direitos, conforme acentuou em seu voto o ministro Alexandre de Moraes, para aqueles que de boa-fé realizaram melhorias nessas áreas.

A matéria neste ponto é complexa, envolvendo, como a própria decisão do STF assinalou, indenizações a serem pagas pela União. Aí, portanto, temos uma janela destinada a um amplo acesso e à uma ampla visão. Mas o problema fundamental não é esse, mas o fato de que o Senado votou equivocadamente um projeto já aprovado pela Câmara em maio propondo a vigência do Marco Temporal, o que restringia as terras indígenas ocupadas até 5 de outubro de 1988, data em que foi promulgada a Constituição Federal.

CONFRONTO – O Senado, na realidade, aprovou uma matéria destinada a debater a decisão do STF, o que não é o caso. O objetivo da votação do Senado é confrontar o STF, destacando sua posição de que legislar é uma competência do Congresso e não do Supremo. Em sua essência, a questão não é essa. Agindo dessa maneira, o Senado desconheceu a declaração de inconstitucionalidade do Marco Temporal e, por isso, provocou uma colisão com o Poder Judiciário.

Na verdade, o que o Senado votou foi um projeto voltado para anular uma declaração de inconstitucionalidade. Absurdo completo que não foi ainda comentado por esse ângulo, mas que é o verdadeiro enfoque de um fato sensível politicamente para o governo em toda a sua extensão.

Na edição de O Globo desta sexta-feira, Sérgio Roxo, Camila Turtelli, Marianna Muniz, Dimitrius Dantas e Fernanda Alves publicaram ampla reportagem sobre a iniciativa do Senado, destacando que o presidente Lula deve vetar o projeto. O veto, como qualquer outro, poderá ser derrubado pelo Legislativo, mas nem o veto, muito menos a hipótese de sua derrubada, funcionam para conter a crise aberta, a meu ver, pela falta de uma perspectiva concreta relativa ao caso.

VETO – É claro que o presidente Lula, recuperado da operação a qual se submeteu ontem, vetará a proposição. Primeiro porque se sancionasse estaria agredindo o Supremo Tribunal Federal. Segundo, porque estaria provocando uma reação enorme por parte dos povos indígenas e tal reação alcançaria repercussão internacional, incluindo também o problema do desmatamento e da expansão de empresas rurais em busca de espaço sempre crescente para a produção agropecuária.

As direções do Senado e da Câmara, com Rodrigo Pacheco e Arthur Lira à frente, devem se reunir com o presidente Lula ou o presidente em exercício Geraldo Alckmin, e também com o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, em busca de um denominador comum capaz de superar, pelo caminho da lógica e do interesse público, o problema criado por uma precipitação difícil de explicar e mais ainda de entender.

COMPETÊNCIA – O que está em questionamento é se o Poder Legislativo tem ou não competência para anular, através de um projeto de lei, uma declaração de inconstitucionalidade do STF. No Supremo, apenas os ministros Nunes Marques e André Mendonça, nomeados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, votaram a favor do Marco Temporal e, provavelmente, foram esses dois votos que propiciaram a frágil concepção de que o Parlamento teria o poder de anular a definição de inconstitucionalidade por parte do Supremo.

A Constituição de 1988 definiu o STF como guardião do texto constitucional do país. Assim, para anular uma declaração de inconstitucionalidade, o Poder Legislativo formado pelo Senado e pela Câmara necessitaria de uma emenda constitucional. Isso, em tese, pois uma emenda fixando tal absurdo teria a sua legitimidade contestada pela Corte Suprema. Não há saída para o problema desencadeado a não ser através de um consenso reparador da votação absurda praticada pelo Senado na quarta-feira.

CEF – Vitória Abel, Lauriberto Pompeu e Renan Monteiro, O Globo de ontem, revelam que o ministro Fernando Haddad encontrou-se com o deputado Arthur Lira, presidente da Câmara, para destravar a aprovação da agenda econômica. O obstáculo originou-se pelo fato de o presidente Lula não ter ainda nomeado a candidata indicada pelo Centrão para a Presidência da Caixa Econômica Federal.

O episódio é incrível e, no O Globo, é comentado também em artigo de Vera Magalhães. Ela destacou o problema do nível que marca boa parte das reivindicações partidárias nos tempos de hoje.

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