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sábado, agosto 28, 2010

Repartindo o pão

Carlos Chagas

Diz o refrão popular que quem parte e reparte fica com a melhor parte. Outro dia o presidente do PMDB, vice-presidente na chapa de Dilma Rousseff, repartiu o pão. Disse aos seus deputados e senadores, num jantar de gala, que o partido não abriria mão do que tem direito, no futuro.

Mais tarde, Temer desmentiu estar o PMDB loteando o governo Dilma. Se alguém pensasse assim estaria enganado e desautorizado. O novo ministério dependerá da presidente, o partido não vão exigir nem impor ministérios. A conclusão a tirar dessa aparente contradição é de que o pão será primeiro repartido no Congresso, nessa refeição inicial da aliança do PMDB com o PT. A chefia e a condução do Executivo será da candidata, se ganhar a eleição, como parece.

Mas o comando do Congresso será deles, peemedebistas, da mesma forma se elegerem as maiores bancadas na Câmara e no Senado. Traduzindo: preparam-se para ocupar as presidências das duas casas. Num caso com Henrique Eduardo Alves. No outro, com José Sarney. Aos companheiros serão oferecidos pedaços de pão, como lugares importantes nas mesas diretoras. Para os partidos menores, migalhas.

Como se trata do café da manhã, será preciso projetar as refeições seguintes, o almoço, o jantar e a ceia. Repartir o pão, claro, mas se Dilma Rousseff fizer o mesmo, ou seja, se abrir para o PMDB vagas no ministério, em troca do apoio para a aprovação dos múltiplos projetos de interesse do futuro governo. Nessa hora valerá até servir pão dormido, prelúdio das negociações. Quanto a saber o seu tamanho e paladar, dependerá do resultado das eleições.

Por que não fizeram?

Uns poucos dias de propaganda eleitoral obrigatória no rádio e na televisão servem para mostrar como a busca de votos aproxima-se do ridículo. Todos prometem tudo, dos candidatos presidenciais aos pretendentes aos governos estaduais, ao Congresso e às Assembléias. Seria cômico se não fosse trágico assistir velhos e moços, homens e mulheres, anunciando escolas, hospitais, estradas, hidrelétricas, transportes coletivos, segurança pública, ascensão social, empregos, distribuição de renda e até felicidade.

Razão mesmo parece ter Plínio de Arruda Sampaio, que em seus curtos segundos de exposição na mídia consegue perguntar em tom hilariante: tiveram dezesseis anos para realizar tudo o que prometem agora e não realizaram. Quem acredita? No caso, a referência é para os oito anos do tucanato de Fernando Henrique e os oito do Lula…

Agora não vai dar

Uma característica do processo político brasileiro é de que, como regra, todo presidente chega ao poder culpando o antecessor pelas dificuldades encontradas. Criticar o passado constitui saída fácil para quem se mostra em dificuldades para enfrentar o futuro. Há exceções, como no caso de Juscelino Kubitschek, mas é bom lembrar que Getúlio Vargas assumiu jogando farpas em Eurico Dutra.

Depois,Café Filho prometeu exorcizar a era Vargas. Aliás, foi o primeiro mas não o último. Jânio Quadros disse o diabo de Juscelino, ainda que estrategicamente pelo rádio, sabendo que levaria um soco na cara se discursasse de corpo presente. João Goulart mandou rever a política econômica e social de Jânio, a quem acusava de desequilibrado.

Dos militares, é bom lembrar que o marechal Castello Branco escreveu ao filho dizendo-se síndico de uma massa falida. Costa e Silva, ao prometer humanizar o governo, atingiu Castello na moleira, ao tempo em que Garrastazu Médici meteu a faca na metade do governo Costa e Silva. Ernesto Geisel referia-se na intimidade de forma pejorativa aos tempos do “milagre brasileiro” de Médici, enquanto João Figueiredo deu o gelo em Geisel.

Com a democratização, mesmo cauteloso enquanto candidato, Tancredo Neves apelidava certos juristas do período militar de “jurilas”, metade gorilas. José Sarney não sossegou até reformar o ministério escolhido por Tancredo e foi ofendido por Fernando Collor, a ponto deste anunciar que mandaria prender aquele. Itamar Franco isolou completamente Fernando Collor, a quem acusava de pecar contra os dez mandamentos. Fernando Henrique, mesmo eleito por obra e graça de Itamar, jamais perdeu uma oportunidade de expô-lo ao ridículo. E quanto ao Lula, por longo tempo lembrou a “herança maldita” recebida do sociólogo.

Essas lembranças vem à tona por conta da impossibilidade técnica de Dilma Rousseff fazer o mesmo diante do antecessor. Ou não?
Fonte: Tribuna da Imprensa

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