Carlos Chagas
Mesmo ficando em casa e trabalhando a meia carga, esta semana, única regalia a que se permitiu depois de encerrado o tratamento de radioterapia, a ministra Dilma Rousseff não perdeu suas características. Continua áspera, sempre disposta a dizer o que pensa com palavras duras e recriminações que não poupam colegas de ministério e altos funcionários do Executivo.
Corria ontem em Brasília que a candidata não gostou nem um pouco de declarações dadas pelo ministro Guido Mantega, a respeito de “se o novo governo eleito ano que vem tentar mudar as diretrizes do presidente Lula, vai apanhar e não vai se agüentar”. Noves fora a previsão inusitada de um golpe de estado, caso escolhido o candidato da oposição, coisa que não terá agradado de jeito nenhum a Dilma, a primeira hipótese terá despertado mais sua irritação. Porque de duas, uma: ou o ministro da Fazenda admite que se ela for eleita, poderá mudar as diretrizes do Lula, ou, mais claramente, trabalha com a vitória de José Serra. Ao que parece, o estrilo da chefe da Casa Civil já chegou ao gabinete do colega.
Só que teve pior. No Ceará, quem aventou a possibilidade de Dilma não se eleger foi o próprio presidente Lula. Em palanques onde pontificaram os discutíveis improvisos de sempre, o chefe do governo disse que o eleitor precisa escolher quem dê continuidade às suas metas, senão estará formado um exército de obras inacabadas “e o bicho vai pegar”. Quer dizer, está em aberto a opção da escolha de alguém que não dê continuidade. Mais grave foi o comentário seguinte, a respeito de o país viver um momento rico, se a disputa ficar entre Dilma Rousseff, Ciro Gomes e Marina Silva., porque os três exprimem a continuidade.
Ora, a candidata do Lula não é a chefe da Casa Civil? Como lembrar os outros dois concorrentes sem enfraquecer a primeira? Estaria o governo preparando o desembarque da candidatura lançada há dois anos? Sinceridade demais em disputas eleitorais nunca deu certo. E Dilma sabe disso…
Internet não ganha eleição
Com todo o respeito à ciência da cibernética e imensos louvores ao avanço tecnológico dos últimos anos, mas é preciso botar os pés no chão. O Senado discutiu acirradamente a liberação da Internet nas campanhas eleitorais. Até o normalmente tranqüilo José Sarney emocionou-se e foi acre na condenação dos que pretendiam censurar esse formidável meio de comunicação mundial.
Só que tem um problema. Dos 180 milhões de eleitores do país, quantos tem acesso á Internet? Pelo menos 100 milhões de brasileiros que votam jamais dedilharam um computador e, muito menos, sabem da possibilidade de comunicar-se fora do telefone. Uma campanha presidencial desenvolvida pela Internet, como parece que será autorizada, jamais influenciará a maioria dos que vão escolher o próximo presidente da República. As elites e a classe média poderão sensibilizar-se por textos favoráveis ou contrários aos candidatos, mas, como regra, já terão muito antes feito suas opções. O eleitor comum não chegará nem perto da Internet, na hora de decidir o seu voto.
Sem frota nem frigoríficos
O governo transformou em ministério a antiga secretaria da Pesca. Desenvolveu-se intensa campanha publicitária para a população comer mais peixe, tendo em vista os irrisórios índices de consumo e o elevado preço do produto.
Sem investimentos maciços na criação de uma eficaz frota pesqueira, e sem frigoríficos espalhados pelas regiões de maior atividade, porém, nada feito. Os telejornais dedicam-se nos últimos dias a mostrar as deficiência no setor, sem esquecer o desperdício. A pergunta que se faz é porque a pesca não vai para a frente, e a resposta, mesmo sob o risco de uma catarata de recriminações neoliberais, é uma só: sem a presença do estado, vamos levar mil anos até que o pescado sirva para alimentar a população. A iniciativa privada, no setor, mostra-se lamentável, de tão fraca. No mar e nos rios, o peixe está á disposição, sem precisar ser tratado, alimentado ou cuidado. Mesmo assim, não o aproveitamos. Não se trata de criar a Peixobrás, mas de estabelecer condições para impulsionar a atividade através da participação maciça do poder público. E se alegarem falta de recursos, que tal os peixes entrarem na corrida pelos recursos do pré-sal? Ou eles não estão acima da camada que esconde o petróleo, tendo portanto o mesmo direito que os estados litorâneos?
Mais um
O senador Cristóvan Buarque inscreveu-se hoje no rol dos pré-candidatos à presidência da República. Da tribuna do Senado, acentuou que se o seu partido, o PDT, indicá-lo, estará à disposição para concorrer com Dilma, Marina, Ciro, Heloísa, Serra e Aécio. Seu diagnóstico é de que com tantos candidatos assim, além de haver perdido o caráter plebiscitário, a sucessão do ano que vem transforma-se numa corrida de competência. Quem apresentar o melhor programa de ação chegará na frente. Claro que a educação é e continuará sendo o carro-chefe de sua campanha, mas, nem por isso, deixará de preparar um elenco amplo das necessidades nacionais e de suas soluções. Aliás, já trabalha nesse projeto há algum tempo.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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