Publicado em 16 de setembro de 2023 por Tribuna da Internet

Vargas foi tolerante com os comunistas que deram o golpe
Wilson Baptista Junior
Com a devida vênia (já que o assunto é tribunal) discordo do editor da Tribuna da Internet quanto à qualificação dos “bagrinhos” que o Supremo Tribunal Federal está condenando. Nos golpes de estado, há os financiadores, os insufladores, mas os executores lá na ponta são muitas vezes as “pessoas simples, de bons antecedentes”, que se deixaram levar pelos radicais.
Gavrilo Princip, que matou o arquiduque Francisco Fernando, herdeiro do Império Austro-Hungaro. e sua mulher em Sarajevo, era um jovem estudante que defendia o nacionalismo sérvio, não muito diferente dos acenadores de bandeiras verde-amarelas que participavam de grupos de WhatsApp e Telegram, pregando e tentando fazer a derrubada das instituições. Longe estava das cúpulas políticas da época. Deu no que deu, milhões de mortos e economias devastadas.
Manso de Paiva, o ex-policial e padeiro que matou o senador Pinheiro Machado, toda a sua vida insistiu que tinha agido sozinho e era um simples patriota que se tinha deixado arrebatar pelo ódio que sentia pelo senador, que não conhecia pessoalmente. Não dá para brincar. O que o editor da Tribuna acha que poderia ter acontecido se Lula, líderes do novo governo ou ministros dos tribunais superiores tivessem estado ao alcance daquelas turbas naqueles momentos?
Não dá para brincar.
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Resposta do editor: EU, VARGAS E A JUSTIÇA
Quase sempre concordo com Wilson Baptista Junior, editor do excelente blog político-cultural “Conversas do Mano”. Quando me preparara para responder a ele, parei para ler o comentário de um leitor também brilhante, que se assina Walsh, que repudiava os aplausos da jornalista Eliane Cantanhêde ao rigor das penas aplicadas pelo Supremo, sob batuta de Alexandre de Moraes.
Disse Walsh: “Vivi para ver repórter defendendo censura, prisões ilegais e julgamentos em grupo. Tudo na maior cara de pau e dizendo-se defensores da democracia. Todo esse monstro que estão alimentando vai se voltar contra a sociedade, inclusive estes ditos repórteres. Amanhã haverá por todo o Brasil juízes prendendo pessoas por ‘crimes de multidão’ e aí eu quero ver o que jornalistas como essa Cantanhêde vão dizer”.
INTENTONA COMUNISTA – Essa reflexão de Walsh trouxe lembranças de minha família, relacionadas ao golpe de 1935. Quando houve a chamada Intentona Comunista, a rebelião começou em Natal, os comunistas destituíram o governador e ficaram no poder por três dias. Debelado o golpe, o presidente Getúlio Vargas procurou um político do Rio Grande do Norte e pediu-lhe uma indicação.
Vargas não queria que houve vingança contra os comunistas, mas não confiava nos juízes de Natal, porque o bajulavam demais, certamente iriam aplicar rigor excessivo, pensando em agradar o presidente. “Você conhece algum advogado que seja independente e capaz de julgar os revoltosos sem excessos?”, perguntou Vargas.
“Conheço, mas é seu inimigo e faz política contra você”, respondeu o interlocutor.
VARGAS ACEITOU – “Não faz mal. O importante é que não haja vingança contra os comunistas”, disse Vargas, que mandou nomear como juiz federal meu avô paterno, Manuel Quirino de Azevedo Maia. Ele cumpriu bem a missão. Puniu sem excessivo rigor os comunistas e pacificou a política local, mas continuou fazendo oposição a Vargas.
O presidente ficou furioso e se vingou, transferindo meu avô para ocupar um posto que significava uma grande punição. E lá se foi meu avô, com a mulher e um montão de filhos, para morar no inóspito vilarejo de Rio Branco e conduzir a única vara federal no Território do Acre, lá do outro lado do Brasil, em plena selva amazônica. Quirino Maia o único juiz existente naquela parte do país. O mais próximo dele estava em Manaus, a milhares de quilômetros, e o único meio de transporte eram as gaiolas e barcas que subiam penosamente o rio-mar.
Duas décadas depois, Juscelino Kubitschek foi além e perdoou os rebeldes de Jacareacanga e Aragarças. Mas agora, já no Século XXI, assiste-se a esse massacre de falsos terroristas.
É MUITA INJUSTIÇA – São condenações sem nenhuma prova material, para punir quem foi iludido pelos verdadeiros terroristas. Sabemos que os principais idealizadores e financiadores do golpe contra Lula jamais serão punidos. Um ou outro empresário desconhecido, talvez, para servir de exemplo.
Mas os que se organizaram em quadrilha e arquitetaram o plano de montar acampamentos nos quartéis, todos escaparão incólumes. Os generais que permitiram a bagunça diante das unidades e assim deram claramente a entender que estariam ao lado dos revoltosos, também esses militares jamais cumprirão pena.
É diante dessa indesmentível realidade que não aceito e jamais aceitarei essa Justiça primária e vingativa, que pretende dar implacáveis exemplos, ao invés de ministrar elucidativas lições. Vargas se vingou de meu avô, mas não tenho raiva dele. Acho que foi um grande presidente, pois muito realizou e não desviou um só centavo dos cofres públicos.