Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA – Nos idos do governo Garrastazu Médici, aquele do “milagre brasileiro”, era proibido divulgar que a inflação havia ultrapassado 12% ao ano. Implacável, a censura impunha o patamar máximo e quem o ultrapassasse era processado pela Lei de Segurança Nacional. O diabo era quando o cidadão comum ia à feira ou ao supermercado, porque os preços se multiplicavam. No início dos anos setenta, a inflação real encostava-se aos 40%, mas como seria preso por subversão quem protestasse, o remédio foi durante muito tempo aceitar os índices oficiais.
O tempo passou, a censura também, mas a moda pegou, ainda que mais sofisticada. Ninguém será processado e preso por contestar a informação do governo de que a inflação beira os 4%. Pelo contrário, a popularidade de Lula torna esse percentual verdade absoluta.
Só que tem um problema: quem faz compras toda semana sente a diferença. Do feijão ao tomate, da manteiga ao sabão, em um ano tudo dobrou de preço. Só os salários não sobem, depois da desindexação canhestra promovida desde o governo do sociólogo. Contestarão os economistas ser necessário tirar a média de tudo, porque, afinal, o uísque importado até caiu, assim como os perfumes franceses, os carros zero quilômetro e o caviar.
Estamos sendo enganados pelo governo dos trabalhadores, como fomos pelo governo dos generais. Claro que sem constrangimentos nem risco à nossa saúde, mas o resultado é o mesmo. Como idêntico parece o comportamento da mídia, exaltando os números fajutos dos detentores do poder. Apesar de tudo, prevalecerá a natureza das coisas, ou dos produtos à venda nas prateleiras.
Sobre a falência individual
Nos Estados Unidos, um milhão de cidadãos declararam falência. A lei permite, lá em cima, direitos iguais para indivíduos e para empresas. Se estas andam mal, não conseguem cumprir compromissos e tornam-se insolventes vão à falência. O mesmo para as pessoas físicas: quando endividadas sem possibilidade de saldar seus débitos, dirigem-se aos tribunais e pedem a falência individual. Uma vez aceita a petição valem-se de certos benefícios, ainda que proibido o calote, capaz de dar cadeia.
Pois é. A crise econômica parece universal. O papel dos governos é administrá-la, utilizando recursos públicos para tentar manter as empresas funcionando, diminuindo o desemprego. Só que o cidadão comum, por aqui, continua discriminado. Não pode pedir falência ou, muito menos, valer-se da ajuda do poder público.
Dias atrás, o governo modificou o sistema de alíquotas do imposto de renda, beneficiando o contribuinte, que poderá recolher um pouquinho menos quando fizer sua declaração. O problema, porém, permanece o mesmo: se o Zé Mané ia pagar mil e agora pagará novecentos, qual a diferença, já que não tem nem novecentos nem mil? O fisco continuará implacável, aliviando apenas as empresas falidas...
Júlio II e Tancredo II - Foi fantástica a contribuição dos Papas durante o Renascimento, importando menos o comportamento pessoal de alguns. Gênios como Leonardo, Michelangelo, Rafael e Bernini teriam desaparecido na História, sem o patrocínio dos chefes da Cristandade. Julio II insere-se entre os maiores, porque, além de general e guerreiro, foi responsável pela pintura no teto da Capela Sistina e pelas estruturas da basílica de São Pedro.
Ressalte-se agora, quinhentos anos depois, um detalhe digno de registro. Estudiosos da crônica do Vaticano pesquisaram a relação dos papas, desde São Pedro, não encontrando nenhum Júlio I capaz de justificar o Júlio II. A explicação beira as raias da megalomania renascentista e foi dada pelo próprio, pouco antes de morrer. Em Roma já havia um Júlio I, o César, antes mesmo do nascimento de Cristo. Assim, eleito papa, o cardeal De La Rovere autodenominou-se Júlio II, imaginando igualar-se ao antecessor...
Porque se conta essa história? Porque tem gente querendo chegar à presidência da República mudando de nome. Seria o Tancredo II. Já existe até um candidato a Michelangelo, ávido de pintar o Menino Maluquinho no teto do palácio do Planalto...
Articulam-se os governadores
Articulam-se os governadores, à espera da definição do dia em que virão a Brasília, provavelmente no final do mês, convocados pelo presidente Lula. Do Nordeste, surgem sinais de que os governadores da região devem promover reunião preliminar em Recife, senão para falarem um só idioma na capital federal, ao menos para não dar a impressão de terem construído uma Torre de Babel.
Imagina-se que também no Sudeste possa haver essa espécie de entendimento, porque José Serra, Aécio Neves e Sergio Cabral têm-se telefonado muito, desde a passagem do ano, e não terá sido apenas para desejarem felicidades mútuas.
Deve tomar cuidado o presidente Lula, se pretende abrir o encontro recomendando aos governadores que passem a gastar ainda mais. Só se o governo federal patrocinar a gastança...
Fonte: Tribuna da Imprensa
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