Bolsonaro se comporta como se estivesse no melhor dos mundos
Carlos Newton
Com seis meses, o governo ainda acha prematuro ser avaliado, mas o presidente Jair Bolsonaro não considera cedo para falar em reeleição. Já tocou no assunto várias vezes. Agora, arranjou uma justificativa. Como sabe que o Congresso não fará a reforma política, porque nenhum grupo social entrega poder voluntariamente, Bolsonaro então passou a dizer que só abrirá mão da reeleição se o Brasil passar por uma séria reforma política.
“Agora, se não tiver uma boa reforma política e o povo quiser, estamos aí para continuar mais quatro anos”, confirma.
NOVA CAMPANHA – Em tradução simultânea, Bolsonaro já está em campanha. É impressionante, e a impressão que Bolsonaro sugere é de deslumbramento com o cargo.
Se tivesse lido “Cândido ou O Otimismo”, obra-prima de Voltaire, o presidente conheceria um dos personagens principais, o professor Plangloss, conselheiro de Cândido, que era o otimismo em pessoa, arranjava sempre uma maneira de transformar um fato negativo em uma hipótese positiva, para concluir que estava “no melhor dos mundos”.
REALISTA ESPERANÇOSO – Infelizmente, o mundo não é assim. Na definição genial do escritor Ariano Suassuna: “O otimista é um tolo. O pessimista, um chato, Bom mesmo é ser um realista esperançoso”.
Na correria da vida moderna, o tempo voa e não há margem para esperanças delirantes, diante de uma realidade implacável, que bate à porta de cada um.
Bolsonaro é a alegria em pessoa na Presidência, parece em eterna campanha política, querendo resolver problemas transcendentais, como a tomada elétrica de três bicos os radares nas rodovias e a duração da carteira de habilitação. Mas fazem parte do Plano A, que mira a reeleição.
SEM PLANO B – Bolsonaro se comporta como se sua função fosse apenas nomear os ministros, e cada um que se vire como pode, para resolver os problemas do respectivo setor, enquanto o presidente viaja pelo Brasil e pelo mundo, em lua-de-mel com a política, sem perceber que lhe falta o Plano B, para tirar o país da recessão.
Até agora, nada se fez a esse respeito. Basta lembrar essa confissão do ministro Paulo Guedes, em audiência recente na Câmara. Segundo o jornalista Alberto Bombig, do Estadão, ao rebater comentários de que a economia não responde, disse o ministro: “Responder a quê? O que nós fizemos para ela crescer?”
Realmente, até agora, há apenas a tentativa de reforma da Previdência, sem nenhuma outra providência para reativar a economia.
PLANO LESSA/DARC – No primeiro governo Lula, não existia programa econômico. Empossados no BNDES como presidente e vice, Carlos Lessa e Darc Costa (que passara 13 anos na Escola Superior de Guerra estudando o país), criaram seu próprio Plano B, incentivaram setores estratégicos da economia e popularizaram o Cartão BNDES, com juros baixíssimos, para financiar a expansão de micros, pequenas e médias empresas.
Usando o BNDESPar, Lessa e Darc evitaram a desnacionalização da Vale e tomaram muitas outras medidas importantes. O país deslanchou, e quando Lula entregou o poder, oito anos depois, o PIB tinha subido 4,75% 2010.
Agora, na gestão Bolsonaro, chega-se a seis meses de governo sem qualquer medida na área econômica. Guedes é esforçado, mas nada entende de macroeconomia, não sabe o que fazer. Seu prazo de validade está quase vencido. O prazo de Bolsonaro também está correndo rápido, mas ele não percebe.
###
P.S.1 – Bolsonaro é tão desligado que chega a ponto de dizer a seguinte pérola: “Quem cria emprego não é o presidente, é a iniciativa privada. Nós queremos que, uma vez que os empreendedores tenham confiança em nós, eles invistam”, filosofou o chefe do governo.
P.S 2 – Ao invés de fazerem o BNDES incentivar a recuperação da indústria e a retomada da economia, como Carlos Lessa ensinou, para aumentar o comércio potencialmente gigantesco com a União Europeia, Bolsonaro e Guedes desprezam a importância do banco de fomento. No momento, ao invés de se preocupar em diminuir a dívida pública, o plano econômico genial de Guedes é usar o BNDES para vender as estatais lucrativas. Genial, diríamos ou bestial, como diriam os portugueses. (C.N.)