Julia Chaib e Renato Machado
Adversários políticos, o presidente Lula (PT) e o governador Eduardo Leite (PSDB-RS) estabeleceram uma trégua para articular respostas à tragédia que assola o Rio Grande do Sul e se blindar de críticas por omissão ou uso eleitoreiro do caso. A ação conjunta em algumas frentes tenta mostrar à população que a reação à catástrofe deve se sobrepor à disputa política.
Essa aparente união não significa, porém, um alinhamento. Nos bastidores, pessoas próximas do presidente criticam o discurso do governador e vice-versa.
RELAÇÃO TRANQUILA – Os dois lados buscam minimizar publicamente eventuais divergências e disputas. “Está muito bem a relação, muito tranquila e cordial, trabalhando junto em todas as frentes”, afirma Paulo Pimenta, ministro da Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência).
Outros integrantes do Planalto reclamam, entretanto, que Leite não costuma mencionar o nome de Lula nas suas entrevistas, quando o chefe do Executivo não está no estado, e cobra demais do governo publicamente.
Já os aliados do gaúcho dizem enxergar uma postura mais centralizadora do governo federal, em particular nas ações destinadas ao segundo momento, a reconstrução do estado. Dizem sentir uma preocupação em não “catapultar” Leite.
LULA DEMOROU – O PSDB divulgou uma nota reclamando da demora de Lula para viajar ao Rio Grande do Sul. O presidente foi ao estado dois dias depois de Leite pedir ajuda federal.
Correligionários do governador dizem que, sem a ajuda da União, será impossível para o Rio Grande do Sul se reconstruir. O estado enfrenta um problema fiscal histórico, piorado pela tragédia.
A visão geral de aliados de Leite é que o governo federal não está poupando esforços e vem adotando todas as medidas emergenciais necessárias nesse momento, em particular para as ações de resgate e salvamento. No entanto, reclamam que algumas necessidades têm sido relegadas, em particular apoio com medidas legislativas que dariam mais poder para o estado atuar no momento de crise.
REAPROXIMAÇÃO – Um aliado de Lula aponta até que a situação pode favorecer o presidente, pela oportunidade de aproximação com os gaúchos. A maioria da população do Rio Grande do Sul votou em Jair Bolsonaro (PL) na última eleição presidencial.
O presidente, inclusive, reclamou com seus auxiliares das duas visitas que fez ao estado. Na primeira delas, foi a Santa Maria e depois sobrevoou as áreas alagadas, mas teve reuniões só com políticos.
Na outra, o presidente voltou ao estado com uma comitiva de ministros e com os presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Eles sobrevoaram a capital gaúcha ao lado de Leite. O petista, porém, esperava ter visitado abrigos ou interagido com a população para demonstrar solidariedade, segundo um assessor do Planalto.
JANJA EM AÇÃO – Quem ficou com esse papel foi a primeira-dama, Rosângela da Silva, a Janja. Na última semana, ela viajou ao estado para levar donativos e visitar abrigos.
Nesta semana, um dia após anunciar um pacote de ajuda ao estado, Lula viajou ao Nordeste para inaugurar obras e retomar uma agenda positiva, em meio à tragédia. O presidente passou dois dias na região.
O chefe do Executivo, dizem seus aliados, quer mostrar que segue governando para todo o país, embora a prioridade do governo seja agora o Rio Grande do Sul.