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sábado, abril 30, 2022

O que era ruim ficou pior - Editorial

 




Aprovação do Auxílio Brasil referenda uma política malfeita, que retirou as contrapartidas sociais do Bolsa Família

A aprovação do Auxílio Brasil pela Câmara vai tornar permanente um programa pretensamente social eivado de interesses eleitorais desde sua concepção. Como tudo no governo Jair Bolsonaro, ele expõe um misto de improviso, irresponsabilidade e má-fé. É a perfeita representação da mesquinhez política do Centrão, que não vê pessoas, somente votos, e explora a pobreza de uma forma que parecia a caminho da superação na história do País.

Pretexto para mudar a Constituição e destroçar o teto de gastos, detestado pelos populistas, o Auxílio Brasil abriu espaço para referendar um calote nos precatórios, aumentar o espaço das emendas de relator, elevar o fundo eleitoral e reservar recursos para reajuste de servidores. Para tornar permanente o benefício – composto por uma parcela fixa e outra temporária, que acabaria no fim deste ano –, o governo usou de mais uma manobra. Um parecer jurídico dispensou a necessidade de fonte de compensação para assegurar o piso mínimo de R$ 400 e livrou o Executivo dos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O texto, relatado pelo também pré-candidato e ex-ministro da Cidadania João Roma (PL-BA), não deve passar por dificuldades no Senado. Ninguém no Congresso quer o ônus de barrar um programa social em ano eleitoral.

A combinação perversa entre desempenho econômico pífio, desemprego consistente e inflação elevada trouxe de volta a fome a quase 20 milhões de brasileiros. As principais cidades do País estão tomadas por barracas habitadas por famílias inteiras; em vez de estarem na escola, crianças pedem dinheiro nos semáforos e comida na entrada dos mercados. A situação é grave e demanda solução, mas ela não virá por meio do Auxílio Brasil, a despeito dos quase R$ 89 bilhões que o programa consumirá neste ano.

Certamente havia espaço para aprimorar o Bolsa Família e corrigir suas falhas. Aumentar o valor do benefício era uma necessidade urgente, agravada pelo avanço dos preços de todos os itens básicos. Mas qualquer política de transferência de renda deve ter foco e eficiência para trazer resultado. É evidente que o correto seria pagar mais aos mais necessitados, e não tratar as famílias da mesma forma demagógica, fixando um piso de R$ 400 para todas, independentemente de sua composição. Contribuições como a Lei de Responsabilidade Social, do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), não foram sequer consideradas no debate.

Criticado por todos os especialistas, o Auxílio Brasil retirou talvez a melhor parte do Bolsa Família: as contrapartidas. Sob pena de suspensão dos pagamentos, os beneficiários tinham obrigações claras com seus filhos, como frequência escolar mínima e cumprimento do calendário de vacinação infantil. O acesso à educação e à saúde, ainda que precário, é fundamental para garantir dignidade e viabilizar uma porta de saída para a situação de extrema pobreza. Mas, como bem sabe Bolsonaro, as crianças não votam. A prioridade do Ministério da Cidadania, agora, é substituir os cartões do Bolsa Família por outros com o novo nome do programa, um capricho que custará R$ 670 milhões.

O Estado de São Paulo

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