Barragem estava completamente seca em julho, sem o menor risco, e até crescia vegetação nela
Pedro JacobiPortal do Geólogo
Na sexta-feira dia 25 de janeiro, as 13:27 horas rompeu a barragem de rejeitos da Mineradora Vale, na Mina do Córrego do Feijão. Estava concretizado mais um mega acidente envolvendo uma barragem de rejeitos de mineração. Neste caso o desastre destruiu, em minutos, centenas de vidas, propriedades, quilômetros quadrados de campos e matas e, naturalmente, a reputação da maior empresa de mineração do Brasil.
A Vale, reincidente, tentou, como sempre, minimizar o impacto que a lama havia causado. No entanto, o Desastre de Brumadinho, ao contrário de Mariana há três anos em outra mina da mesma Vale, terá um impacto maior e mais profundo que qualquer outro acidente similar na história do Brasil.
OS CULPADOS – Existem dezenas de mortos e centenas de desaparecidos que clamam por justiça. E, pelo que já estamos vendo, a justiça vai chegar, bem antes do que costuma. Mas, o importante não é a velocidade da justiça, mas sim a qualidade da investigação. Temos que punir os culpados, só os culpados.
As perguntas que irão ajudar nesta busca por justiça passam por:
- Como uma barragem de rejeitos, abandonada, seca e estabilizada se rompe causando uma onda arrasadora de lama que mata e destrói?
- O que causou essa instabilidade?
- De onde veio a água necessária para liquefazer o rejeito?
- Por que as inspeções feitas poucos meses atrás não constataram o perigo iminente?
- A mineradora Vale estava reprocessando os rejeitos na época do rompimento?
Por incrível que pareça as respostas não parecem ser assim tão simples.
IMAGENS REVELADORAS – Numa imagem de 28 de julho de 2018, o que se vê é uma barragem seca, íntegra e totalmente estabilizada. Não se percebe nenhuma rachadura nas paredes e, mais ainda, não existem sinais de encharcamento e infiltração de água. A superfície está parcialmente coberta por vegetação e não se percebe nenhum lago de água remanescente, o que atesta, mais uma vez, que a barragem e os seus 14 milhões de metros cúbicos de rejeito, estavam secos nesta época.
Um mês antes desta imagem, em junho de 2018, os engenheiros da Tüv Süd Brasil, contratada pela Vale para verificar a integridade da barragem, fizeram um laudo de que a barragem não tinha risco de rompimento. Hoje estes engenheiros estão presos, acusados de responsabilidade criminal pelo rompimento da barragem.
SÃO INOCENTES – É óbvio, para qualquer um que tenha um mínimo conhecimento do assunto, que as pessoas que assinaram o laudo de junho de 2018 não podem ser responsabilizadas por este laudo.
Em julho de 2018 o que se vê claramente é que a barragem estava íntegra. Já na segunda imagem, do dia 25 de janeiro de 2019, o que se vê é o caos. A barragem rompeu deixando um rastro de destruição e morte: e muita lama.
Nas imagens percebe-se, de forma clara e incontestável, que a quantidade de água misturada ao rejeito é simplesmente enorme. Como explicar essa quantidade de água em uma barragem em descomissionamento? De onde veio esta água? Da chuva? Ou será que ela foi introduzida pela mineradora para que o rejeito pudesse ser bombeado e reprocessado?
É aqui que começam as conjeturas e as teorias da conspiração. Mas, seja qual for a explicação, é óbvio que um fator decisivo foi introduzido nesta equação causando o acidente.
PRESSÃO DA ÁGUA – Sabemos que para uma barragem romper é necessário uma gigantesca pressão hidrostática aliada a falhas estruturais como rachaduras e infiltrações o que leva ao súbito colapso dos diques de contenção.
Nesta equação o percentual de água da lama é o parâmetro mais importante e determinante. Sem água não há pressão hidrostática e não há viscosidade para que a lama possa fluir como um líquido atingindo grandes velocidades e viajando grandes distâncias.
Sem a água não teríamos as mortes.
MINA REATIVADA – O que sabemos é pouco, mas alguns entrevistados pela mídia falam em “trincas” que “todo mundo sabia”. Me informaram que a Vale estava “começando a lavrar” os rejeitos e que ela “havia recebido uma licença há um mês”. Outros dizem que em dezembro, a Vale recebeu as licenças para reprocessar os rejeitos dessa barragem. Isso pode significar que existia uma atividade recente de lavra que pode ter, de alguma forma, afetado a instabilidade da barragem causando o rompimento.
A verdade? Essa talvez venha à tona ao longo das investigações. Ou talvez, como é comum em casos semelhantes, nunca saberemos a verdade.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – O artigo enviado pelo geólogo Ricardo Sales, sempre presente aqui na “Tribuna”, mostra que não há mais dúvida. A Vale voltou a canalizar a água do Córrego do Feijão para a barragem, para facilitar o reaproveitamento dos rejeitos. Como diz o revelador artigo, sem água não haveria o rompimento da barragem. Mas quem se interessa? (C.N.)