
Margareth Menezes confirma a politização dos comitês
Vinícius Valfré
Estadão
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criou comitês de cultura nos 26 Estados para fomentar e mobilizar artistas através de ONGs criadas por manifestantes petistas ou por servidores do próprio Ministério da Cultura (Minc), ao custo de R$ 58,8 milhões por dois anos. A estrutura, prometida ainda na pré-campanha de 2022, acabou servindo para fins políticos e eleitorais. Esses comitês de cultura, criados nos estados, são ligados a uma outra estrutura político-partidária igualmente montada pelo atual governo, os escritórios regionais do Ministério da Cultura. Essas “filiais” da pasta nos Estados também foram distribuídas a militantes partidários.
Como mostrou o Estadão, o Programa Nacional de Comitês de Cultura (PNCC) é contaminado por essa ligação direta com filiados ao Partido dos Trabalhadores e com ONGs ligadas a atividades partidárias e campanhas eleitorais. E há até organizações ligadas a servidores do ministério.
MINC CONFIRMA – Em nota oficial, o Ministério da Cultura confirmou a denúncia, mas alegou que não existe impedimento a ONGs dirigidas por militantes partidários ligados ao governo, “desde que não envolvam membros de Poder ou servidores públicos responsáveis pelo edital”.
A pasta conduzida pela cantora baiana Margareth Menezes também acrescentou que, ao contrário, o “modelo do PNCC fortalece o controle social e a fiscalização cidadã, afastando riscos de instrumentalização partidária”, e que não há problema na escolha de entidades ligadas a candidatos ou a pessoas filiadas a partidos.
Entenda a polêmica dos comitês de cultura do governo Lula ligados ao PT, que consomem R$ 58,8 milhões em dois anos:
1) Dos 26 escritórios regionais, 19 são coordenados por membros do PT, um por filiado ao PSB e outro é de integrante do PSOL.
2) No Paraná, por exemplo, a ONG escolhida para coordenar o comitê de cultura é a Soylocoporti. Ela é de João Paulo Mehl, candidato a vereador pelo PT em Curitiba, no ano passado. Ele é considerado um articulador de movimentos governistas.
3) As atividades do comitê paranaense ocorrem em torno do Terraço Verde, um projeto de João Paulo Mehl que também funciona como braço cultural de seu grupo político. O espaço serviu para atividades da campanha eleitoral dele. Em dois anos, a Soylocoporti receberá R$ 2,6 milhões.
4) A chefe da filial do ministério no Paraná, Loana Campos, é uma aliada de longa data de Mehl. Eles apagaram registros das redes sociais depois da reportagem do Estadão.
5) A ministra Margareth Menezes foi pessoalmente ao Paraná fazer o lançamento do comitê de João Paulo Mehl, em junho de 2024, às vésperas da campanha eleitoral. O ato contou com um evento na rua no qual o pré-candidato apareceu em destaque ao lado da chefe do ministério.
6) A escolhida pelo ministério para fazer a coordenação do comitê do Amazonas é a ONG Instituto de Articulação de Juventude da Amazônia (Iaja). A entidade foi fundada por Anne Moura, secretária nacional de Mulheres do PT, que mantém influência sobre a ONG e disputou a eleição de 2024 para vereadora de Manaus.
7) Anne Moura foi gravada dizendo que a entidade precisava atuar em benefício da campanha dela a vereadora de Manaus e que essa função eleitoral tinha o aval da cúpula do Ministério da Cultura.
8) Anne Moura realizou evento partidário, com filiações, no mesmo endereço onde funciona a ONG Iaja, que ela criou em Manaus e que coordena o comitê de cultura do Amazonas.
9) Uma emenda parlamentar enviada para a ONG Iaja por um deputado estadual do PT no Amazonas não foi usada para escolas que seriam contempladas com projeto cultural, mas chegou à presidente da escola de samba de Manaus que homenageou Anne Moura em fevereiro do ano eleitoral.
10) No Rio Grande do Norte, a ONG coordenadora do comitê de Cultura é a Associação Grupo de Teatro Facetas, Mutretas e Outras Histórias, de Rodrigo Bico. A entidade vai receber, até o final do programa, R$ 1,7 milhão. Ele foi candidato a vereador em Natal pelo PT, em 2020. Em 2024, atuou fortemente na campanha de Natália Bonavides (PT) à prefeitura da capital potiguar.