Carlos Newton
Atuar em política no Brasil, mesmo que seja como jornalista, apenas fazendo a cobertura dos acontecimentos, tornou-se uma atividade ultrajante e depressiva. De repente, é como se o Brasil tivesse virado de cabeça para baixo (ou “ponta-cabeça, como dizem os paulistas). As instituições está destrambelhadas, as regras de Montesquieu para a independência dos três Poderes caíram no esquecimento, é muito triste acompanhar o noticiário.
Criou-se um “novo normal” totalmente absurdo, que jamais deverá ser assimilado pelos adolescentes e universitários, pois o país precisará que as novas gerações o tirem desse retrocesso jurídico verdadeiramente medieval.
EXCEÇÃO NA ONU – Como explicar a um acadêmico de Direito que o Brasil andou para trás e se tornou o único dos 193 países da ONU que não prende criminosos após condenação em segunda instância?
“Mas não foi para obedecer à Constituição”, indagaria o estudante. E a resposta não seria nada democrática. “Sim, mas havia um erro na Constituição, que caberia ao Supremo corrigir ao interpretar o dispositivo, mas a maioria dos ministros resolveu que o erro deveria prevalecer, para poder soltar Lula, o que provocou também a libertação de outros milhares de criminosos...”
“Mas isso está errado!”, retrucaria o acadêmico. E o professor concordaria: “Claro que sim. Mas foi o jeito encontrado para libertar Lula. Foi por isso que o Brasil se tornou o único país da ONU a garantir essa impunidade até trânsito em julgado na quarta instância, sendo que a maioria das nações tem apenas três instâncias. Apenas o procurador-geral Augusto Aras poderia recorrer, mas ele não o fez”.
O ESTUDANTE INSISTE – “Mas por que soltar Lula?”. E o professor responderia: “Porque o Supremo e as elites não gostaram do comportamento extravagante do presidente Bolsonaro e ficaram com medo dele se reeleger.”
É claro que o estudante ficaria decepcionadíssimo com essa explicação, embora seja absolutamente verdadeira. Mas o pior viria depois. “Para que Lula pudesse ser candidato, o ministro Edson Fachin ‘inventou’ que as condenações tinham se ser anuladas, porque Lula morava em Brasília na época dos crimes cometidos, mas fora julgado em Curitiba, como todos os demais réus da Operação Lava Jato”.
“Mas ninguém recorreu?”, perguntaria o estudante, estupefato. “Na forma da lei, só quem poderia recorrer era o procurador-geral Augusto Aras, mas ficou quieto, porque a solução interessava ao presidente a quem ele servia, e Bolsonaro achava que derrotaria Lula facilmente”, seria a resposta do professor.
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P.S. 1 – Em tradução simultânea, a culpa pela libertação de Lula deve ser dividida entre o Supremo, o procurador Aras e o presidente Bolsonaro. Se não tivesse havido essa armação no STF, Lula não seria candidato e a terceira via teria derrotado Bolsonaro facilmente, com apoio do PT.
P.S. 2 – É isso que vai constar nos livros de História e de Direito. Em mais alguns anos, o Supremo terá de rever seu vexaminoso julgamento, voltando a determinar prisão após segunda instância, como os demais 192 países da ONU. Os brasileiros realmente não merecem continuar passando essa vergonha de o país ser considerado o paraíso dos criminosos, como se diz no resto do mundo. Mas quem se interessa? (C.N.)