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sábado, julho 30, 2022

Cresce o apoio a ato de repúdio a ameaças de Bolsonaro - Editorial




Manifestações da sociedade civil são um remédio vigoroso contra aventuras liberticidas

A democracia brasileira corre riscos com a intensificação da campanha do presidente Jair Bolsonaro contra urnas eletrônicas, Tribunal Superior Eleitoral e Supremo Tribunal Federal. A ação do presidente teve um de seus pontos mais relevantes e lamentáveis na reunião que promoveu com embaixadores de várias nações, na qual colocou sob suspeita o próprio sistema que o permitiu chegar ao Palácio do Planalto. O ridículo dessa atitude surreal não encobre o fato de que Bolsonaro tenha feito um aviso prévio ao mundo de que não se conformará se esse sistema não for mudado - e não deverá ser, segundo as instituições envolvidas. Os embaixadores entraram no encontro mudos e saíram calados - e alguns, estupefatos.

A reação às ameaças presidenciais também subiu de tom, com a preparação de uma carta-manifesto em defesa da democracia e do sistema eleitoral a ser lido em ato público na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo no dia 11 de agosto. Em um par de dias, 300 mil pessoas a assinaram.

Mas a preparação contra jogadas autoritárias do presidente, que repetirá em 7 de setembro seus ataques ao sistema eleitoral e ao Supremo, convocando seus adeptos “pela última vez”, provou uma resposta de um setor que historicamente preferiu a discrição, com raras exceções: entidades empresariais e do setor financeiro. Mais ainda, trouxe a rara concordância das centrais sindicais com as patronais no apoio à manifestação.

A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) decidiu aderir ao chamado da carta e realizar uma manifestação no mesmo dia, em separado. A atitude contagiou outra entidade de peso, a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), que, por maioria, decidiu aderir ao manifesto público em defesa da democracia. Bolsonaro atingiu o nervo sensível da prática democrática e atraiu contra suas atitudes alguns setores que no campo econômico eventualmente o apoiam. Como explicou o jurista Carlos Sundfeld, um dos articuladores: “Há signatários que aprovam algumas políticas deste governo, mas querem respeito à justiça eleitoral”. (Valor, 27 de julho). “Não se trata de uma manifestação antigoverno, mas contra uma ameaça inaceitável de quebra da institucionalidade”.

Durante quase quatro anos, Bolsonaro governou praticamente sem oposição, mesmo assim com resultados desastrosos para o país. No fim de seu primeiro mandato, conseguiu manter ao seu lado os esbirros do Centrão, que comandam a articulação política do Planalto e a presidência da Câmara. Conseguiu o feito de estimular o surgimento de manifestações suprapartidárias de descontentamento, cujo mínimo denominador comum é a democracia e o respeito aos resultados das urnas eletrônicas, sistema sobre o qual sequer pairou uma única dúvida séria em três décadas.

Além do despertar de um vigor cívico que parecia adormecido, a manifestação da sociedade civil, de empresários, banqueiros e sindicalistas tem um poder não negligenciável de influência, importante para demover os adeptos de totalitarismos e os saudosistas da ditadura militar. Ela limita o apoio que o presidente possa receber em seus devaneios de continuísmo. O presidente pode até se iludir de que conta com o apoio de muito mais gente do que os fanáticos que o apoiam com entusiasmo. O manifesto da sociedade civil indica que a adesão ao rompimento institucional é limitado às franjas radicais do bolsonarismo e mesmo muitos que nele votaram não aprovam sua cruzada contra as urnas e a democracia. “Não é uma manifestação entre os times em disputa, mas a favor do juiz”, disse Floriano de Azevedo Marques, ex-diretor da Faculdade de Direito da USP.

Os intentos deletérios de Bolsonaro foram rechaçados em outras esferas. Porta-vozes do governo americano afirmaram mais uma vez que nada há de errado com o sistema eleitoral brasileiro, que é um exemplo para o mundo. Participando da XV Conferência de Ministros da Defesa das Américas, o secretário de Defesa dos EUA, Lloyd Austin, afirmou que os países da região se aproximam pelo compromisso com o Estado de Direito e pela “devoção à democracia” (Valor, 27-7). De quebra, o secretário defendeu um “controle civil firme dos militares”.

Como as intenções antidemocráticas do presidente Jair Bolsonaro sempre foram claras, manifestas à luz do dia e a toda hora, manifestações da sociedade civil antes de eleições cruciais para a República são um remédio vigoroso contra aventuras liberticidas.

Valor Econômico

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