Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense
A polêmica sobre a exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas, que opõe institucionalmente a Petrobras, que pretende fazê-la, ao Ibama, que não autoriza, é nitroglicerina pura. Além de o ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, entrar em rota de colisão com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, arrasta para o contencioso o presidente Lula, numa hora em que o eixo da política externa foi deslocado da economia sustentável para o tema da guerra e da paz.
A Petrobras pediu para explorar um campo com potencial de 14 bilhões de barris de petróleo a 175 km da costa do Amapá, mas o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) negou licença à estatal na quarta-feira.
MARINA, A FIADORA – A pior coisa que poderia ocorrer ao governo, neste momento delicado da nossa política externa, em razão do posicionamento de Lula em relação à guerra da Ucrânia, é um desembarque de Marina do governo.
Ela é a fiadora da credibilidade do país nos fóruns internacionais sobre o meio ambiente, que abriram as portas da política mundial para o presidente Lula, antes mesmo de sua posse, além de desbloquear os recursos financeiros para o Fundo Amazônia.
A defesa da Amazônia sempre foi uma bandeira da esquerda, muito mais pela ótica da integridade territorial e da garantia de suas reservas minerais; mais recentemente, em razão das populações ribeirinhas, dos seringueiros e dos indígenas, em defesa dos direitos humanos, com forte atuação da Igreja Católica.
INTERNACIONALIZAÇÃO – Talvez tenha sido o cacique Raoni o primeiro a sacar que a Amazônia já estava “internacionalizada”, ao deixar sua aldeia para correr o mundo ao lado do cantor Sting, em busca de solidariedade internacional à luta pela demarcação das terras indígenas.
Ex-seringueira, Marina seguiu essa trilha, principalmente depois do assassinato do líder seringueiro Chico Mendes. Quando ministra do Meio Ambiente, adotou uma agenda muito mais ampla, mas não perdeu o eixo da luta pela preservação da floresta em pé.
Ocorre que a população da Amazônia hoje é estimada em 38 milhões de habitantes, que vivem, sobretudo, das atividades econômicas tradicionais, entre as quais a pecuária e a exploração mineral. Marina saiu do governo Dilma Rousseff por se opor à construção da represa de Belo Monte, no Rio Xingu, perto de Altamira (PA).
DISPUTA POLÍTICA – Há um choque tremendo entre as lideranças populares e indígenas da Amazônia, representadas por Marina e, agora, também pela ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, e parte da elite política dos estados da Amazônia, que representa interesses econômicos e políticos tradicionais. Há também uma aliança tácita com madeireiros, garimpeiros, pecuaristas e grileiros na região, que agora também registra a forte presença dos traficantes de drogas.
O governo de Jair Bolsonaro agravou esse choque, ao estimular o desmatamento e o garimpo, bem como a invasão das terras indígenas. De certa forma, consolidou a internacionalização da Amazônia, por transformar o desmatamento numa “ameaça global”.
Ninguém pode ser indiferente a essa nova realidade, muito menos o presidente Lula, que pretende solicitar à Petrobras novos estudos sobre a viabilidade da exploração de petróleo na foz do Amazonas, mais precisamente na costa do Amapá.